"É um disco de contrastes", diz Arnaldo Antunes sobre novo trabalho
Lançando primeiro disco de inéditas desde 2009, artista conta sobre novo processo de gravação e divulgação
Após uma extensa turnê com o Acústico MTV (2012) e umas férias merecidas em Ilha Grande, com os amigos Dadi e Marisa Monte no início do ano, que renderam boas composições, Arnaldo Antunes está de volta ao mercado com Disco – primeiro trabalho de inéditas desde Iê iê iê, de 2009, e que deu ao artista a oportunidade de gravar e lançar de uma maneira nova. A cada música finalizada, o cantor lançava a faixa em seu site oficial.
“O desejo de chamar o disco de Disco veio justamente da dinâmica que escolhemos para lançá-lo, que é o fato de eu gravá-lo sem interromper a turnê do acústico que estava fazendo”, disse Arnaldo ao Terra, depois de se apresentar no Terra Live Music Especial Natura Musical, na última terça-feira (15). “Então, como tinha um processo mais demorado, nós pensamos ‘por que não ir mostrando essas músicas na internet?’. E aí foi uma dinâmica super legal; essa liberdade de lançar essas faixas avulsas e ao mesmo tempo concebê-las como parte de um todo.”
Não só no processo de gravação Arnaldo inovou no seu trabalho. Disco também é um álbum de nuances – com composições recentes e aquelas de mais de uma década, além de estilos mais “serenos” e “pesados”. “Tem uma safra de músicas mais serenas e ao mesmo tempo tem rock pesado, como Vá Trabalhar e Sentido”, explicou. “Então é isso, ter esses contrastes, tudo isso eu acho que acaba refletindo uma ideia que trouxe para o álbum.”
Confira a entrevista completa:
Terra - Você disse que o nome Disco é uma reflexão sobre o que é um álbum fechado nos tempos de hoje. Como foi fazer esse trabalho pensando nesse paradigma da indústria musical em que não há mais a necessidade de se lançar discos?
Arnaldo Antunes - O desejo de chamar o disco de Disco veio justamente da dinâmica que escolhemos para lançá-lo, que é o fato de eu gravá-lo sem interromper a turnê do acústico que estava fazendo, gravando nas datas vagas entre os shows. E isso fez com que eu decidisse gravar num prazo mais largo, porque não era aquele intensivão de estúdio, que você dorme e acorda já querendo ir para o estúdio. Então, como tinha um processo mais demorado, nós pensamos “por que não ir mostrando essas músicas na internet?”, já que hoje em dia podemos fazer isso. E aí foi uma dinâmica super legal; essa liberdade de lançar essas faixas avulsas e ao mesmo tempo concebê-las como parte de um todo, que tem um conceito que amarra, que tem uma sonoridade que eu estou desenvolvendo nessa fase do meu trabalho... o disco tem esse retrato da fase de um artista, um grupo de canções que dialogam entre si e tudo isso eu acho importante também. Então, ao juntar essas coisas foi para jogar essa interrogação, desse lado paradoxal: ao mesmo tempo que a gente pode lançar faixa avulsas, tem a importância do conceito de um álbum. E aí, para confundir um pouco quis chamar o disco de Disco, que é justamente o disco que não comecei lançando como um disco e sim como músicas soltas.
Terra - Como é apresentar um trabalho novo em um programa como o Terra Live Music Especial Natura Musical – na internet e todo voltado para o artista – comparado com o que tem na TV?
Arnaldo Antunes -
Eu acho que a coisa da internet hoje é a gente nem saber quem tem mais público: a internet ou a TV. Os meus filhos estão cada vez menos vendo TV e cada vez mais vendo vídeo no YouTube, coisas na Internet, etc. Mas eu adorei, porque primeiro a qualidade de som estava muito boa e, depois, isso de poder tocar as músicas do disco novo, ao vivo, e entremear um papo sobre ele... a Lorena (Calabria, apresentadora do Terra Live Music Especial Natura Musical) é uma entrevistadora genial, super inteirada do assunto. Então, faz toda a diferença. Poder mostrar isso ao vivo é uma coisa que hoje em dia se faz muito pouco na TV. Todos os programas são gravados, sem querer depreciar a TV, que tem muitas coisas geniais, mas a internet te dá a liberdade de fazer esse tipo de coisa: fazer ao vivo, como se fosse um show, e poder bater esse papo e tal. Gostei muito.
Terra - Na semana passada Felipe Cordeiro apresentou aqui no Terra Live Music Especial Natura Musical a música Tarja Preta, que foi feita em sua parceria. E você também a gravou no Disco. Sempre foi ligado à música regional do Pará? Carimbó, lambada, guitarrada....
Arnaldo Antunes - Não sou um grande conhecedor, mas acho que de certa forma é muito próxima das coisas que a gente já conhecia, aquela coisa da lambada, o Carimbó mesmo. E a guitarrada eu acho um máximo. Adoro Aldo Sena e o Manuel Cordeiro, dois mestres. Enfim, acho que ali tem um lado super interessante com outros gêneros e, para mim, o fato de estar gravado não tem uma novidade, nem de querer ir atrás de uma onda e tal. Para mim isso é muito natural, tenho uma afinidade com o trabalho do Felipe, adoro o disco dele, já tinha composto com a Aluê... E tem coisas que passeiam por essa praia que já fiz, como o Invejoso, por exemplo, que a gente juntou no show com Tarja Preta.
Terra - Você disse que está em uma nova busca por uma sonoridade. Como é essa sonoridade hoje, já conseguiu caracterizá-la?
Arnaldo Antunes - Não. Eu acho que tem ansiedades mais recentes, mas não é um conceito que pré-defini e fui cumpri-lo. Na verdade, têm coisas que quis experimentar e nunca tinha feito antes, como, por exemplo, ter o som de banda junto com um quarteto de cordas – fiz três ou quatro músicas com isso –, os arranjos do Ruriá Duprat [sobrinho do maestro Rogério Duprat] dialogando com a gente, os metais, o fato de temos formações muitos diferentes. Então tem uma safra de músicas mais serena, que eu fui gravar no Rio de Janeiro com Daniel Jobim e César Mendes e Betão, e uma delas com Davi Moraes, Marcelo Calado e Betão. Então é uma formação muito minimalista, cool, serena e bossa nova assim. Ao mesmo tempo teve rock pesado, como Vá Trabalhar e Sentido, essas duas últimas que a gente tocou aqui, entre outras. Então é isso, ter esses contrastes, tudo isso eu acho que acaba refletindo uma ideia que trouxe para o álbum. Essa é a ideia que falei para a Lorena, de que eu tinha o desejo de fazer um disco bipolar, então, um pouco dessa ideia está no disco, apesar de ter um corpo de músicas mais recentes, que são essas canções pop, como Muito, Muito Pouco, Dizem e Tarja Preta.
Terra - Você disse que gravou o disco no meio da turnê, sem prazo para finalizá-lo. Essa maneira de fazer as duas coisas simultaneamente, sem pressão de gravadora e produtor, foi uma maneira que você buscava?
Arnaldo Antunes - Eu acho que sempre pude fazer, é que sempre me acostumei a gravar de outra forma. Por exemplo, a gente entrava no estúdio para fazer um disco, gravava todas as bases e daí todos os overdubs, todas as vozes, aí mixava tudo e só aí você ia ouvir o resultado. Agora não. Como tinha esse desejo de já mostrar na internet, já gravava base, overdub, voz, mixava, masterizava e punha na rede. Então, finalizava cada canção antes de passar para a próxima. Às vezes não. Às vezes entrava e gravava duas bases, daí punha vozes em uma, enfim, era um processo mais aleatório, dependendo do desejo de cada sessão de estúdio. É legal porque você vai sentindo o resultado do disco e isso vai excitando, motivando. Claro que no final do processo eu tive que pegar um intensivão de estúdio, porque a gente viu que o prazo para lançar em outubro estava apertando e a gente deu um gás no último mês assim. Mas desde abril, quando a gente começou a gravar, foi bem tranquilo.
Terra - Beck recentemente nos disse que tem um monte de músicas gravadas para lançar, mas que hoje há muita coisa na internet sendo lançada, e que está esperando o momento certo para mostrar algo mais grandioso, procurando um novo conceito. Você já pensou em alguma nova maneira de trazer um novo formato para a música?
Arnaldo Antunes - Eu acho que tudo é muito novo, essa possibilidade de não se fazer um disco, mas outro material. Ao mesmo tempo em que é muito parecido com o tempo dos compactos simples, compacto duplo, que é a minha infância, acho que há uma liberdade de meios de explorar a internet, para veicular, para produzir, para dialogar inclusive com imagens e músicas, interatividade... Então, tem todo um repertório de recursos novos dos quais cada artista vai achando uma maneira de se relacionar com ele. Eu não acho que isso vai substituir o disco, nem nada disso, acho que tem um número maior de possibilidades de você explorar. E isso é bacana, claro, e cada artista vai lidar de um jeito e descobrir formas. A minha forma mais recente de transformação do meu processo usual de fazer um disco aconteceu nesse disco.