Bolsonaro sinaliza que não vai facilitar a vida da imprensa
Presidente eleito critica a mídia tradicional e usa as redes sociais como veículo principal para falar ao povo
Novo presidente, nova comunicação. A equipe de Jair Bolsonaro convocou coletiva de imprensa na tarde de quinta-feira (1º de novembro), na casa do presidente eleito, num condomínio à beira-mar na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio.
Nem todos os jornalistas conseguiram autorização para participar do encontro. A prioridade foi dada a representantes de emissoras de TV e grandes portais de notícias.
Repórteres de agências internacionais e de jornais importantes – como o inimigo número 1 do político, a Folha de S. Paulo, além de O Globo e O Estado de S. Paulo – ficaram do lado de fora, literalmente.
Essa exclusão atípica foi amplamente repercutida na mídia. A quem estava presente, Bolsonaro minimizou o papel da imprensa convencional em sua eleição. “Eu cheguei aqui (a vitória nas urnas) graças às mídias sociais”.
O presidente eleito segue o exemplo de Donald Trump ao usar a comunicação digital como principal meio para se dirigir ao País. Dessa maneira, os dois reafirmam o desprezo pelo jornalismo que tanto atacam e do qual se sentem perseguidos.
Na rede social preferida por ambos, o Twitter, o líder dos Estados Unidos possui 55 milhões de seguidores, número equivalente a 17% da população norte-americana. Bolsonaro tem 2,3 milhões – cerca de 1% do total de brasileiros.
No Instagram, Trump está com 10 milhões de fãs. O próximo comandante do Brasil, quase 7 milhões. São 24 milhões de seguidores do norte-americano no Facebook, enquanto o brasileiro acumula quase 10 milhões.
Bolsonaro vence o colega conservador no YouTube. O militar reformado registra 2,2 milhões de inscritos em seu canal, onde os vídeos foram vistos 74 milhões de vezes até agora. Donald Trump tem apenas 125 mil inscrições e 6 milhões de visualizações. O canal oficial da Casa Branca também possui índices menores do que o de Jair Messias: 1,1 milhão de inscritos, 70 milhões de exibições.
Num mundo onde as pessoas focam sua atenção na tela do celular, veem cada vez menos TV e compram poucos jornais e revistas, o futuro chefe do Poder Executivo do Brasil se fortalece ao não ser dependente da imprensa tradicional para se comunicar.
O escritor e filósofo italiano Umberto Eco (1932-2016), dedicou parte dos últimos anos de vida a analisar as transformações na mídia. Até escreveu um romance sobre a crise no jornalismo contemporâneo, Número Zero (Editora Record), com a trama de um magnata que usa o poder de influência de um jornal de sua propriedade para intimidar os rivais.
Em 2015, ao ser entrevistado por Juan Cruz do diário espanhol El País, Eco disse uma frase com efeito profético: “A internet pode tomar o lugar do mau jornalismo”.
Para não sucumbir em importância diante das redes sociais e das fake news, o jornalismo profissional vai precisar provar sua relevância dia após dia. Bolsonaro e Trump não parecem dispostos a facilitar essa árdua missão.
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