Em novela, Lolita Rodrigues denunciou a exploração e o abuso sexual de domésticas
Personagem manipulada pela patroa em ‘Rainha da Sucata’ foi uma das mais importantes na carreira da agora saudosa atriz
A certa altura de ‘Rainha da Sucata’, a vilã Laurinha Figueiroa (Glória Menezes) não se conforma de ver sua ex-cozinheira prosperando ao vender comida congelada para famílias da alta sociedade paulistana e no comando de um restaurante de bairro.
“Gostava mais quando você era dócil, educada”, reclama a dondoca falida. Ela ameaça difamar a comida da antiga funcionária para levá-la à falência. “Eu morria de medo da senhora. Hoje eu não tenho mais”, responde Lena, ciente de seu valor após anos e anos de exploração na mansão decadente de Laurinha. (Assista à cena no final do texto.)
A personagem marcou um momento especial na carreira de Lolita Rodrigues, pioneira da televisão brasileira, vítima de pneumonia aos 94 anos no dia 5 de novembro. Ela deixou uma única filha, a médica Silvia Rodrigues.
Na novela da Globo, exibida originalmente em 1990, Lena sentia tanto medo de ficar desamparada com a filha, Alaíde (Patrícia Pillar), que aceitava passar meses sem salário na casa dos Figueiroa, onde morava. Às vezes, tirava dinheiro do próprio bolso para comprar a carne servida nos jantar dos grã-finos falidos.
Com pensamento progressista, a filha da doméstica tentava conscientizá-la da importância de não abaixar a cabeça para os patrões e exigir seus direitos trabalhistas. Irritada, Laurinha chamava Alaíde de “comunista”.
Em outro momento dramático, Lena revela ter sido estuprada pelo patrão, Betinho (Paulo Gracindo), na juventude. Do ato de violência nasceu Alaíde. Sozinha e ameaçada, a cozinheira nunca o denunciou. Uma trama ainda atual mais de 30 anos depois.
Presente na cerimônia de inauguração da TV no Brasil, em 18 de setembro de 1950, Lolita Rodrigues cantou o Hino da Televisão. Destaque como apresentadora de diferentes programas, entre eles ‘Almoço com as Estrelas’, ela esteve no elenco da primeira novela diária, ‘2-5499 Ocupado’, de 1963.
Outros tipos importantes em sua trajetória na teledramaturgia foram a cartomante Antonieta da minissérie ‘Memórias de um Gigolô’ (1986) e a feirante Aldonza de ‘Sassaricando’ (1987). O último trabalho aconteceu na novela ‘Viver a Vida’ (2009), quando interpretou a refinada Noêmia, mãe do personagem Marcos (José Mayer).