Série 'Favela Gay' busca naturalizar os LGBTQIs excluídos
Produção do diretor Rodrigo Felha mostra a realidade de quem não vive em lugares privilegiados e progressistas
Se já é difícil ser não-hétero em um bairro de classe média de uma cidade cosmopolita, imagine a complexa realidade de gays, lésbicas, travestis e transexuais que moram em comunidades carentes ou áreas dominadas por conservadores. O retrato desse grupo vulnerável e, ao mesmo tempo, incrivelmente forte pode ser visto a partir de hoje (quarta, 25) na série Favela Gay - Periferias LGBTQI+, no Canal Brasil.
A nova produção do diretor Rodrigo Felha, criado na Cidade de Deus, teve como inspiração o premiado documentário Favela Gay, de 2014, quando o cineasta registrou o cotidiano de homossexuais e transexuais de comunidades do Rio de Janeiro.
A série mostra a rotina de preconceitos e incertezas fora dos grandes centros urbanos. A equipe circulou por Pará, Distrito Federal, Bahia, Rio Grande do Sul, entre outras regiões. Os entrevistados comentam as dificuldades no convívio familiar, o sofrimento de se 'manter no armário' por medo, o envolvimento com drogas e prostituição, a salvação por meio da arte e as transformações produzidas por um grande amor.
Os dez episódios de Favela Gay – Periferias LGBTQI+ estarão disponíveis no Canal Brasil Play sempre após a exibição na TV e poderão ser assistidos também por não assinantes durante o primeiro mês. Rodrigo Felha conversou com o Terra.
A mídia costuma mostrar apenas a realidade dos gays de grandes cidades, onde há mais liberdade de expressão. Qual a importância de revelar a vida dos homossexuais de outros lugares?
Sempre colocam os moradores de favelas e os gays como pessoas diminuídas, sofredoras. Fiz na série o mesmo que no documentário: naturalizei essa gente como a sociedade deve naturalizar. Eu as mostro como elas são. Pessoas que precisam de mais visibilidade para dizer o que pensam, expor seus sentimentos, suas dores e, sobretudo, suas vitórias. A série e o filme buscaram captar a essência dos entrevistados.
Ainda existe resistência de muitas empresas e pessoas em associar sua imagem e marca a conteúdo LGBT. Você teve dificuldade para viabilizar financeiramente a produção?
Tive a sorte de captar recursos e rodar a série ainda em um governo que tratava a cultura como arma da sociedade para absorver conteúdo. Havia portas abertas. Hoje, com esse desgoverno, a cultura não é mais usada para discutir a diversidade de gêneros para que as pessoas em geral possam ser mais compreensivas e amorosas entre si.
Acha que a série pode ajudar gays com dificuldade de se assumir e enfrentar o preconceito, e fazer homofóbicos e conservadores repensarem sua posição?
De fato, pode ajudar muitas pessoas a 'sair do armário'. Na série há vários relatos sobre as dificuldades de revelar a sexualidade no ambiente familiar e enfrentar a sociedade, assim como a sensação de felicidade após passar por esse duro processo. Muitos entrevistados hoje têm voz para replicar o que pensam. Precisamos promover esse debate sempre com afetividade. Agressão verbal contra conservadores e preconceituosos não fará atingirmos o entendimento.
Na sua avaliação, como a TV pode usar o imensurável poder de alcance e influência para ajudar a combater a homofobia e a transfobia?
A ferramenta audiovisual, e especialmente a televisão, pode gerar reflexão e transformação a um grande número de pessoas. Ajuda a naturalizar essa questão (dos LGBTs). Por exemplo, assim como é normalizado o casamento entre homem e mulher, precisamos naturalizar o casamento homoafetivo. A TV tem o poder de trazer à tona essa discussão e quebrar barreiras. Por isso esse desgoverno diminuiu o orçamento para o audiovisual. Ele sabe que é uma ferramenta de longo alcance que pode deixar um legado.
Serviço
Favela Gay – Periferias LGBTQI+, no Canal Brasil
Toda quarta-feira (19h30); reprises às segundas (12h30) e terças (7h30)