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Tirando o Mofo: As Aventuras de Robin Hood, ou por que ainda precisamos de heróis

O Príncipe dos Ladrões pode ter algumas coisas para nos ensinar.

2 dez 2018 - 09h06
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Heróis estão fora de moda. Não os "super" da Marvel ou da DC, mas aqueles heróis clássicos, com ou sem poderes, constantemente tratados como "os escolhidos" e que tomam para si uma missão quase suicida com o objetivo de mudar o mundo. Estes personagens saíram de cena, e não por acaso quando as coisas no mundo ficaram mais cinzentas e menos delineadas, sem tantos mocinhos tão identificáveis e com tantos vilões nas sombras. É também por isso que As Aventuras de Robin Hood, lançado em 1938, é um produto de outro tempo, muito distante.

Foto: AdoroCinema / AdoroCinema

Dirigida por Michael Curtiz (Casablanca) e William Keighley, esta adaptação da lenda britânica — leia mais sobre as origens do Príncipe dos Ladrões e o encontro do AdoroCinema com ele na Floresta de Sherwood aqui — é a primeira grande versão cinematográfica da história. Patrocinado por uma Warner Bros. que desejava descolar sua imagem dos filmes B de mafiosos, com um investimento astronômico para a época, como demonstrado pela vívida, extravagante e rica fotografia em Technicolor, o filme representa muito bem as ideias da Era de Ouro de Hollywood: imensas cenas de ação e aventura; muito romance, em todos os sentidos do conceito; e a narrativa do bem contra o mal. Em suma, o perfeito exemplo do gênero que no Brasil ficou conhecido como "capa e espada".

Um título deste tipo não poderia ser estrelado, aliás, por outra pessoa além do sempre galante Errol Flynn, conhecido por viver piratas charmosos e soldados honrosos nos anos 1930. É verdade que a Warner tentou emplacar James Cagney (Anjos de Cara Suja), um dos gângsters mais famosos da sétima arte, no papel; quis o destino, entretanto, que Flynn acabasse por assumir o papel de Robin de Locksley, um nobre fora-da-lei que rouba dos ricos para dar aos pobres e que protege os oprimidos dos rolos compressores das autoridades e dos poderosos — no caso, o Príncipe John (Claude Rains), que tomou o trono do próprio irmão, o bondoso monarca Ricardo Coração de Leão (Ian Hunter).

Não faz tanto sentido recontar a história de Robin Hood aqui nestas linhas porque a lenda do arqueiro inglês já faz parte do imaginário coletivo: da literatura às telinhas, todas as mídias modernas e contemporâneas já beberam na fonte do Príncipe dos Ladrões. A questão aqui talvez seja por que este herói em específico, dentre tantos outros, continua retornando? Ou melhor: já que como todo bom mito ou lenda que se preze, Robin é relido pelas gerações que o precederam — que inclusive o transformaram em um herói após alguns atos sangrentos, muito bem documentados em poemas e baladas populares — como convém a elas, por que ele segue importante hoje em dia?

Depois da desconstrução da noção romântica e maniqueísta de que o bem invariavelmente vencerá o mal, um ideal que permeia todas as produções da Disney e todos os projetos com finais felizes, não sobraram lados definidos. Seria ingênuo da parte deste colunista tentar traçar as razões pelas quais o mundo ficou pulverizado, mas seria igualmente imprudente não notar que o contexto global vem retomando a narrativa do "nós" versus "ele": em todo o planeta, são inúmeros os casos de polarização, um vocábulo que parece ter ganhado tanta importância quanto fake news  e é aqui que entra Robin Hood.

Como figura heróica, que rompe uma ordem ilegalmente estabelecida como a de John contra Ricardo, o Príncipe dos Ladrões é um modelo. Assim como nas fábulas, cujos animais entram no lugar dos seres humanos para transmitir uma moral da história, lendas como a do arqueiro existem para nos ajudar a navegar o nosso mundo. É esta a função da ficção e no caso do personagem aqui interpretado por Flynn, sua tarefa é operar como um espírito, um símbolo de esperança. Se existiu, Robin de Locksley provavelmente era muito mais um bandoleiro sanguinário do que um herói da Floresta de Sherwood; é melhor, desse modo, que continue como uma lenda, funcionando como a fonte de inspiração que é.

A história de Robin Hood é a história dos pobres e oprimidos contra os ricos e opressores, contra o autoritarismo que se utiliza da prerrogativa do poder para dele abusá-lo. As Aventuras de Robin Hood pode ser dualista demais em certos momentos, mas não faz nada mal identificar de que lado estão os bons e de que lado estão os outros. E é por isso que vale ressaltar, da mesma forma como no caso de Nasce uma Estrela, que releituras e remakes não são produtos do mero acaso: não é à toa que o arqueiro esteja de volta em Robin Hood - A Origem.

É evidente que entre Luke Skywalker e Han Solo, para dar um exemplo clássico, a maioria das pessoas provavelmente preferirá o segundo. Isso porque o mercenário intergalático representa melhor as complexidades do espírito humano do que a interpretação original de Mark Hamill para o jedi. Por outro lado, os heróis, puramente heróis no sentido mais exato do termo, são sempre necessários porque são figuras que transcendem nossa humanidade. Não precisamos de heróis de carne e osso porque estes não existem; mas os heróis, seja da literatura, do cinema ou de qualquer mídia da cultura popular, este sim são necessários — hoje mais do que nunca.

AdoroCinema
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