Quem matou Grégory? Série relata o crime que virou uma novela sem final
Caso em destaque na Netflix mostra como a imprensa pode induzir a erros terríveis e usar uma tragédia em benefício próprio
Na tarde de 16 de outubro de 1984, Grégory Villemin, de 4 anos, brincava diante de sua casa, em uma pacata cidade no leste da França, quando desapareceu.
Poucas horas depois, seu corpo foi encontrado em um rio da região. Estava com pés e braços amarrados por uma corda, mas não havia sinais de violência física.
Começava ali uma investigação caótica e uma cobertura sensacionalista da maior parte da imprensa.
A série documental 'Grégory', na Netflix, mostra em detalhes a sucessão de equívocos que resultou em outro assassinato, uma prisão injusta, um suicídio e a destruição de biografias.
Por trás da morte do garoto está o 'Corvo', apelido dado à pessoa anônima responsável por cartas e telefonemas com insultos e ameaças a Jean-Marie e Christine, os pais da pequena vítima.
Tudo leva a crer que as conquistas materiais do casal despertaram inveja doentia em um parente ou alguém próximo.
Matar o menino foi a maneira que o desconhecido encontrou para acabar com a felicidade da jovem família.
Um aspecto relevante explorado na série é a influência do Quarto Poder, a mídia, sobre o Poder Judiciário.
O primeiro magistrado à frente da investigação foi picado pela mosca da fama, se deixou manipular por jornalistas velhacos e perdeu o contato com a realidade.
Como o caso vendia cada vez mais jornais e revistas, a imprensa inventava teorias e lançava acusações infundadas contra pessoas.
Na ânsia por fotos, vídeos e declarações, alguns repórteres sem ética ignoravam o sofrimento dos familiares de Grégory e de quem era colocado levianamente na mira da desconfiança.
Necessário parêntese: o sensacionalismo na imprensa, no passado e hoje em dia, só existe porque há consumidores fiéis.
O financiamento é feito por quem compra exemplares e dá audiência na TV e na internet aos veículos que vivem de explorar a desgraça alheia.
A série tem ótimo roteiro a partir de áudios gravados por um jornalista veterano que cobriu o caso. Há entrevistas com repórteres, advogados e investigadores do crime.
Quase 40 anos depois, alguns deles sinalizam arrependimento por sua conduta na época e lançam um olhar triste sobre o desfecho do caso.
Aliás, fim sem final. Um acusado pela morte de Grégory foi morto pelo pai do garoto, a mãe chegou a ser presa sob acusação de assassinar o próprio filho e outros membros dos Villemin ficaram sob suspeita.
Mas o homicídio continua sem solução. Tentativas recentes de solucioná-lo usando a tecnologia do DNA falharam.
De tempos em tempos surgem novas especulações. A morte de Grégory Villemin segue sendo um mistério.