Morre Doris Eaton Travis, a última das Ziegfeld Girls, aos 106 anos
- Douglas Martin
Por um quarto de século, Florenz Ziegfeld testou centenas de milhares de jovens dançarinas ansiosas por participar das famosas Ziegfeld Girls, glamurosas em seus figurinos de chiffon e rendas e uma das imagens perenes da Era do Jazz, em companhia de carros como o Stutz Bearcat, de danças como o charleston e dos livros de F. Scott Fitzgerald.
Entre 1907 e 1931, Ziegfeld contratou um total de três mil delas, e na terça-feira a última garota Ziegfeld morreu. Seu nome era Doris Eaton Travis, e tinha 106 anos. A morte foi anunciada por Joe Eaton, sobrinho de Travis.
Por sob chapéus imensos e repletos de plumas e brilhos, as Ziegfeld Girls deslizavam pelos mais grandiosos palcos da Broadway em musicais suntuosos conhecidos como Ziegfeld Follies, frequentemente ao som de um tema composto especialmente para elas por Irving Berlin, A Pretty Girl Is Like a Melody.
Antigas garçonetes, jovens do campo e trabalhadoras de escritórios, elas sonhavam se tornar parte do sonho de glorificar a garota americana que Ziegfeld tentava concretizar (desde que tivessem as medidas requeridas, 92 centímetros de quadril, 66 de cintura e 96 de busto).
Acompanhavam astros como Will Rogers e Fanny Brice, e todo mundo assistia aos espetáculos, o que incluía o presidente Woodrow Wilson e o astro do beisebol Babe Ruth.
"Era beleza, elegância, algo de adorável", recordou Travis em entrevista ao New York Times em 2005. "Beleza e elegância como em um quadro francês que mostre um corpo de mulher".
Travis talvez tenha sido a mais jovem das garotas Ziegfeld, tendo mentido a idade para começar a dançar aos 14 anos. Era parte de uma família célebre nos palcos dos Estados Unidos, "os sete pequenos Eaton". George Gershwin tocava no piano de sua casa, e o aviador Charles Lindbergh certa vez apareceu para o chá, ou seja, um coquetel na era da Lei Seca.
Depois de três anos com Ziegfeld, Travis passou a trabalhar como atriz no teatro e em filmes mudos. Em 1938, em Detroit, ela abriu a primeira escola de dança pelo método Arthur Murray fora de Nova York; veio mais tarde a ser dona de 18 dessas escolas em Michigan.
Travis jamais deixou os palcos. Em 2008, aos 104 anos, dançou em um espetáculo beneficente da Broadway para combater a Aids, repetindo o que vinha fazendo desde 1998. Mas os seus anos como beldade dos musicais serão sempre a lembrança mais forte sobre ela.
Em seu livro sobre Travis, Century Girl, Lauren Redniss menciona um crítico de Chicago que afirma: "Meus olhos foram cegados pela beleza luminosa de uma garota chamada Doris".
Doris Eaton nasceu em 14 de março de 1904 em Norfolk, Virgínia. Estreou nos palcos aos cinco anos, em The Cupid Dance, um número que ela ainda era capaz de reproduzir um século mais tarde.
Em 1911, Doris e suas irmãs Mary e Pearl foram contratados para uma produção de O Pássaro Azul, a peça de Maurice Maeterlinck, em Washington. Em 1916, os salários das meninas já eram maiores que o do pai, que operava um linotipo em um jornal.
As meninas, seu irmão Joe, mais novo, e seu primo Avery trabalhavam regularmente no teatro. Em The Days We Danced (1903), seu livro de memórias, Travis conta que os produtores sabiam que "se precisassem de três ou quatro crianças, era só ligar para mamãe Eaton".
Quatro das meninas Eaton foram garotas Ziegfeld, e cinco delas trabalharam na Broadway - ocasionalmente, havia três ou mais pessoas da família no mesmo espetáculo.
Doris chegou às garotas Ziegfeld com a ajuda da irmã Pearl, que havia sido promovida a diretora de coreografia do grupo. Ao chegar para um ensaio, Doris terminou contratada para uma turnê de verão iniciada no dia em que ela concluiu a oitava série. Além de aumentar a idade, ela usava pseudônimos, para evitar problemas em função das leis de trabalho infantil.
Ela trocou Ziegfeld por filmes mudos, revistas musicais e peças, com companhias como a Gorham Follies, de Hollywood, com cujo proprietário, Joseph Gorham, ela veio a se casar. Ele morreu seis meses mais tarde.
Mais tarde, Travis se apaixonou pelo compositor Nacio Herb Brown, com quem se relacionou por oito anos; Brown, com o letrista Arthur Freed, escreveu Singin' in the Rain para a Hollywood Music Box Revue, e Travis foi a primeira cantora a apresentar a canção.
Com a depressão econômica dos anos 30, as oportunidades de trabalho no mundo do entretenimento escassearam. Travis estava a ponto de trabalhar como taxi girl em uma casa de dança da cidade quando o professor de dança Arthur Murray a contratou para uma de suas escolas em Manhattan; ela lecionava durante 70 horas por semana até se transferir ao Michigan para abrir a primeira escola Murray no Estado.
Um de seus alunos foi Henry Ford 2°; outro foi Paul Travis, que fez fortuna inventando um mecanismo para portas de carros. Ela se casou com Travis e os dois se mudaram para Norman, Oklahoma, onde criavam cavalos de quarto de milha. Paul Travis morreu em 2000; o casal não teve filhos.