Desconfia-se que Globo recusou novela católica para não desagradar a evangélicos
Projeto de ‘Romaria’ será produzido na Band e suscita debate sobre a abordagem de religiões na teledramaturgia
Mesmo em situação financeira delicada, após apostas não lucrativas, como a do programa do Faustão, a Band vai retomar a caríssima produção de novelas. A última feita pelo canal da família Saad foi ‘Água na Boca’, em 2008.
O diretor Jayme Monjardim emplacou seu projeto ‘Romaria’, trama sobre devoção a Nossa Senhora Aparecida e a importância dos laços familiares. Ele disse que se trata de “uma história que toca o coração”.
A sinopse foi recusada pela direção da Globo quando Monjardim ainda trabalhava lá. Depois, ele também recebeu um ‘não’ do SBT. A rejeição pela TV da Anhanguera é compreensível: a viúva de Silvio Santos, Íris Abravanel, insiste em escrever novelas focadas no público infanto-juvenil. A atual, ‘A Caverna Encantada’, registra média de apenas 4 pontos após quase 4 meses no ar.
O desinteresse da Globo por ‘Romaria’ não foi explicado oficialmente. Nos bastidores, comentou-se sobre o forte teor católico da história. Apesar de sempre ter tido boa relação com a cúpula da Igreja Católica no Rio, a emissora teria optado por não produzir uma novela que pudesse desagradar ao perfil que mais cresce no Brasil: os evangélicos.
Ainda que parte deles seja, teoricamente, proibida de assistir à TV, uma parcela numerosa de membros de igrejas mais progressistas consome teledramaturgia. E não apenas as tramas bíblicas da Record, que nem chegam a dar 10 pontos de média. Assistem às da Globo, mesmo que sigilosamente.
Devido à sangria de telespectadores a cada ano, o canal carioca precisa dos evangélicos para garantir sua liderança folgada no Ibope. Já fez alguns sinais para atraí-los, como a protagonista crente Sol (Sheron Menezzes) de ‘Vai na Fé’. Exibida em 2023 com maioria de negros no elenco, a novela das 7 foi um sucesso, porém, a questão religiosa ficou em segundo plano.
Outra possível explicação para a Globo não abraçar ‘Romaria’ é o trauma da última trama com profundo teor católico produzida na emissora: ‘A Padroeira’, às 18h, entre meados de 2001 e o início do ano seguinte. Os primeiros capítulos tiveram boa audiência, mas logo os índices caíram. Várias mudanças foram agilizadas para recuperar os noveleiros perdidos.
‘A Padroeira’ terminou com média de 25,9 pontos, 5 a menos do que a antecessora, ‘Estrela-Guia’. Um baque para a emissora. A produção seguinte, ‘Coração de Estudante’, atingiu novamente a meta de 30 pontos de média.
O investimento em ‘Romaria’ é uma ótima notícia para o mercado. Centenas de empregos serão criados. Resta saber se conseguirá tirar telespectadores da Globo, SBT e Record. Uma missão nada simples diante de concorrência cada vez mais acirrada. Jayme Monjardim e a Band precisarão de uma forcinha de Nossa Senhora.