Iza tem direito de perdoar Yuri? Flertar on-line é traição? Psicanalista comenta
Doutora em Psicologia Lygia Vampré Humberg explica aspectos que podem ou não viabilizar o perdão e o risco das interações virtuais ao casal
Perdoar ou não perdoar, eis a questão. A cantora Iza talvez viva este dilema. Ela reaproximou-se de Yuri Lima, que voltou a frequentar sua casa algumas semanas após o escândalo de traição.
Na internet, especula-se uma reconciliação em nome da filha Nala, com nascimento previsto para outubro. A assessoria da artista se recusa a comentar sua vida pessoal, jogando combustível nos boatos.
Em busca de compreensão das várias camadas desta situação, a coluna conversou por e-mail com a psicanalista Lygia Vampré Humberg, doutora em Psicologia pela USP, com especialização na University of London, e professora do curso ‘Vício e Dependência do Outro: Um Panorama sobre os Relacionamentos Adictivos’, da Casa do Saber.
Parte das redes sociais está revoltada com a possibilidade de a cantora Iza perdoar a traição do jogador Yuri, pai da filha que ela espera. Por que a maioria de nós se sente no direito de julgar a vida conjugal dos outros?
Essa questão tem vários âmbitos. O primeiro: da própria pessoa que se expõe sem se dar um tempo de elaborar o que ela mesma está sentindo. Entendo que no caso da Iza, ela estava pressionada porque parece que a amante também iria expor, mas tudo ser resolvido na rede social, na frente de milhares de juízes, torna as situações muito mais complexas do que aquelas resolvidas na família, com diálogo e tempo para amadurecimento. O segundo: opinião todos têm, mas o problema é querer impor sua opinião à vida do outro, que é completamente diferente. Cada um tem uma criação, uma necessidade, uma motivação diferente do outro. Se há mais amadurecimento, maior a chance de acolhimento, de compreensão do outro e menor a necessidade de imposição. E, por fim, não podemos esquecer da força dos fenômenos grupais, onde o individual se perde e o grupo se sente com forças para linchar o outro.
Perdoar uma infidelidade em nome da criação de um filho é justificável?
Aqui precisamos compreender se o perdão é mesmo em nome da criação do filho, ou se o casal conversou e conseguiu se entender e se dar uma nova chance, compreendendo que para se chegar a maior amadurecimento possa haver percalços e sofrimento. Ou se seria pelo filho, e eles ficarão infelizes juntos, fazendo um esforço pela criança, o que não trará benefícios para ninguém.
Teoricamente, a mulher perdoa mais facilmente uma traição do que o homem. Há explicação segundo a psicanálise?
Precisamos ter dados concretos se realmente as mulheres perdoam mais do que os homens, e caso estes dados comprovem isto, pode ser devido a fatores culturais, onde a mulher teme ser rotulada de divorciada. Para algumas religiões, quem casa não pode separar. Em certas famílias, as mulheres são educadas para lutar por um relacionamento, e o homem, educado para não se mostrar culturalmente fraco, então não poderia perdoar, ou pelo menos não pode contar que perdoou; por isso, pode ser que saibamos menos. Há ainda a questão financeira, pois vivemos numa sociedade onde os homens ganham mais do que as mulheres. Mas a questão de perdoar ou não uma traição tem a ver mais com cada casal do que com gênero; se aquele casal pode dialogar, compreender os motivos um do outro (Chico Buarque canta “te perdoo por te trair”), ou seja, se os dois têm ou não algum papel nisso, se a traição foi uma forma mais infantil de comunicação (o agir ao invés da fala) etc.
Vivemos tempos de relações virtuais. Flertar ou fazer videochamada com alguém é uma traição?
Cada casal deve ter seus acordos do que é traição ou não, mas é importante pensar o que está sendo retirado daquela relação e investido em outra. Se há uma pessoa do outro lado da tela, já seria um investimento em outra pessoa, diferente de uma fantasia.
As relações abertas, tanto em relacionamentos héteros quanto LGBTs, ganham cada vez mais adeptos. Abrir mão da fidelidade é saudável para o casal?
Achar que o outro vai amar e desejar uma única pessoa vem do relacionamento mãe e bebê, onde a criança achava que a mãe amava só a ela e ignorava o pai e os outros interesses da mãe. Muitas vezes, se deseja voltar para esse momento, de ser o único amor e interesse de alguém. Se isso é possível ou não deve ser acordado por cada casal. Acho importante hoje existirem várias maneiras de se relacionar, não uma única, pois não há um único modelo que valha para todos. E acho e espero que as diferenças possam ser respeitadas. Quanto mais maduro se é, mais fácil respeitar as diferenças.
Dizem que um grande erro no relacionamento é a pessoa acreditar ter a posse e o direito à exclusividade do desejo do outro. Concorda?
Posse é uma palavra complicada, acho que ninguém pode possuir o outro. Pode amar, conversar, construir algo conjunto, mas possuir realmente não seria saudável. Já o desejo de exclusividade sexual e afetiva vai depender dos acordos e das possibilidades de cada casal.