Ódio a Regina Duarte faz Viúva Porcina deixar de ser amada
Revisionismo provocado pela militância ideológica da atriz transforma a personagem em ícone reacionário
Trinta e cinco anos depois, a protagonista de 'Roque Santeiro' perde parte de seu encanto. A inesquecível Viúva Porcina - uma das personagens mais populares da história da teledramaturgia brasileira - agora é submetida a uma revisão histórica, assim com inúmeras figuras reais julgadas pelos movimentos antirracistas mundo afora. A dama espalhafatosa de Asa Branca, cidade interiorana representativa do conservadorismo brasileiro do passado e do presente, foi atingida pelo desprezo direcionado a sua intérprete, Regina Duarte.
O ativismo da atriz nas redes sociais em prol de pautas da direita e na defesa de Jair Bolsonaro, desde a época da campanha presidencial, e sua passagem controversa pela Secretaria Especial de Cultura do governo federal, indignaram a maior parte de seus colegas da classe artística e da imprensa, além de desagradar parcela relevante do público. Até então 'namoradinha do Brasil', ela se tornou 'noiva de Bolsonaro' e depois, em memes e críticas na TV, virou "aquela que foi sem nunca ter sido", em referência a uma das definições usadas para Viúva Porcina na lendária novela de Dias Gomes.
A veterana Betty Faria acaba de jogar mais gasolina na fogueira onde amarraram Regina Duarte. Em entrevista exibida no programa Conversa com Bial, na Globo, ela disse rejeitar a personagem que interpretou na primeira versão de 'Roque Santeiro', censurada pela ditadura militar antes mesmo da estreia, em 1975. Convidada a reassumir o papel na produção de 1985, a atriz recusou. "Eu achava ela de quinta. Era uma pessoa detestável. Ela hoje estaria naquele grupo que fica na frente do Palácio do Alvorada, de bandeira. Detestava ela. Tinha implicância com ela", explicou.
Nas redes sociais, os clássicos ataques de irritação de Porcina foram relembrados quando Regina Duarte deu, em suas próprias palavras, "um chilique" ao ser contestada em entrevista ao vivo na CNN Brasil, no início de maio. Muita gente desenterrou detalhes da personalidade autoritária e do comportamento abusivo da personagem, como a mania de humilhar aos gritos a empregada Mina (Ilva Niño) e o capataz Rodésio (Tony Tornado). O que era engraçado passou a ser interpretado como odioso. A bem-sucedida carreira artística de Regina Duarte na TV tem sido desconstruída em reação a seu papel na vida política do País. "Certo ou errado?", perguntaria Sinhozinho Malta (Lima Duarte), o amante submisso da escandalosa viúva.