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Chico Buarque lança registro ao vivo de 'Que Tal um Samba?' 

27 nov 2023 - 16h40
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Em 2022, Que tal um samba? fazia um convite hedonista no meio da travessia de horrores. Chico Buarque propunha um samba para o desconjuro da maré de fascismo e pandemia, ou de pura "demência", e nos fazia pensar em sua trajetória renovadora nesse gênero musical. Outra vez, Chico condensava a história do samba e a volta por cima da história, prevista por ele entre pavores e prazeres, como se desafiasse o país a evoluir junto com a sua linha melódica.

Nas imagens do banho coletivo de sal grosso, os jogos poéticos buarqueanos absorviam a língua das ruas, com rimas engenhosas, e punham a negritude e a cultura popular como obstáculos à "força bruta".

Foto: Leo Aversa / The Music Journal

O que temos com o DVD e o CD duplo e digital Que Tal um Samba? (Ao Vivo), gravados pela Biscoito Fino no Vivo Rio em 3 e 4 de fevereiro de 2023 é a resposta de Chico Buarque a essa travessia de "inferno e maravilhas", recorrendo ao seu cancioneiro de voo universal, uma janela ampla para o mundo.

No roteiro de 31 faixas, o compositor reúne músicas sem rugas do tempo e de significados novos quando espelhadas umas nas outras, acentuando o desenho de sua arte inclinada a inumeráveis jogos de armar. Todas as canções de longa idade ganham expressão inédita em sua releitura dinâmica. Para mover a história, Chico dispõe de canções de dimensão social e individual, política e romântica, dentro de uma poética transformadora da lírica brasileira. Essa maestria se confirmou ainda outro dia com Tua cantiga, seu lundu com Cristovão Bastos, uma aliança de forma ancestral e linguagem moderna.

O show Que Tal um Samba? reflete seu tempo histórico numa poética atemporal e reafirma o impulso de Chico Buarque em redimir os humilhados e as belezas de uma civilização ameaçada. Não há desconversa. As tensões surgem com Todos Juntos, sua versão para a peça infantil Os Saltimbancos (Sergio Bardotti e Luis Bacalov), Passaredo (com Francis Hime), Sinhá (com Edu Lobo), Assentamento, Bancarrota Blues (outra com Edu), O Meu Guri, As Caravanas, Deus lhe Pague e Que tal um samba?.

Foto: Leo Aversa / The Music Journal

Nessas canções, encaixadas em pontos exatos, sobrevoamos o medo ambiental, a crueldade fundadora do Brasil, o esculacho na população negra, o ressentimento dos injuriados e a maternidade trágica das periferias. Mas aflora a reação aos desconcertos. E a brisa de Bom Tempo.

Na turnê, ao dividir o palco com Mônica Salmaso, Chico estreitou o diálogo da cantora paulista com a sua obra, manifestado em álbuns como Voadeira (1999) e Noites de Gala, Samba na Rua (2007), este último totalmente dedicado ao repertório buarqueano, com uma regravação modelar de Beatriz.

Um ano antes, no álbum Carioca (2006), Chico convidara Salmaso a participar da faixa Imagina, uma de suas parcerias com Tom Jobim. Desde 1975, o ano do disco e show com Maria Bethânia, o compositor não dividia um projeto com uma intérprete.

A presença de Salmaso estimulou as expressões teatrais de Chico, mais solto nos duos e solos, e ergueu uma ponte entre a alma carioca do compositor e a musicalidade dos paulistas. Em mais de um plano, o show festeja o canto feminino, pois ainda homenageia Gal Costa (1945-2022), evocada em Mil Perdões, e Miúcha (1937-2018), com Maninha, o mergulho ficcional do cantor na infância com a irmã, além de tudo sua cúmplice nos primeiros estudos do violão da bossa nova.

Ouça o álbum:

The Music Journal The Music Journal Brazil
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