Em ‘Gênesis’, Eva sofre com um Adão machista e agressivo
Estreia de novela bíblica da Record tira alguns pontos do ‘Jornal Nacional’
Diálogos superficiais, excesso de computação gráfica com efeitos nem sempre convincentes, teledramaturgia prejudicada pelo explícito tom doutrinador. Os pontos fracos do primeiro capítulo de Gênesis foram relevantes, mas a novela entregou o que foi prometido: a visão criacionista a respeito do mundo embalada por imagens bonitas, entretenimento escapista em momento crítico da pandemia de covid-19 no Brasil. Marcou média de 15 pontos, índice positivo. Análise dos dados prévios do Ibope mostra que a produção bíblica tirou alguns pontos do Jornal Nacional e de A Força do Querer.
Logo no início do capítulo, os autores apresentaram versão curiosa sobre a expulsão do anjo usurpador Lúcifer (Igor Rickli) do céu. O impacto de sua queda na Terra, com o corpo em chamas e ao lado de apoiadores igualmente punidos, teria causado a extinção dos dinossauros e demais seres vivos no planeta. Interessante enquanto ficção. Logo Deus (representado por uma voz ‘a la Cid Moreira’) criou Adão (Carlo Porto), belo e malhado como um modelo de campanha de cuecas.
Dele surgiu Eva (Juliana Boller). E aí surgiram os problemas. Após curto período de hedonismo, a primeira mulher comeu o fruto proibido e convenceu o companheiro a prová-lo também. Começou o martírio da pobre Eva. Poucas vezes se viu uma personagem ser tão maltratada pelo par romântico logo no primeiro capítulo de uma novela. Insultos, apertão no braço, empurrão, ameaças verbais, olhares furiosos, sinais de desprezo. Adão se tornou um marido ignorante, agressivo e detestável. Gênesis mostra Eva como a primeira vítima de relacionamento abusivo da história.
Trechos do segundo capítulo revelam que ela vai comer o pão que o diabo amassou ao ser humilhada também por sua descendência. Nem as Helenas do autor Manoel Carlos sofreram tanto logo de cara. Exageros à parte, Gênesis apresenta potencial para ser uma novela bem-sucedida. As reviravoltas da dramaturgia bíblica e a grandiosidade visual das cenas podem segurar o público. Ainda é cedo para dizer se há chance de repetir o fenômeno de Os Dez Mandamentos, exibida entre 2015 e 2016, quando a RecordTV derrotou várias vezes a Globo.