Script = https://s1.trrsf.com/update-1765905308/fe/zaz-ui-t360/_js/transition.min.js
PUBLICIDADE

'Sem Palavras': Peça traz ciclo de transição de corpos e mentes

Dirigido por Márcio Abreu, espetáculo é baseado em crônicas de Paul B. Preciato

25 jul 2021 - 05h10
(atualizado às 11h18)
Compartilhar
Exibir comentários

Em tempo de confinamento e imobilidade, a Companhia Brasileira de Teatro planeja evocar no palco a sensação contrária. Em seu novo espetáculo, Sem Palavras, o grupo de Curitiba se põe a tratar de travessias e trânsitos. Flagra momentos de instabilidade que são motor para o movimento e o novo. Neste domingo, 25, às 19h, o público terá a chance de ver virtualmente uma parcela desse percurso criativo. Em transmissão ao vivo pelo YouTube, será possível acompanhar alguns dos caminhos trilhados pelos artistas, além de um debate com a transativista Helena Vieira.

Cena do espetáculo 'Sem Palavras', da Companhia Brasileira de Teatro
Cena do espetáculo 'Sem Palavras', da Companhia Brasileira de Teatro
Foto: Nana Moraes/Divulgação / Estadão

m dos principais nomes dos estudos de gênero, o filósofo e escritor espanhol Paul B. Preciado fornece os alicerces para a peça. Curiosamente, porém, não é de um de seus livros de teoria queer que inspira o trabalho, mas uma coletânea de crônicas, Um Apartamento em Urano. Publicadas entre 2010 e 2018 no jornal francês Libération, as histórias de Preciado flagram a travessia do autor em seu próprio corpo: se os primeiros textos são assinados como Beatriz, o ciclo termina com um novo registro social, Paul. Esse percurso, porém, não se encerra sob uma perspectiva individual: a necropolítica, o ocaso das democracias ocidentais, a crise econômica na Grécia, tudo isso é grão para o seu moinho criativo.

"O fato de essas crônicas conviverem dentro da estrutura de um livro, com um prefácio e uma introdução, cria uma outra camada de interpretação, quase como uma dramaturgia, que une assuntos tão diversos", considera o diretor Márcio Abreu, que assina a dramaturgia com Nadja Naira. "Nesses textos, ele consegue materializar uma série de transformações e urgências do nosso tempo. Mas, por serem crônicas, essa fala está deslocada de um contexto acadêmico intelectual para um território mais pop. E o seu pensamento ganha em potência."

As histórias de Um Apartamento em Urano foram escritas entre viagens do escritor, em quartos de hotéis e moradias provisórias. Em Sem Palavras, oito intérpretes mostram seus deslocamentos no interior de um apartamento. Como em obras anteriores da companhia, a encenação não traz propriamente uma trama e sim um feixe de instalações sonoras, imagens, movimentações e ações de cunho performativo - episódios com e sem falas. As formas de fruição disponíveis aos espectadores é que são distintas agora: além da transmissão do processo criativo, também será possível visitar uma videoinstalação no Centro Cultural Oi Futuro, no Rio.

A estreia da peça, contudo, não deve ter versão digital. "Também cabe a nós, artistas, reivindicar determinadas condições. Eu preciso que a obra aconteça primeiro no teatro e com o público, antes de pensar em transmiti-la virtualmente", diz Abreu. Resultado de uma coprodução internacional, o espetáculo passará pela França e Alemanha em setembro e outubro e deve chegar ao Brasil para sessões presenciais apenas em 2022.

Cena do espetáculo 'Sem Palavras', da Companhia Brasileira de Teatro
Cena do espetáculo 'Sem Palavras', da Companhia Brasileira de Teatro
Foto: Nana Moraes/Divulgação / Estadão

Na ficha técnica da montagem, integrantes antigos do grupo estão ao lado de novos colaboradores, como o performer Fábio Osório, a dançarina Key Sawao e as irmãs Brasil, uma dupla de artistas travestis. Diante do cansaço da linguagem, que não mais dá conta de abarcar o horror e o espanto de nossos tempos, surge a potência dos corpos. "Nós estamos estupefatos, sem saber o que dizer. Mas para aqueles a quem sempre foi negada a voz, as palavras borbulham", diz o diretor. "Essas pessoas que estão na peça refletem um pouco as questões que atravessam a dramaturgia. São corpos diferentes, que falam de lugares sociais diferentes."

Ainda que parta de textos de um pensador estrangeiro, a nova criação pode ser encarada como desdobramento de uma trilogia "brasileira". Nas recentes Projeto Brasil (2015) e Preto (2017), não se ambicionava traçar propriamente um retrato de país, mas uma reflexão afetada pela vivência de Brasil daqueles artistas. Em Projeto Brasil, mirava-se a própria impossibilidade de se fazer uma síntese dessa sociedade múltipla e fragmentada. Com Preto, a dinâmica era semelhante. O racismo não era um assunto, era um lugar a deixar evidente a falência de nossos discursos.

Gestada durante a pandemia, Sem Palavras mantém a contradição: não se lança a revolver os destroços de país resultantes da crise atual, tampouco escamoteia o estado de falência de onde parte. "É como se a transformação pudesse ser entendida como um lugar que a gente habita, um território. E não apenas como o deslocamento de um ponto a outro", considera o diretor.

Estadão
Compartilhar
TAGS
Publicidade

Conheça nossos produtos

Seu Terra












Publicidade