Demissão de correspondente da Globo em Paris é cercada por lições importantes
Elizabeth Carvalho fechou o ciclo com o excelente documentário ‘Democracia - O Enigma Francês’
Dos vários jornalistas da Globo que foram demitidos ou se demitiram nos últimos meses, poucos mereceram uma mensagem pública do diretor-geral de jornalismo do grupo, Ali Kamel.
Elizabeth Carvalho está entre os privilegiados. A correspondente na Europa, baseada em Paris, comunicou a decisão de deixar a GloboNews há dois anos.
A pedido da cúpula, permaneceu no canal para fazer a cobertura da eleição presidencial francesa de 2022. Um de seus últimos trabalhos foi o documentário ‘Democracia - O Enigma Francês’, lançado em abril e disponível na plataforma digital do canal pago.
A jornalista percorreu diferentes cidades da França para entrevistar vários perfis de eleitores a fim de montar um panorama da divisão política entre esquerda e direita, às vésperas da ida às urnas.
Mesmo passada a eleição (o centrista-liberal Emmanuel Macron conseguiu o 2º mandato), a grande reportagem vale a pena ser vista pois é um estudo interessante a respeito de um País onde a política pulsa no sangue dos cidadãos.
Em seu comunicado, Kamel citou o “texto sempre primoroso” de Elizabeth Carvalho. (Ressaltado pela boa dicção da jornalista.) Ele destacou ainda que “reportagens de fôlego sempre foram o seu forte”.
Em outro trecho, o todo-poderoso do jornalismo global citou o método da colega. Serve de lição a jovens repórteres e apresentadores – e também a alguns veteranos que insistem falar mais do que o necessário.
“Fluente em inglês, francês e espanhol, Beth não entrevista pulando de uma pergunta para outra num roteiro pré-estabelecido, mas ouve o que o entrevistado diz para, a partir dali, seguir adiante, deixando de lado o roteiro caso isso se imponha. É a regra básica do bom entrevistador, porque ouvir é mais importante do que simplesmente perguntar, mas nem todos praticam a regra como deve ser. Beth, sim.”
Elizabeth Carvalho nunca quis aparecer mais do que o entrevistado e a notícia. Não foi picada pela mosca da fama que faz tantos jornalistas se comportarem como celebridades diante da câmera.
A saída voluntária da correspondente mostra o seu desprendimento. Não é refém da televisão. Vai tocar outros projetos, cumprir novos desafios. Diferentemente de alguns colegas que ‘não largam o osso’ e ficam acomodados, ultrapassados.
“Em nome da Globo, e em meu nome, agradeço a ela por todos esses anos. Beth não gosta de ouvir isso, mas é um exemplo de profissional. Eu sempre aprendi muito com ela. E vou continuar aprendendo. Obrigado”, escreveu Ali Kamel, em rara demonstração afetiva.
Antes de trabalhar por mais de 20 anos na Globo, Elizabeth Carvalho passou por TV Manchete e Band, revistas e jornais. Um exemplo que deve realmente ser observado por quem se pretende jornalista profissional.