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Por que alguns artistas idosos decidem antecipar a morte

O ator Flavio Migliaccio não foi o único a sucumbir à tristeza e ao inconformismo com situações ao seu redor

5 mai 2020 - 13h00
(atualizado às 13h02)
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Há alguns tabus ainda poucos discutidos na sociedade. Evita-se tocar no assunto como se essa omissão evitasse o problema. Uma questão quase sempre censurada é o suicídio de idosos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), pessoas acima de 60 anos formam o grupo populacional de maior risco para o suicídio.

Walmor Chagas, Ariclê Perez e Flavio Migliaccio: fim da vida adiantado em consequência de profundas dores emocionais
Walmor Chagas, Ariclê Perez e Flavio Migliaccio: fim da vida adiantado em consequência de profundas dores emocionais
Foto: TV Globo / Divulgação

Apesar da alta incidência —  9 mortes de idosos a cada 100 mil habitantes, cerca de 1.200 óbitos por ano no País —  pouco se fala a respeito desse drama quase invisível. Na segunda-feira (4), o assunto ganhou espaço na mídia em consequência da morte de Flavio Migliaccio, aos 85 anos, encontrado morto pelo caseiro de seu sítio. "Segundo a Polícia Militar, a causa da morte foi suicídio", informou o Jornal Nacional. Ele deixou uma carta reveladora e triste.

“Me desculpem, mas não deu mais. A velhice neste País é o caos como tudo aqui. A humanidade não deu certo. Eu tive a impressão que foram 85 anos jogados fora num País como este. E com esse tipo de gente que acabei encontrando. Cuidem das crianças de hoje! Flavio."

Com 62 anos de carreira na televisão, Migliaccio era querido e respeitado pelos colegas de profissão, o público e a imprensa. Nas novelas e séries surgia quase sempre em papéis cômicos, como o Mamede de Órfãos da Terra e seu Chalita de Tapas & Beijos. Nas entrevistas, exalava bom humor. Por isso, a interrupção de sua vida produziu comoção e estranhamento. "Por quê?" foi a frase mais dita a respeito da trágica notícia.

O psiquiatra e reorganizador da mente Isaac Efraim fez em sua página @ansiedadebrasil, no Instagram, uma rápida análise a respeito da provável condição emocional de Flavio Migliaccio. "Claramente, pela carta, ele estava em um estado de depressão. Dependendo da gravidade, você tem na depressão uma total distorção da realidade. Qualquer perspectiva de ter tido prazer na vida, ou vir a ter, desaparece", esclarece o médico. "Mais do que isso, todos os aspectos negativos ficam distorcidos de uma maneira intensa, dando a sensação de que a vida é só desgosto."

A atitude extrema de Migliaccio nos faz lembrar de outro suicídio que abalou o universo artístico e os fãs de teledramaturgia, teatro e cinema. Em 18 de janeiro de 2013, o aclamado Walmor Chagas, então com 82 anos, deu fim à própria vida com um tiro na cabeça. O corpo foi encontrado por um funcionário da pousada que o ator mantinha e onde morava, em Guaratinguetá, interior de São Paulo. Na época, Walmor enfrentava vários problemas de saúde: tinha dificuldade para andar e estava com a visão seriamente comprometida. "Ele não quis ser um peso para ninguém. Escolheu a hora da própria morte", declarou à imprensa um amigo, Antonio Carlos Cardoso.

Outro exemplo de morte antecipada devido a problemas emocionais ocorreu em 26 de março de 2006. No início da noite daquele domingo, o corpo da atriz Ariclê Perez foi encontrado pelo porteiro do prédio onde morava, em Higienópolis, na capital paulista, após queda de 10 andares. Estava com 62 anos. Horas antes, ela deixara na portaria um bilhete com os telefones de parentes para o caso de uma emergência. Famosa por ter participado de trabalhos de sucesso na TV, como Felicidade, Anjo Mau e A Casa das Sete Mulheres, Ariclê era admirada por emprestar intensidade e elegância às personagens. De acordo com o delegado do caso, familiares relataram que a atriz passava por "profunda depressão".

De acordo com a literatura médica, o gatilho para o suicídio de um idoso — famoso ou anônimo — pode ser um transtorno mental, o incômodo de se ver dependente de outras pessoas, o devastador sentimento de solidão, a sensação de uma existência inútil, entre outras possíveis causas. Quem tem pensamentos suicidas deve pedir ajuda a um profissional de saúde mental. Há medicamentos capazes de amenizar o sofrimento. A psicoterapia também é uma indicação. Para uma emergência, o CVV (Centro de Valorização da Vida) possui atendentes treinados para conversar com quem está em desespero ou completo desalento. O telefone gratuito é 188.

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