Oscar 2024: Nolan é favorito em geração intermediária de cineastas que ganha espaço entre veteranos
Premiação sinaliza que safra de talentos reinventa o cinema enquanto cineastas clássicos caminham em direção à aposentadoria
O Oscar está ganhando novos ares. Pode não ser por cineastas exatamente novatos, mas que apostam em uma nova forma de fazer cinema. E talvez a premiação deste ano demonstre algo dessa mudança, já sinalizada nas indicações em uma tendência de edições passadas.
São vários os nomes que despontam, sejam pelo ineditismo ou pela renovação que representam no ofício. Talvez o principal desta safra seja Greta Gerwig. Sim, ela não foi indicada a diretora, mas vamos lá.
A cineasta, em parceria com o marido Noah Baumbach, é a maior responsável pelo fenômeno Barbie, que concorre a Melhor Filme e Melhor Roteiro Adaptado. E é aí que está o mérito.
Transformar uma boneca de plástico em uma produção de adulto não chega a uma revolução, mas passa perto. Fora que Greta também se modifica após vir de filmes considerados mais alternativos ou indies e conquistar oito indicações com um blockbuster.
Outro nome digno de menção é Yorgos Lanthimos. Esta não é a primeira indicação do grego a Melhor Diretor nem Melhor Filme, mas Pobres Criaturas é uma grata surpresa do Oscar 2024. Desbancando Barbie, se garantiu como segundo mais indicado e concorre em 11 categorias com chances substanciais de prêmio.
Mas onde estão os gigantes do cinema? Bom, Kubrick, Fellini, Godard, Bergman e Hitchcock estão mortos. Spielberg e Tim Burton não produziram para essa temporada. Francis Ford Coppola e Tarantino trabalham nos respectivos "últimos filmes". Woody Allen caiu no ostracismo e Almodóvar foi esquecido no churrasco.
Da velha guarda, de remanescentes para este ano ficam Martin Scorcese, indicado a Melhor Diretor por Assassinos da Lua das Flores, e Hayao Miyazaki, do Studio Ghibli, com O Menino e a Garça na concorrência por Melhor Animação. Esse vácuo abriu uma janela de oportunidade.
Embora não dê para chamar Christopher Nolan de novato, o cineasta nunca venceu um Oscar de direção ou roteiro. Ao que tudo indica, este é o ano dele.
E não por falta de merecimento. Não é de hoje que o diretor explora novos olhares no comando dos filmes. E embora Oppenheimer pertença ao manjado gênero dos filmes biográficos, ele alcançou o patamar de favorito nas principais premiações e as 13 indicações ao Oscar muito mais pelo formato que pela história.
Nolan transfigurou o que poderia ser um longa insuportável e clichê sobre a Segunda Guerra usando do próprio talento inovador. O cineasta oxigenou não só a história e o gênero, mas o cinema.
Agora é ver como a Academia de Artes e Ciências Cinematográficas de Hollywood vai recompensar os indicados. Inegavelmente, há chance de Oppenheimer fazer o rapa na premiação. Mas pode haver espaço para Jonathan Glazer com Zona de Interesse - que também concorre a Melhor Filme e talvez seja o favorito a Filme Internacional.
O que dificulta uma pulverização maior de prêmios é que boa parte da competição entre esses candidatos menos consagrados ocorre nas mesmas categorias.
Por exemplo, a sul-coreana-canadense Celine Song concorre a Roteiro Original por Vidas Passadas, mas a dupla Justine Triet e Arthur Harari, de Anatomia de uma Queda, também — ambos com boas chances. Triet é a única mulher na disputa por Melhor Direção, e enfrenta Glazer, Yorgos, o veterano Scorsese e o possível vencedor Nolan.
De toda forma, mesmo que não vençam, as indicações já apontam para um lugar de atualização do cinema, onde figuras diferentes podem surgir. Em 2023 essa tendência já era notada e se manteve.
Na categoria de Direção, por exemplo, apenas Steven Spielberg (com Os Fabelmans) representou os gigantes. Os outros eram Todd Field (Tár), Martin McDonagh (Os Banshees de Inisherin), Ruben Östlund (Triângulo da Tristeza) e Daniel Kwan e Daniel Scheinert, que venceram o prêmio e ainda levaram, entre outros, Melhor Roteiro Original e Melhor filme com o revolucionário Tudo em Todo o Lugar ao Mesmo Tempo.
Surpresas e incoerências
Uma das principais surpresas deste ano foi a indicação de America Ferrera a Melhor Atriz Coadjuvante por Barbie. Embora tenha entregado atuação sólida, o reconhecimento não foi registrado nas premiações anteriores.
- Veja entrevista de America Ferrera ao Estadão
Pelo mesmo filme, Ryan Gosling concorre na categoria correspondente masculina como o não mais que médio Ken. Mas Margot Robbie não recebeu o que seria uma merecida indicação a Melhor Atriz como Barbie - o que não faz nenhum sentido. A única explicação é a disputa estar acirrada demais no grupo.
Outra ótima notícia é a indicação de Lily Gladstone, como Melhor Atriz por Assassinos da Lua das Flores. A primeira mulher de origem indígena dos EUA a ser indicada na categoria é definitivamente o destaque do arrastado filme — em que Leonardo DiCaprio, supostamente o protagonista, não entrega muito. Inclusive, nem sequer foi lembrado pela Academia.
Digno de menção, também, é Robert Downey Jr. Em reposicionamento de carreira após uma década marcado como o Homem de Ferro da Marvel, ele concorre a Melhor Ator Coadjuvante pela performance em Oppenheimer.
Inadmissível, porém, foi Pedro Almodóvar ser esnobado como foi este ano. O cineasta espanhol lançou o excelente curta Estranha Forma de Vida com Pedro Pascal e Ethan Hawke em atuações memoráveis e cinematografia magnífica para reimaginar o velho oeste, mas não entrou em nenhuma indicação. Erro crasso.
Por fim, A Sociedade da Neve, da Netflix, concorre a Melhor Filme Internacional. Conduzido pelo diretor espanhol J.A. Bayona, provavelmente não vence, mas mereceu a indicação.