Aos 93, Silvio Santos desromantiza ‘envelhecimento perfeito’ vendido na mídia
Apresentador se mantêm longe da TV para preservar a imagem lendária ao mesmo tempo em que expõe o impacto da velhice com aparição pública
Senor Abravanel completou 93 anos em 12 de dezembro. O carioca de alma paulistana, filho de imigrantes europeus, está afastado do SBT há mais de 1 ano.
Vive o seu crepúsculo reservadamente. Demonstra não querer que o público – especialmente suas “colegas de trabalho” do auditório e a legião de telespectadores – o vejam fragilizado pelo efeito implacável do tempo.
Quebrou o autoexílio ao sair na porta de sua mansão para atender a um grupo de fãs que queriam parabenizá-lo. Desprendido, surgiu de pijama, cabelos brancos sem corte, cara lavada. “Estou com preguiça”, respondeu sobre o afastamento dos estúdios.
O comunicador disse não ter mais paciência para “ir ao Jassa”, seu cabeleireiro, a fim de cuidar do visual. Sinalizou preferir a calmaria doméstica a se submeter à ditadura estética imposta a quem faz televisão.
“O Silvio Santos que vocês querem está no YouTube. Ele não é mais aquela pessoa. Pra ele também deve estar sendo difícil não ser mais aquela pessoa”, disse sua filha mais velha, Cintia Abravanel, 60, no podcast da apresentadora Christina Rocha.
“Ele fala: ‘não gostei de brincar disso, ficar velho é muito ruim; dói tudo, corpo dói’. Para o lado artístico dele é difícil, ele não veste o corpo velho. E as pessoas não se tocam que aquele Silvio Santos não existe mais.”
O mais popular apresentador brasileiro tem o direito de se retirar de cena para preservar a imagem que construiu ao longo de seis décadas diante das câmeras.
“A tragédia da velhice consiste não no fato de sermos velhos, mas sim no fato de ainda nos sentirmos jovens”, escreveu o dramaturgo irlandês Oscar Wilde. Ter cabeça jovial em corpo enfraquecido é o conflito citado pelo autor e vivido na prática por Silvio.
Silenciosamente, e sem premeditar, o apresentador ajuda a combater o excesso de romantização sobre o envelhecimento, assim como várias mulheres famosas prestam um serviço à sociedade ao desromantizar a gravidez e a maternidade.
Nos últimos anos, parte da imprensa, numerosos influenciadores e incontáveis coaches passaram a falar da vida após os 60 anos destacando apenas os aspectos positivos.
Sim, é imprescindível estimular a população a aproveitar plenamente a última fase da vida, porém, não se deve esconder o lado nada glamouroso: a decadência física e seu impacto na autoestima, as doenças típicas, as limitações de atividades cotidianas, o etarismo etc.
Envelhecer pode ser lindo, mas nunca será fácil. Ninguém deve se deixar iludir pela positividade tóxica a respeito dessa experiência. As celebridades nessa condição são obrigadas a lidar com uma dificuldade extra: o impiedoso julgamento público e a perda de status para os artistas mais jovens.
Ninguém pode questionar Silvio Santos por preferir ficar em casa, assistindo à TV, do que exposto no centro do palco, quase irreconhecível conforme disse sua filha, e alvo de críticas por não ser “o mesmo”, sujeito a eventuais falhas do corpo e da mente.
Ele merece se preservar e ter autonomia sobre a própria velhice.