Jô morreu sem ocupar uma cadeira que desejou e tanto merecia
Humorista e escritor conquistou respeito e status no meio literário, mas faltou um reconhecimento importante
Em um texto escrito em 2006 pelo jornalista José Castello, e reproduzido no site da Academia Brasileira de Letras, há o seguinte trecho: “... Fernando Henrique e Jô Soares condicionam suas candidaturas a alguma forma de garantia de que não venham a ser derrotados. Buscam, ambos, uma espécie de aclamação - o que não combina com os princípios democráticos da ABL”.
Jô morreu reconhecido como um grande escritor de romances policiais, porém, sem conseguir a desejada cadeira de imortal na mais respeitada instituição de pensadores do País, sediada no Rio de Janeiro.
Ele chegou a discutir sua candidatura em almoços e jantares com membros da Academia, mas nunca a lançou oficialmente na disputa por uma vaga. Talvez tenha sentido falta de apoio.
Jô queria fazer parte daquele grupo seleto que representa a rica literatura brasileira. Mérito não faltou. Seus livros foram elogiados pela crítica. Venderam muito bem aqui e em edições estrangeiras.
Aliás, um deles, ‘Assassinatos na Academia Brasileira de Letras’ (Companhia das Letras), lançado em 2005, era sobre um serial killer de imortais (piada pronta, concorda?).
Nesta obra, o ex-apresentador da Globo usou a ironia para, elegantemente, contestar a eleição de certos membros na ABL. Um personagem caricato acredita ser merecedor de uma cadeira na Academia somente por ser político e oligarca. Mais brasileiro, impossível.
Em novembro de 2011, ‘o gordo mais amado do Brasil’ lançou ‘As Esganadas’ na Academia. A sessão de autógrafos foi concorrida. Surgiu um novo flerte com a instituição.
As campanhas dos candidatos costumam gerar muitas fofocas e acirrar a rivalidade entre os veteranos. No fim de 2021, uma eleição ficou marcada por ‘lavagem de roupa suja’ de imortais na imprensa.
Tão vaidoso quanto Jô, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, autor de obras de sociologia, foi eleito para a cadeira 36 da ABL em junho de 2013.
José Eugênio Soares morreu aos 84 anos sem receber a honraria. Não realizou o sonho de vestir o fardão verde-oliva, traje de gala para noites de posse.
Os intelectuais de São Paulo foram mais justos. Em 4 de agosto de 2016, elegeram Jô para a cadeira 33 da Academia Paulista de Letras.
Ele tomou posse em novembro daquele ano, semanas antes do fim de seu programa na Globo, onde trabalhou por 16 anos. “Não me lembro de ter ficado tão emocionado em toda a minha vida”, disse no início de seu discurso.