Briga sobre propaganda da Elis é muito boa (não pelo motivo alegado)
Vídeo de 70 anos da VW 'ressuscitou' a artista ao lado da filha, Maria Rita
O Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária) abriu representação ética contra a propaganda que “ressuscitou” Elis Regina ao lado da filha, Maria Rita, em propaganda de 70 anos da Volkswagen. E isso é bom. Mas não pelo motivo óbvio.
O motivo óbvio seria suposto deslize moral da agência responsável pelo deepfake que apresenta a cantora, falecida em 82, como se estivesse viva cantando “Como Nossos Pais”, do Belchior, junto à filha.
Particularmente, não me senti nem um pingo ofendido com isso e penso que é uma decisão da família da artista, herdeira do espólio de Elis Regina. E a decisão familiar me parece clara ao ter um dos filhos contracenando com ela.
O imbróglio aconteceu por reclamação de fãs, que se consideram ou herdeiros da obra ou da imagem da artista (ou de ambos), conforme nota do órgão: “O Conar abriu representação ética contra a campanha (...) motivada por queixa de consumidores”. O quanto isso é pertinente também é secundário.
A sequela boa da briga é o estabelecimento do primeiro debate de fronteiras éticas em relação ao uso da Inteligência Artificial em conteúdos de massa. E mais: sobre fato concreto.
Até então, tudo soou como ameaça: “se registrarem três segundos da sua voz podem montar um robô que irá falar como se fosse você, fazerem com que se passe por você em situação de sequestro, por exemplo, e obrigar um resgate imediato”. Ou pior: “se tiverem registros de imagem seu, podem manipular um vídeo que engana até sua mãe”. Nos dois casos, são como xixi na piscina - uma vez soltos é praticamente impossível recolher. E sempre é muito mais produtivo debater o “é” em vez do “se”, a realidade sobre a hipótese.
Portanto, a discussão tem que começar (na verdade tinha que começar há algum tempo). Que seja com a propaganda, que, mais uma vez particularmente, gostei.