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O dia em que Dercy contou ter sido violentada na velhice

A humorista sempre defendeu ao seu modo a liberdade da mulher e o combate ao machismo

17 jul 2020 - 11h44
(atualizado às 13h55)
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No domingo, dia 19, a morte de Dercy Gonçalves completará 12 anos. Inigualável e insubstituível, a comediante faz gigantesca falta no mundo artístico. Não somente por suas performances hilárias recheadas de palavrões, mas também pelas histórias e reflexões a respeito da sociedade e do ser humano. Uma de suas melhores entrevistas foi concedida a Bruna Lombardi no programa Gente de Expressão, na TV Manchete, em 1993. Foi quando Dercy revelou surpreendente episódio de violência ocorrido anos antes.

Dercy dizia que gostava da companhia de um homem para "conversar e dançar", mas não queria saber de casamento
Dercy dizia que gostava da companhia de um homem para "conversar e dançar", mas não queria saber de casamento
Foto: Reprodução

A humorista estava em Londrina, no norte do Paraná, para encenar um espetáculo. O dono de um jornal local, que colaborou com a divulgação da peça, a convidou para um passeio de carro à noite. Dercy aceitou em retribuição ao apoio recebido. Quando ela se deu conta, o veículo estava em um lugar afastado da cidade. O empresário a atacou.

"Ele quis arrancar minha roupa. 'Eu tiro'. Eu não era nenhuma donzela. Ia deixar ele fazer o que ele quisesse. Se beijasse na minha boca, eu vomitava", contou a artista. "Fez... Trepou... Machucou, porque eu já tinha sessenta e poucos anos, quase setenta. Me machucou toda porque eu não tinha relações com ninguém. Machucou, me sangrou, eu quase não podia andar."

Bruna Lombardi ficou compreensivelmente chocada. Na mesma conversa, Dercy explicou por que nunca quis se casar na maturidade. "Homem é ótimo, mas para quem tem condição de suportar, de aguentar... É uma mão de obra, eu não tenho estrutura." Revelou ainda a exceção. "Me casava com o Roberto Marinho (fundador da TV Globo). Era o único homem que eu queria. Um homem rico, com muitas ocupações, não vai encher meu saco."

Muito antes das pautas do movimento feminista, Dercy já lutava contra o machismo, o sexismo e a misoginia. Destemida, derrubou barreiras e tabus. Abriu caminho para que as mulheres em geral tivessem a liberdade de dizer o que pensavam e agissem conforme a própria vontade. "Nunca precisei de homem para nada", dizia.

Bruna Lombardi e Dercy na entrevista que impressionou os telespectadores em 1993
Bruna Lombardi e Dercy na entrevista que impressionou os telespectadores em 1993
Foto: Reprodução

Naquela entrevista de 27 anos atrás, ao ser questionada sobre o futuro, Dercy Gonçalves respondeu bem ao seu estilo. "Eu tô a fim de cumprir minha caminhada, chegar do outro lado e ficar olhando de lá a merda que está aqui." Ela certamente está xingando muito o Brasil de 2020.

A grande comediante morreu aos 101 anos. Está no Guinness Book como a artista com a carreira mais longa do planeta. Foram 86 anos fazendo rir no teatro, no cinema e na TV, e estimulando plateias e telespectadores a serem mais autênticos e ousados. Bravo, Dercy, bravíssimo!

A entrevista completa pode ser assistida no canal de Bruna Lombardi no YouTube.

(Nota adicional: a cada 11 minutos, uma mulher é estuprada no Brasil, de acordo com o Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Em 2018 foram 66 mil casos registrados pelas forças policiais.)

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