'O Despertar das Formigas' escancara o peso do patriarcado
Filme de Antonella Furnis narra a trajetória de uma dona de casa da Costa Rica, que sofre a pressão de uma sociedade com machismo estrutural
Imagine a ânsia e angústia de estar imersa em um formigueiro. É essa sensação desesperadora que o filme O Despertar das Formigas implica ao telespectador, a cada vez que Isabel é podada de suas vontades, sua opinião, de seu direito de existir.
No filme de Antonella Sudasassi Furnis, que era um dos cotados para representar a Costa Rica na categoria de Melhor Filme Estrangeiro do Oscar, Isabel (Daniela Valenciano) é uma dona de casa, casada, mãe de duas meninas, com uma vida simples em uma área rural da Costa Rica. E é na sua rotina trivial que a pressão de uma sociedade patriarcal é delimitadora para a mulher.
São em detalhes pequenos que aos poucos percebemos o quanto Isabel é deixada de lado em suas vontades. Como na cena de abertura do filme, em que a protagonista tenta decorar um bolo, para uma festa em família, mas é alvejada por pitacos alheios. Mas tudo fica escancarado quando a família passa a fazer pressão para que o casal tenha mais um filho. Um desejo de Alcides, o marido, não de Isabel.
A verdade é que a protagonista já se sente sobrecarregada com os cuidados de suas duas filhas, os afazeres da casa e os bicos que faz como costureira. O marido pouco se faz presente e quando recebe pedidos de “ajuda” da esposa, para uma tarefa fácil, como colocar a mesa para uma refeição, não consegue executar. Nada que uma família latino-americana não tenha presenciado em um almoço de domingo.
O Despertar das Formigas narra a trajetória da mulher que enfrenta o patriarcado, o machismo e retira a mordaça social que a silencia em muitos momentos de sua vida. Assim como o brasileiro A Vida Invisível, de Karim Aïnouz, também uma das apostas para concorrer na categoria de Melhor Filme Estrangeiro no Oscar este ano, mostra, para quem está disposto a enxergar, os abusos silenciosos que toda mulher sofre, no caso dos dois filmes, que toda mulher da América Latina sofre, aprende e propaga.
A diferença entre eles está no desfecho. No filme de Antonella, ele é mais otimista. A protagonista consegue se soltar das amarras e deixar claro suas vontades. O destaque vai para uma das cenas mais lindas e singelas que eu já vi. Isabel decide cortar o cabelo de suas filhas. Os fios longos eram uma cobrança masculina, algo pequeno, mas que de uma maneira subserviente já ordenava a importância das vontades de gêneros.
Premiações
O reconhecimento do Oscar não veio, para ambos. Mas a importância da temática faz desses filmes um lindo e triste retrato da nossa sociedade, que precisa ser melhorada na simplicidade do dia a dia. Não deixe de ver.
Em tempo. O Despertar das Formigas ganhou inúmeros prêmios, foi eleito o Melhor Longa Metragem da Costa Rica Festival Internacional de Cinema, o prêmio do Grande Júri de Melhor Filme Internacional Ibero-Americano Festival de Cinema de Seattle e Melhor Produção América Latina no Festival de Tucumán.
Além disso, o longa também foi eleito melhor Filme Estrangeiro, Prêmio da Crítica e Prêmio Especial do Júri para Atrizes Revelação Isabella Moscoso e Avril Alpízar no Festival de Gramado e Prêmio Especial do Júri no Festival Internacional de Cinema de Mulheres de Seul.
Para a edição de 2020 do Oscar, os candidatos ao Melhor Filme Estrangeiro são Os Miseráveis (França), Honeyland (Macedônia), Corpus Christi (Polônia), Parasita (Coreia do Sul) e Dor e Glória (Espanha).
O Despertar das Formigas estreia nesta quinta-feira, dia 16.