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Livro 'Mulheres Empilhadas' tem como tema o aumento dos casos de feminicídio no Brasil

Escrito por Patrícia Melo, obra é romance policial que narra a luta de uma advogada decidida a combater à violência contra a mulher

13 nov 2019 - 07h10
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Foi uma escrita doída, raivosa - ao trabalhar em seu novo romance, Mulheres Empilhadas (LeYa), Patrícia Melo foi tomada por sentimentos diversos. "Uma mistura de fúria e impotência", conta ela que, no projeto, deparou-se com uma trágica realidade nacional: feminicídio. "O Brasil ocupa o 5.º lugar no ranking mundial de assassinato de mulheres e o Acre figura sempre como a região onde acontecem mais casos", continua ela que, em 25 anos de carreira, é a primeira vez que elege uma mulher como protagonista.

Mulheres Empilhadas nasceu a partir de um convite da editora para justamente escrever um romance com uma temática feminina. "A ideia me agradou porque há pouco protagonismo feminino de uma maneira geral e a mulher está cada vez mais engajada na realidade", comenta Patrícia que, por outro lado, aponta para o grave problema do feminicídio. "A matança de mulheres no Brasil é só a ponta do iceberg, o que é visível, mas já é a última etapa de um processo contínuo e silencioso de violência que resulta nas mortes."

De fato, segundo o Mapa da Violência do Conselho Nacional de Justiça, uma mulher foi assassinada a cada duas horas no Brasil, em 2016. Aqui, se mata 48 vezes mais mulheres que no Reino Unido e 24 vezes mais que na Dinamarca. A maioria dos feminicídios é cometida por maridos e namorados das vítimas, e as motivações mais comuns envolvem controle e sentimento de posse sobre o corpo da mulher, além de desprezo e ódio por seu sucesso profissional, econômico ou intelectual.

"E, quando há denúncia e o caso vai a julgamento, a mulher sofre um segundo estupro graças à suspeição moral que recai sobre a vítima", comenta Patrícia que, pela primeira vez também, contou com o auxílio de uma pesquisa, feita pela jornalista Emily Sasson Cohen, que entrevistou juízes e membros de ONGs, além ter viajado até o Acre, onde conheceu aldeias indígenas.

Esse detalhe foi fundamental para Mulheres Empilhadas. O livro acompanha uma jovem advogada paulistana, que vai até o Acre acompanhar um mutirão de julgamentos de casos de mulheres assassinadas. A viagem vai ajudá-la a lidar com dois problemas pessoais: quando criança, ela presenciou o pai matar a mãe, fato que ela tem dificuldade em lidar; e, nos dias atuais, sua decepção é com o namorado, homem aparentemente gentil mas que, em uma discussão, dá-lhe um tapa na cara. "Essa geralmente é a primeira agressão", conta a autora.

Em Rio Branco, a advogada (cujo nome propositalmente não é mencionado) se depara com diversos tipos de violência, mas um se destaca: a de uma índia adolescente, brutalmente morta por três jovens da rica sociedade local. Mas, apesar das evidências, eles são absolvidos. "É o chamado 'assassinato recreacional', aquele em que o agressor barbariza a vítima antes de matá-la", observa Patrícia, que habilmente estruturou o livro.

'Mulheres Empilhadas'. Autora: Patrícia Melo/ Editora: LeYa/ (240 págs., R$ 39,90)/ Lançamento: Biblioteca Mario de Andrade - Rua da Consolação, 94. Debate com Anita Diak e Mariana Mendes. 19h
'Mulheres Empilhadas'. Autora: Patrícia Melo/ Editora: LeYa/ (240 págs., R$ 39,90)/ Lançamento: Biblioteca Mario de Andrade - Rua da Consolação, 94. Debate com Anita Diak e Mariana Mendes. 19h
Foto: Editora LeYa/ Divulgação / Estadão

São três partes: na primeira, a autora apresenta crimes reais a cada início de capítulo, exemplos que surpreendem pela brutalidade e cuja soma justifica o título do livro; a segunda se caracteriza pela história da protagonista; e a terceira, marcada por um tom onírico, mostra uma sociedade imaginária de icamiabas, mulheres indígenas que vão se vingar dos criminosos que escapam da Justiça na vida real. "Foi uma forma de alívio que encontrei, buscar na imaginação uma forma subliminar de vingança."

A pesquisa realizada por Emily aconteceu quando Patrícia escrevia o terço final do livro. "Assim, o Acre e o calor da floresta são reais, mas com muitos traços da minha imaginação." Mesmo assim, a escrita é direta, cortante. A autora costura os casos de uma forma a também mexer com o leitor, inconformado com decisões judiciais que mais privilegiam os réus. "A violência é silenciosa, pois destrói a confiança da vítima, que perde, aos poucos, a própria identidade."

Estadão
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