'Estômago 2' deixa comida de lado em filme que parece paródia; leia a crítica
Primeiro filme, que é uma reflexão sobre a relação entre comida e poder, é apenas uma vaga e saudosa lembrança
Estômago, de 2007, é um filmaço: com a história de Nonato (João Miguel, impecável), um chef de cozinha que vai ascendendo socialmente -- ou melhor, na cadeia alimentar -- por meio de sua gastronomia. É um filme certeiro sobre comida e poder, em que a gastronomia é muito mais do que um prato de comida. Agora, 17 anos depois, Nonato volta às telonas com o aguardado (e já polêmico) Estômago 2: O Poderoso Chef, estreia desta quinta, 29.
O longa-metragem começa com Nonato ainda preso, na mesma cadeia liderada por Etecétera (Paulo Miklos). No entanto, as coisas estão mudando. Afinal, um grupo de mafiosos italianos, liderado por Dom Caroglio (Nicola Siri), está chegando na prisão. E aí fica a dúvida: como Nonato vai se portar com essa mudança? Como fica Etecétera?
A partir dessa perspectiva, Estômago 2: O Poderoso Chef conta com duas linhas narrativas bem distintas. Em uma delas, mais parecida com a do filme original, acompanhamos Nonato nessa briga de poderes dentro da cadeia, fazendo movimentos ousados e criativos. É ali que a comida brilha. É quando o chef serve uma coxinha, no pátio da cadeia, e faz os olhos de Dom Caroglio brilharem -- e olha que ele, vindo da Itália, entende bem de comida.
É nessa primeira narrativa que mora o melhor de Estômago 2, quando temos Nonato em seu máximo e, principalmente, voltamos a ver novas faces da comida como forma de poder.
Um filme de máfia ou de comida?
No entanto, não é este o principal foco do longa-metragem. É a segunda narrativa que ganha força e dá forma ao filme: é todo o preâmbulo envolvendo Caroglio na Itália, lidando com as adversidades que surgem em sua vida. É extremamente esquecível e nada tem a ver com o que foi criado há 17 anos. Há pouca conversa sobre comida -- o principal foco da história -- e acaba sendo mais uma dissertação cansativa sobre o mundo da máfia.
É como se o segundo filme de Estômago fosse um prato requentado, sem muito tempero. Sem a pimenta que todo mundo esperava. É mais como uma recriação anêmica, quase pastosa, em que o principal ingrediente do prato não brilha. Em termos não-gastronômicos, é como se fosse uma paródia de si próprio, tentando recriar algo sem se divertir de fato.
O erro, enfim, é ter deixado dois personagens tão importantes de fora. Primeiro, o próprio Nonato. João Miguel é um ator completo, dono de seu próprio discurso, e que estranhamente se tornou coadjuvante de sua própria história -- Nicola Siri é um bom ator, mas longe de ter o brilhantismo de Miguel. E a comida, que disse tanto no primeiro filme, fazendo até com que o molho a putanesca voltasse a ser falado, virou apenas figurante.