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Num único personagem, os machistas, moralistas e homofóbicos

Em Segundo Sol, a ignorância tem nome: chama-se Agenor, pior marido e pai da teledramaturgia atual

19 jul 2018 - 11h50
(atualizado em 20/7/2018 às 10h47)
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Bonachão, o ator Roberto Bonfim quase sempre foi escalado para personagens pacíficos e risonhos. Entre tantos, o Amintas de Tieta (1989/1990) e o Salvador de Celebridade (2003/2004). Eis que, aos 73 anos, ele interpreta um dos piores vilões vistos recentemente na TV.

No folhetim das 21h da Globo, Agenor se comporta como um homem das cavernas. Exige submissão absoluta da mulher, Nice (Kelzy Ecard), e expulsou de casa as duas filhas: Maura (Nanda Costa) foi escorraçada por ser lésbica; Rosa (Letícia Colin) acabou humilhada em razão de ser prostituta.

O autor João Emanuel Carneiro concentrou no troglodita a representação de vários comportamentos execráveis. A começar pelo machismo.

Agenor (Roberto Bonfim) é ficção baseada na vida real: a intolerância destrói belas famílias
Agenor (Roberto Bonfim) é ficção baseada na vida real: a intolerância destrói belas famílias
Foto: João Miguel Jr. / TV Globo

Autoritário, Agenor debocha da aparência e das capacidades da esposa. Chegou a destruir as marmitas que a dona de casa fazia escondido para ajudar no orçamento doméstico. Como ‘homem da família’, não admite que Nice trabalhe. “Não preciso de mulher nenhuma me ajudando”, costuma repetir. O marido carrasco exige que a esposa se dedique unicamente ao lar – e faça as vontades dele, sem jamais contentá-lo.

Assumidamente homofóbico devido a dogmas religiosos, não aceita a orientação sexual daquela que era seu maior orgulho, a filha policial Maura, tampouco compreende a força do amor que a jovem sente pela ex-vizinha Selma (Carol Fazu). “Fanchona”, “mulher-macho” e “pau que nasceu torto” foram alguns dos tratamentos dispensados à primogênita. Em suas palavras, Maura e Selma “estão do lado do pecado”.

Ao descobrir que sua filha rebelde, Rosa, trabalha como garota de programa, Agenor surta. Aos gritos de “vagabunda”, ele leva a moça para o meio da rua e a manda embora. Incrédulos, os vizinhos assistem ao show de ignorância. Para o pai déspota, as duas herdeiras estão “mortas”.

Mas o valentão não canta de galo no restaurante onde trabalha como ajudante de salão. Lá, quem manda é a patroa, Cacau (Fabíula Nascimento). Frequentemente, Agenor recebe repreensões pelo serviço malfeito sem dar um piu. Mas, pelas costas, critica a independência feminina simbolizada pela chef de cozinha.

O personagem verbaliza os mesmos radicalismos que intoxicam as redes sociais. A atuação vigorosa de Roberto Bonfim faz o telespectador conservador ser confrontado por uma versão fictícia dele próprio.

Segundo Sol mostra que, às vezes, a intolerância dentro de casa é tão cruel quanto as discriminações em sociedade. Uma bonita família pode ser esfacelada por conta da falta de diálogo e empatia, e da recusa em superar preconceitos primitivos.

A escolha do nome Agenor não deve ter sido ao acaso. Tem origem no grego Agénos e um dos significados é homem bravo.

Braveza esta que, cedo ou tarde, será substituída por extrema fragilidade e dor. Não há outro final possível para o brutamontes: a vida vai cobrar dele um preço alto por provocar tanta injustiça e sofrimento.

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