Caso do ‘sumido’ no Acre: a mídia adora personagem suspeito
É inexplicável o espaço valioso que se dá na TV a uma história sem importância
Resumo da entrevista do estudante ‘desaparecido’ em Rio Branco ao ‘Fantástico’: nada respondeu, nada revelou.
E assim a principal revista eletrônica do telejornalismo da Globo gastou sete minutos com uma notícia irrelevante, que serviu exclusivamente para promover o livro recém-lançado por Bruno Borges.
Com o papo de que seu sumiço serviu para estimular o “autoconhecimento”, o jovem deu uma volta no repórter Jefson Dourado e não esclareceu coisa alguma. Blindou-se com mais mistério. Mistério raso, aliás.
O delegado do caso questionou o fato de, antes de ficar cinco meses supostamente isolado, o universitário tenha assinado um contrato com uma editora, no qual está detalhada a divisão do lucro da venda dos exemplares.
Seria um mirabolante plano de marketing? Para a polícia, o caso suscita dúvidas, mas não há crime configurado.
Outra pergunta continua sem resposta: qual a relevância desse episódio para o público?
A imprensa é suscetível a uma trama suspeita. Jornalistas não resistem a um personagem que se apresente enigmático – e têm enorme dificuldade em contestá-lo enquanto se detecta boa repercussão.
Bastou Bruno Borges criar um quarto com inscrições indecifráveis e sumir, como se fosse um ocultista saído das páginas de um livro de Dan Brown (‘O Código Da Vinci’, ‘Anjos e Demônios’), para se tornar uma figura midiática.
A imprensa direcionou seu foco ao Acre – Estado tão desprezado no noticiário nacional – para contar um acontecimento desinteressante para a maioria do público. Merecemos histórias melhores.
O telejornalismo precisa repensar o critério de escolha de pautas para deixar de ser às vezes superficial, previsível e repetitivo.
Há inexplicável fascínio pelos factoides quando eles ganham projeção: um veículo de comunicação se deixa contaminar pelo erro do outro e, assim, forma-se um equívoco coletivo.
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