Monja Coen relembra luta contra o câncer: 'Tempo e oportunidade de muitas reflexões profundas'
Em entrevista à CARAS Brasil, Monja Coen ainda dá detalhes sobre a cerimônia e palestra de Ano Novo, que vai promover no dia 30 de janeiro, em São Paulo
Representante do Zen Budismo no Brasil, Monja Coen Roshi (77) vai realizar na próxima quinta-feira, 30, no Teatro Bradesco, em Perdizes, São Paulo, uma palestra de Ano Novo. A noite especial terá início com a Cerimônia Dai Hannya Gokito - um ritual de bênção e transformação tradicional da Escola Soto Zen Shu com elementos do budismo esotérico japonês. Em entrevista à CARAS Brasil, a líder religiosa e escritora fala do evento e abre o coração ao relembrar sua luta contra o câncer de pele. "Tempo e oportunidade de muitas reflexões profundas", reflete.
A cerimônia, que marca a abertura do Grande Livro Dourado da Grande Sabedoria Perfeita, tem como objetivo afastar energias negativas, enquanto promove proteção, harmonia e clareza. A noite será enriquecida com a palestra Reflexões sobre a Sabedoria, proporcionando momentos de inspiração e aprendizado. "Será o encontro de Ano Novo, marcado pela bênção da Sabedoria. Invocamos a sabedoria para que tenhamos discernimento correto e, assim, o ano seja bom. A Sabedoria é o elemento que afasta todos os sofrimentos e insatisfações", explica a monja budista.
"Entretanto, a sabedoria apenas, sem compaixão, não é suficiente. Precisamos abrir a capacidade de compreender com clareza o que está acontecendo e ter pensamentos, gestos, falas, atitudes, ações de plenas de ternura, de compaixão. Vamos iniciar o ano nos inspirando e lembrando que somos a vida da Terra, que a sacralidade da vida está presente em nós e que podemos manter o propósito de despertar nossa consciência individual e a consciência coletiva para o bem de todos os seres. Haverá uma bênção invocando a Sabedoria e a Compaixão para que sejam nossas companheiras na jornada de 2025", completa.
Questionada sobre como o ser humano pode alcançar a sabedoria, se é com a maturidade, Monja Coen pontua: "A sabedoria pode estar em uma criança e pode faltar em uma pessoa idosa. Quando encontramos uma pessoa mais sábia do que nós, podemos humildemente solicitar suas orientações. Se encontramos alguém que nos procure, pedindo apoio, seja quem for, podemos apoiar. Sempre lembrando que Sabedoria e Compaixão são um par indissolúvel (...) Vamos refletir sobre esses dois aspectos da psique humana".
MEMÓRIAS DE 2024 E ESPERANÇAS PARA 2025
A líder religiosa dá lição ao falar do ano de 2024. "Foi, passou. Deixou memórias e ensinamentos. Houve momentos de alegrias e momentos de preocupações. Não há nada fixo neste mundo. Completei 77 anos em 2024. Dizem, em japonês, que 77 é o ano da alegria, ano de congratulações. Verdade. Continuo viva, entretanto, tive que fazer cirurgia de pedras na vesícula e alguma dificuldade com meus dentes. Ou seja, a alegria, o contentamento dos 77 veio coroado de alguns desconfortos", ressalta.
E continua: "As obras em Campos do Jordão tiveram um impulso. Agora, temos uma edificação com telhado, mas ainda falta muito, e nossa campanha de arrecadação precisa ser estimulada em 2025. Veja bem, minha vida pessoal é ao mesmo tempo minha vida comunitária. Ser monja é abandonar a família pessoal, biológica, e se tornar membro da grande família da vida da Terra. Assim, sofri com as guerras, abusos, desabamentos, queimadas. Sofri - e sofro - todos os sofrimentos de seres humanos, de árvores, de animais, plantas, insetos, vento, terra, água e ar".
"Também apreciei o nascer do sol e da lua, a primeira estrelinha no céu me dando a dimensão maior da vida. Apreciei a determinação das pessoas atravessando perdas e se comprometendo a reerguer casas e cidades. A doçura da solidariedade, do compartilhamento, das doações de roupas, medicamentos, alimentos, materiais de construção. Reconstruindo o que precisa ser reconstruído. Essa clareza de que juntos somos mais fortes ficou explícita em 2024", reforça.
Para o ano de 2025, que está apenas começando, Monja Coen tem desejos especiais: "Espero de esperançar, de fazer acontecer, em 2025 o despertar da consciência humana. Tive contato pessoal, direto com Marcelo Gleiser e Ailton Krenak - o que reativa nossa militância pela responsabilidade individual e coletiva de perceber a sacralidade da vida na Terra. Precisamos cuidar, reciclar, reaproveitar materiais e transformar lixo orgânico em energia, por exemplo. Tudo que fazemos - quer seja nas plantações, nas compras , no uso e no descarte - tudo está interligado".
"Se cada pessoa no planeta puder se conscientizar e modificar pequenos hábitos, poderemos ter mais vida e mais abundância. Que despertem as lideranças internacionais e criem causas e condições de vida plena para o maior número de seres. É chegado o momento de nos atualizarmos para usar a IA com sabedoria e ternura, para reaprender a ouvir as árvores e o vento, as chuvas e as montanhas. Tudo vivo e tudo em movimento. Corrigir erros, controlar incêndios, compartilhar mantimentos, roupas, medicamentos, água e ternura. Que a humanidade desperte", acrescenta.
LUTA CONTRA O CÂNCER DE PELE
Em março de 2024, a líder budista e escritora revelou, por meio das redes sociais, que foi diagnosticada com câncer de pele. Em vídeos publicados no Instagram, ela afirmou que estava realizando o tratamento de quimioterapia localizada. "Foi um Carcinoma Bacilar - uma forma leve de câncer. A doença, o diagnóstico, a palavra câncer é assustadora. Pomada quimioterápica foi o que me assustou. Já havia removido vários pequenos carcinomas queimando com lazer. Meu pai também havia passado por situações semelhantes e morreu com 96 anos de idade - não morreu de câncer", fala.
"Agora, na pele fina do nariz havia o risco de penetrar a cartilagem e o tratamento precisaria ser mais eficaz. Feridas foram surgindo onde haviam células cancerígenas. Parecia a crosta ou a pele de um jacaré. Não me escondi. Pelo contrário, contei a todos o que estava ocorrendo. Fui chamada pelos grupos de pessoas com questões oncológicas: pacientes, médicas/médicos e enfermagem, terapias. Acreditar em quem está nos cuidando, seguir as instruções e participar das dificuldades, das dores, dos medos e da cura. Existe cura para sempre? Claro que não. Seria a morte, a cura para a vida? Vamos refletir (...) Foi tempo e oportunidade de muitas reflexões profundas. Viver é passar por situações inesperadas - agradáveis e desagradáveis. Assim, passei e o câncer passou por mim. Agora, as pessoas me encontram e se alegram: 'Você se curou'. Quem tem ou teve câncer, me cumprimenta em alegria e me conta de suas dores e tratamentos. Que tenha servido como um bom exemplo de paciência e persistência no caminho da recuperação da saúde, sem nunca perder o prazer na existência", emenda Monja Coen.
MAIS DE 30 LIVROS
Monja Coen é autora de mais de 30 livros, entre eles estão Em Cada Instante Vivemos e Morremos Bilhões de Vezes, Que Sementes Você está Regando?, Sobre o Amor, 108 Contos e Parábolas Orientais, Zen para Distraídos, O Sofrimento é Opcional, e O Monge e o Touro. "Nada é eterno. Textos escritos também são temporários. Gosto de escrever. Sinto prazer e surpresa sempre que vou escrever algo - uma forma de poder me compreender melhor. Oportunidade para estudar e apreender os ensinamentos que dão sentido à minha vida neste momento", reforça.
"Compartilho um olhar para a realidade, compartilho ensinamentos milenares numa linguagem simples e de fácil acesso. Minha missão é a de provocar as pessoas a ter reflexões mais sutis e profundas sobre a vida-morte, sobre nosso processo existencial, sobre nossa responsabilidade individual e coletiva pela vida. Cuidar, respeitar, ir além de preconceitos. Cultivar a paz, o respeito. Fazer votos para beneficiar a vida em sua plenitude. Escrevo porque me pedem, porque as editoras me procuram, porque você me fez perguntas e me deu esta oportunidade de brincar no teclado e deixar minha mente livre manifestar o que, às vezes, nem eu mesmo sabia que ali estava contido", continua a líder religiosa.
"Escrever é uma descoberta, sempre. De mim mesma, livros, programas, encontros, aulas, conversas. Informações e formações. Viver é uma festa, uma descoberta, uma aventura. Escrever é comunicar, procurar expressões, palavras, frases que façam algum sentido. Palavras que possam desconstruir frases feitas, fake news. Palavras, textos que provoquem o despertar da consciência humana. Será eternamente necessário? Ou haverá um momento em que estaremos - como humanidade - despertos?", completa.
ADMIRADORES POR TODOS OS CANTOS
Questionada sobre como é receber o carinho e a admiração de tanta gente que adora ouvi-la e ler suas obras, Monja Coen reflete: "Agradeço o carinho e o cuidado das pessoas que cruzam por mim nas ruas, nos aeroportos, nos supermercados, nos teatros, nas escolas, faculdades, nos eventos que participo e as que vem até o templo, aqui no bairro do Pacaembu, em São Paulo, para estudar, praticar. Fotos, autógrafos, sorrisos, carinhos. Claro que há também casos de pessoas que me consideram superpoderosa e capaz de salvá-las de seus próprios dramas. Isso não é verdade".
"Não sei fazer exorcismos. Há pessoas que se revoltam, que eu deveria cuidar dos monstros que as habitam e que deveria afastá-los. Isso não posso fazer. Posso indicar caminhos de autoconhecimento. Posso indicar especialistas em curas psíquicas e físicas, espirituais ou mentais. Não sou curandeira, nada sei sobre astrologia, não estudei Filosofia, Pedagogia, Psicologia nem Teologia, não tenho estudos acadêmicos. Leio, me interesso, escuto, reflito, oro e pratico zazen - meditação. Sou apenas uma religiosa Zen Budista, uma praticante de meditação e estudante dos ensinamentos de Buda, que encontrou na tradição Soto Shu um caminho. 'Cada pessoa que desperta, desperta o mundo todo' - frase de minha superiora no mosteiro no Japão. Cada pessoa que afunda no mar de sofrimento, causa sofrimento e dor a muitas outras. Por isso uso os ensinamentos, as práticas Zen para o despertar", emenda.
A monja budista volta a dizer que recebe muito carinho e muita gratidão das pessoas e revela que costuma ouvir frases como "depois que a conheci minha vida se transformou para muito melhor". "Sempre me surpreendem, pois, na verdade, não sou eu que curo, que liberto. É a pessoa que procura e são os ensinamentos sagrados que facilitam a cura e o despertar. Que todos os seres possam ser verdadeiramente plenos de vida, de amor, de ternura e cuidado. Que todos possam criar causas e condições de ser feliz", finaliza.
MAIS SOBRE MONJA COEN ROSHI
Monja Coen Roshi é missionária oficial da tradição Soto Shu do Zen Budismo e primaz fundadora da Comunidade Zen Budista Zendo Brasil. Ordenada em 1983, viveu 12 anos no Japão, onde aprofundou seus estudos e prática espiritual.
Ao retornar ao Brasil, a líder budista liderou as atividades do Templo Busshinji, sede da tradição Soto Shu na América do Sul, por seis anos. Em 2001, fundou o Templo Tenzui Zenji, em São Paulo, onde continua seu trabalho de orientação espiritual.
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