Filme do Chico Bento leva ingenuidade dos gibis às telas: 'Celebração da cultura caipira'
Fernando Fraiha, Isaac Amendoim, Luís Lobianco e Débora Falabella falam sobre o filme que honra o personagem de Maurício de Sousa
Quando o filme Turma da Mônica: Lições chegou ao fim, uma cena pós-créditos incrementou a emoção: um garotinho de camiseta amarela e chapéu de palha sentado no galho de uma goiabeira. Era o vislumbre do que viria a ser Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa, longa-metragem que estreia nesta quinta-feira, 9, e que resgata as boas histórias da Maurício de Sousa Produções (MSP) depois do fiasco que foi Turma da Mônica Jovem.
É, afinal, outro projeto, outra ideia, outro público. A busca, aqui, é se reencontrar com os pequenos, enquanto também abre espaço para os adultos se emocionarem com uma história genuinamente brasileira e caipira. "Sempre tivemos a ideia de criar projetos com o Chico Bento, porque ele é um personagem muito querido. Em termos de aceitação do público, vendas e popularidade nos quadrinhos, ele é o único que rivaliza com a Mônica", diz Marcos Saraiva, executivo à frente das equipes de audiovisual e digital da MSP.
Para encontrar a história ideal, o diretor Fernando Fraiha (Bem-Vinda, Violeta) "revirou o baú" da MSP. "Quando começamos a pesquisa, nos trancamos em uma sala e pedimos à Maurício de Sousa Produções para nos enviar o maior número possível de quadrinhos do Chico Bento. Eles nos enviaram uma seleção especial feita pelo próprio Maurício. Lemos tudo — muitas histórias que já conhecíamos, mas agora com outros olhos", conta Fraiha.
Além disso, Fernando e a equipe pesquisaram nas graphics, biografias e até na Wikipédia. Tudo que chamava a atenção, eles anotavam, mesmo sem saber exatamente o motivo. Estavam procurando algo que se parecesse com um filme, mas ainda não sabiam como a história seria ou como ela se desenharia. "Foi um processo de imersão total, quase sem paraquedas, em um universo de histórias. Aos poucos, começamos a fazer conexões, colagens, e assim surgiram ideias que deram a estrutura ao filme", contextualiza o diretor.
O resultado deu muito certo. A história, que emociona de verdade e traz a essência do Chico Bento dos quadrinhos, fala sobre o garotinho caipira tentando evitar que a goiabeira do Nhô Lau seja derrubada para dar passagem a uma estrada. Tudo é bastante ingênuo, e tudo bem: Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa preza por uma ingenuidade muito natural. Aliás, tudo foi tão bem que já há um roteiro pronto para um possível Chico Bento 2.
Outro grande acerto tem nome e sobrenome: Isaac Amendoim. O garotinho, com o sotaque que qualquer um imagina para o personagem de Maurício de Sousa, parece que saltou das páginas dos gibis para a tela do cinema. É o Chico Bento perfeito - apesar dele confessar que não era muito chegado em ler sequer quadrinhos. "Antes do filme, não gostava muito de ler. Mas, durante as gravações, com os ensaios e a necessidade de decorar os textos, comecei a pegar gosto pela leitura", conta ele, que se identifica muito com Chico Bento.
Retorno ao Brasil caipira
Uma preocupação que surgiu quando Chico Bento e a Goiabeira Maraviósa foi anunciado, além de honrar o personagem, era passar por um terreno perigoso em que o caipira poderia ser novamente vítima de chacota - pelo sotaque, pela forma de se vestir e ver o mundo.
Mas não é isso que acontece. O longa, pelo contrário, valoriza o caipira. "O Chico é um personagem que existe desde 1961, com uma essência muito leve, quase poética. Os primeiros traços do Maurício nos anos 60, 70 e 80 eram mais rústicos, refletindo a vida rural", contextualiza Fernando Fraiha. "Tentamos trazer isso para o filme com texturas específicas, como casas caiadas e cores mais saturadas, mas sem tons sólidos. Buscamos uma estética que remetesse ao traço original do Maurício, mas traduzida para o cinema."
Mais do que a estética, porém, Chico Bento valoriza a cultura caipira. É um Brasil que ainda existe (e resiste). "É uma alegria fazer algo que ressoa com o público de outros países, mas tem algo ainda mais especial em contar histórias que só nós entendemos plenamente", conta Luís Lobianco (Carlinhos e Carlão), o Nhô Lau no longa. "A infância retratada no Chico Bento, com subir em árvores, colher frutas, ouvir lendas como a do Curupira, é algo muito íntimo e genuíno. É uma oportunidade de celebrar a nossa identidade."
Débora Falabella, que faz a professora Dona Marocas, vai além e acredita que Chico Bento é um filme de reconexão. "Estamos tão desconectados da natureza, vivendo em um mundo dominado pela internet e pelas redes sociais. Esse filme mostra para as crianças o valor de brincar, de estar em contato com a natureza e com os amigos", diz a atriz. "É algo tão natural que, enquanto assistimos ao filme, nem sentimos falta de ver um celular ou uma tela. É uma celebração linda da cultura caipira e um retorno às nossas origens."