Smith/Kotzen: Richie Kotzen fala à RS sobre 2º álbum com Adrian Smith, músicos brasileiros e mais
Projeto une integrante do Iron Maiden e virtuoso das seis cordas em busca de sonoridade orientada ao blues e hard rock clássico dos anos 1970
Richie Kotzen admite: sequer considerava que teria a chance de gravar um álbum com Adrian Smith. Os dois guitarristas, juntos no Smith/Kotzen, formaram uma improvável amizade por morarem próximos, em Los Angeles, nos Estados Unidos.
O primeiro, americano de 55 anos, se destacou como um virtuoso do instrumento no fim dos anos 1980, entrou para bandas como Poison e Mr. Big nas décadas seguintes, esteve no comando do The Winery Dogs e lançou dezenas (!) de álbuns solo. O segundo, inglês de 68, é integrante do Iron Maiden e um dos nomes mais celebrados da história do heavy metal.
A junção rendeu não apenas um álbum, como dois. Quatro anos após a estreia homônima, o duo se une para lançar Black Light/White Noise, que chega nesta sexta-feira, 4, às plataformas de streaming. Em entrevista à Rolling Stone Brasil, Richie destaca: "Estávamos felizes com o primeiro álbum. Nunca pensei que estaríamos na posição de fazer um disco. E agora, estamos aqui com o segundo, então estou muito feliz".
Este segundo trabalho segue as diretrizes do primeiro, no sentido de soar bastante inclinado ao rock clássico e blues rock da década de 1970. Também repete o método: os guitarristas também assumem vocais e a maior parte do baixo e da bateria. Quando não estão a cargo dos dois últimos instrumentos, contam com brasileiros: Julia Lage, esposa de Richie, nas quatro cordas; Bruno Valverde, membro do Angra, com as baquetas em mãos. Lage e Valverde também integram a banda de apoio do duo nos raros shows realizados até agora.
Neste bate-papo, Richie Kotzen discute a parceria com Adrian Smith em camadas distintas: processo de criação, orientação sonora e destaques do repertório de Black Light/White Noise. Também conta um pouco sobre seus planos solo e fala rapidamente sobre The Winery Dogs, projeto com Billy Sheehan (baixo, Mr. Big) e Mike Portnoy (bateria, Dream Theater) atualmente em estado de hibernação. Confira!
O novo álbum e o contexto da parceria
Rolling Stone Brasil: Você já lançou muitos álbuns, especialmente como artista solo. Mas há um sentimento diferente quando é um álbum com uma banda ou uma colaboração como essa?
Richie Kotzen:"É diferente. Um álbum solo é mais pessoal e eu faço álbuns solo desde 1989, é natural para mim. Mas as colaborações também são ótimas. Acho que, com este álbum, Adrian e eu realmente tivemos algumas conexões incríveis na troca de solos de guitarra e na nossa afinidade musical. Nos conectamos com o blues rock do início dos anos 1970, mas seguimos caminhos diferentes. Tenho uma certa influência de jazz fusion que ele não tem muito, assim como ele tem influências que eu não tenho. Isso traz uma variedade ao som."
RS: Quando conversamos em 2021, perto da época do primeiro álbum, você me disse que trabalhar com o Adrian era uma das coisas mais legais que você já tinha feito em toda a carreira. Você estava esperando lançar um segundo álbum ou pensava em uma colaboração única?
RK:"Costumo apenas permanecer no momento em que estou. Inicialmente, a ideia era fazer um álbum com Adrian do qual gostássemos. Queríamos fazer turnê, mas na época não foi possível por causa da pandemia. Depois, nos reunimos, criamos algumas coisas e, de repente, tínhamos ideias de músicas. Tudo aconteceu de forma espontânea."
RS Sei que você e Adrian compartilham algumas influências, como você mencionou antes, como bandas de hard rock dos anos 1970. Mas vocês vêm de origens diferentes, como também mencionou antes, além de países diferentes, culturas diferentes e, especialmente, carreiras distintas, já que ele tem uma forte conexão com uma banda, enquanto você desenvolveu uma longa carreira solo, com bandas entrando ocasionalmente na sua trajetória. Com essas diferenças, o que você acha que fez sua parceria com ele funcionar tão bem?
RK:"É interessante. Acredito que aplicarmos a mesma abordagem dos meus álbuns solo quando trabalhamos juntos, como na composição ou na gravação. O estúdio já está todo configurado e pronto para gravar qualquer instrumento, seja bateria, guitarra ou vocal. Isso permite que, a qualquer momento, possamos alternar entre os instrumentos e gravar de forma contínua. Isso significa que, nesta semana, eu posso ter uma música quase finalizada, mas depois pensar: 'Ah, não gostei muito da virada de bateria no segundo verso'. E aí, uma semana depois, posso voltar e mudar isso."
Ver essa foto no Instagram
RS: Na maioria dos seus álbuns, e mesmo quando trabalhou com bandas, essa ideia sonora é mais solta. Você não se preocupa muito com gêneros, como soar exatamente como blues rock, hard rock ou jazz fusion. Mas este álbum, assim como o anterior, tem uma direção mais específica. Foi desafiador ter que se encaixar nessa sonoridade de hard rock clássico com influência de blues?
RK:"Você levantou um bom ponto. Na verdade, não foi desafiador, porque essas foram as músicas que criamos. Quando você é uma pessoa só, você tem muitas ideias, então grava e junta tudo. Nesta situação, não criamos nada que não esteja no estilo que você acabou de descrever. Nunca paramos para dizer: 'ah, precisamos manter isso nessa direção'. Acontece que o que compomos simplesmente segue esse caminho. É um fenômeno muito interessante, mas não há um esforço consciente."
Conversando sobre o(s) parceiro(s)
RS: E como você descreveria o estilo do Adrian como guitarrista, seja na criação de riffs ou solos? Nós, fãs, temos uma ideia pré-concebida sobre ele como guitarrista por causa do Iron Maiden, mas quero saber a sua perspectiva, já que pôde trabalhar de perto com ele.
RK:"Ele é exatamente o que você imagina: muito melódico, muito ligado ao blues, tem alma e está completamente conectado ao que faz. Não é um mistério. Verbalizar isso é muito mais difícil do que ouvir o músico, mas eu diria que ele é um guitarrista muito cheio de alma e muito melódico."
RS: E quanto aos vocais do Adrian? Sei que ele não é um cantor de primeira viagem, é claro, mas esse é um lado que muitos fãs ainda não conhecem tão bem. Como é trabalhar com esse lado dele como cantor?
RK:"Ele é um ótimo cantor no sentido de ter um ótimo timbre de voz. Isso é algo difícil de ensinar: você tem ou não tem. E ele tem um timbre muito natural e cativante na voz. Acho isso muito importante. Além disso, assim como na guitarra, há um elemento de alma na voz dele que transparece."
Ver essa foto no Instagram
RS: Como se deu a participação de Julia Lage, sua esposa, neste álbum? Sei que ela tocou em "White Noise" e em outras quatro faixas, pelo menos de acordo com o comunicado à imprensa.
RK:"Não me lembro das outras músicas, mas realmente são cinco e ela é uma ótima baixista, acrescenta à equação. Havia algumas músicas nas quais eu ou o Adrian tinha feito o baixo como guia, mas quis uma personalidade diferente, então pedi para ela tocar. Ela acrescentou uma dimensão à música. Além disso, ela é uma ótima cantora e uma excelente compositora. Ao vivo, ela é a baixista dos shows e realmente agrega muito. E, claro, somos casados, o que adiciona um outro elemento à dinâmica. Fico muito feliz por tê-la envolvida no projeto."
RS: Também preciso perguntar sobre outro brasileiro, Bruno Valverde. Ele está nos videoclipes de "White Noise" e "Black Light", mas ele realmente toca em alguma faixa do álbum?
RK:"Curiosamente, sou eu quem toco bateria em "White Noise" e "Black Light", mas ele está no vídeo. No álbum, ele toca nas músicas "Dark Side" e "Wraith". E, assim como a Julia, ele é nosso baterista ao vivo. Ao vivo ele é um baterista incrível. Temos essa espécie de seção rítmica brasileira, o que acho muito legal."
Próximos planos: Smith/Kotzen, solo e The Winery Dogs
RS: Você disse que não há planos para tocar ao vivo com o Adrian este ano, embora você e o Maiden não tenham shows anunciados para os últimos meses de 2025. Há algum motivo?
RK:"Agenda. Estamos tentando agendar para tocar no próximo ano. Acho que seria ótimo, mas este ano temos compromissos prévios. Gostaria de tocar mais ao vivo, mas acho que isso está mais para frente."
Ver essa foto no Instagram
RS: Você tem alguns shows solo agendados nos Estados Unidos e no Japão entre maio e junho, mas há outros planos de turnê, certo?
RK:"Sim, terá uma grande turnê na América do Norte, no outono [primavera no hemisfério sul], com meu trio."
RS: Daí preciso te perguntar: e o Brasil?
RK:"Adoro tocar no Brasil. Assim que eu puder ir, eu irei. Não ia há bastante tempo. Acho que a última vez foi no festival Summer Breeze [hoje Bangers Open Air] com The Winery Dogs. Então, é só uma questão de tempo até voltar."
RK: Você disse em outra entrevista que o Winery Dogs entrou novamente em hibernação após o retorno do Mike Portnoy ao Dream Theater. Sei que ainda é cedo, mas você vê o Winery Dogs tendo um futuro em algum momento? Ou você acha que a banda pode ter acabado de vez?
RK:"Essa é uma pergunta difícil de responder. Quero dizer, 'para sempre' é bem complicado. Não vejo nada acontecendo no futuro imediato. Acho que a vibe da banda, quando tocamos o show, foi amigável, mas no momento não vejo nada acontecendo a curto prazo."
Comentários sobre faixas de destaque do novo álbum
"Black Light" | Richie Kotzen:"Quase a descartamos. Achei que havia algo especial nela, mas não conseguíamos levá-la para o lugar certo. Então, um dia, silenciei o refrão, que estava com vocais com um título diferente. Mantive o verso e o pré-refrão. Toquei para o Adrian e ele achou muito bom. Tudo o que precisamos fazer é mudar o refrão, só as palavras e a melodia."
"Muddy Water" | RK:"Já estava praticamente finalizada de início. Eu a compus, só faltava adicionar Adrian. Ele ouviu e gostou muito. Ele criou a introdução, mas o corpo da canção já estava bem gravado antes de nos juntarmos. Achei que combinaria muito com Smith/Kotzen."
"White Noise" | RK:"Esta veio de Adrian, um riff dele, mas tinha um título diferente. Trabalhei no refrão, criei a melodia, mas o riff é dele. Nosso processo é assim: um traz um riff, o outro escuta e diz: 'ah, isso é bom, vamos trabalhar nisso'."
"Dark Side" | RK:"Esta é de Adrian. Lembro que gostei muito dela. Compus o pré-refrão e a ponte, enquanto o refrão e o verso vieram do Adrian. Quando ouvi, pensei: 'precisamos gravar, porque não temos nada parecido'. Trouxe Bruno para tocar pois sabia que já havia tocado bateria o suficiente. Isso surgiu mais para o final do processo. Nós dois concordamos: 'ah, o Bruno está na cidade, vamos ver o que ele faz'."
"Beyond the Pale" | RK:"Começou com a ideia daquela introdução com a guitarra, algo que o Adrian tinha no computador. Não sei há quanto tempo ele tinha isso. Ele tinha a introdução e o verso, e então eu compus o refrão e o final. Percebi que seria uma música de fechamento justamente por causa da virada que ela dá no final."
*Ouça Black Light/White Noise nas plataformas de streaming.
Rolling Stone Brasil especial: Iron Maiden
Iron Maiden na capa: a Rolling Stone Brasil lançou uma edição de colecionador inédita para os fãs da banda de heavy metal. Os maiores álbuns, a lista dos shows no Brasil, o poder do merchadising do grupo e até um tour pelo avião da banda você confere no especial impresso, à venda na Loja Perfil.
+++ LEIA MAIS: P.O.D.: Sonny Sandoval fala à RS sobre single com argentino, Brasil e carreira
+++ LEIA MAIS: Beat no Brasil: Adrian Belew fala à RS sobre show, supergrupo e King Crimson dos anos 80
+++ LEIA MAIS: Steven Wilson fala à RS sobre The Overview, insignificância humana, prog e Brasil
+++ Siga a Rolling Stone Brasil @rollingstonebrasil no Instagram
+++ Siga o jornalista Igor Miranda @igormirandasite no Instagram