Diretor Jefferson Cândido comenta bastidores da série sobre Silvio Santos no +SBT
Produção idealizada em 2023 ganhou ainda mais importância após a morte do icônico apresentador e dono de TV
Está disponível na plataforma de streaming +SBT a série documental ‘Silvio Santos - Vale Mais do que Dinheiro’.
São 8 episódios com participação de dezenas de pessoas relevantes na trajetória artística e na vida pessoal do lendário comunicador.
As 6 filhas (Cinthia, Silvia, Daniela, Patrícia, Rebeca e Renata) e a esposa dele, a dramaturga Iris Abravanel, fazem a narração da obra.
Conta-se desde a origem do clã Abravanel, o início da carreira de Silvio no Rio, sua passagem pela TV Globo, a transformação feita por ele dos domingos da família brasileira, a intimidade longe das câmeras e o impacto de sua morte para os parentes, amigos, funcionários e a televisão.
A coluna conversou com o diretor Jefferson Cândido, líder da equipe que trabalhou incansavelmente na pesquisa, digitalização e edição de vasto material, com imagens raras, nunca vistas pelo público.
Fã de Silvio Santos desde a infância, ele comenta também o legado deixado pelo patrão ao audiovisual do País. “A mensagem que o Seu Silvio sempre passou foi: acredite nos seus sonhos que você consegue realizar.”
Como surgiu a ideia da série documental?
A ideia do documentário surgiu a partir do especial de 60 anos. A gente fez aquele especial de 60 anos que foi ao ar no ano passado, em junho. Começamos a trabalhar bem no início do ano para montar um especial de uma hora, que acabou virando sete horas e meia. Ali, a gente começou a resgatar muitas coisas inéditas do Seu Silvio. Encontramos uma imagem do Programa Silvio Santos do início da década de 60 que ninguém tinha visto. Começamos a juntar esse material e quando acabou a gravação nem esperamos ir ao ar. Naquele mesmo dia, a ideia de fazer um documentário do Seu Silvio começou a tomar forma.
E a ideia de lançá-lo on-line?
Eu fui convidado pela diretoria da emissora e pela Carol Gazal, que, na época, era diretora de conteúdo digital, e já estava com a ideia de fazer o +SBT, na época o SBT Vídeos. A Carol falou: ‘A gente vai fazer uma coleção de documentários e gostaríamos que você fizesse o do Silvio’. A nossa ideia era que fosse em 7 episódios de 1 hora e que cada filha conduzisse um deles. E o último, que é o episódio da família, com a Dona Iris. A produção começou exatamente em dezembro de 2023, quando montamos a equipe, começamos a fazer as pesquisas, escaletar os roteiros e tudo mais. Janeiro foi dedicado ao trabalho de pesquisa e de imagem. Esse trabalho de pesquisa, inclusive, continuou pelo ano inteiro porque a gente sempre encontrava alguma coisa inédita. As gravações começaram mesmo no final de janeiro, em Miami, com a Berta Brasil, que foi uma grande amiga do Silvio, ela e o marido Abrão, que já faleceu. Com o Lombardinho, filho do (locutor) Lombardi, que está morando nos Estados Unidos, com a (apresentadora) Leila Cordeiro, que também está morando nos Estados Unidos, com o Don Francisco, o criador e responsável por trazer o Teleton para a América Latina, e sempre admirou muito o Silvio e o Silvio muito a ele, enfim.
A morte de Silvio Santos deu à série um caráter ainda mais histórico. Como definiram os temas sobre a vida dele?
Os temas foram definidos antes do falecimento do Seu Silvio. A gente gravou o documentário de janeiro a maio, e a data de estreia estava marcada para agosto, exatamente na semana de aniversário do SBT. Acompanhando o lançamento do +SBT, acabamos jogando para a semana de aniversário do Seu Silvio, em dezembro. A gente ia lançar o documentário com um resumo de 55 minutos, que inclusive é o que passou na TV, chamando para o lançamento do documentário completo. Acabou que o Seu Silvio faleceu no dia 17 de agosto e, no dia seguinte, fizemos uma maratona de edição. Ficamos 36 horas na ilha editando para colocar 4 horas do documentário na TV no lugar do Programa Silvio Santos do dia 18. Foi um trabalho bem bonito, a gente queria homenagear o Seu Silvio de uma forma especial.
Como foi selecionar o material para aquela homenagem?
O documentário, por mais que estivesse gravado, não estava totalmente finalizado; faltavam algumas coisas importantes e a gente fez essas 4 horas praticamente do zero. Inicialmente, não iria seguir uma ordem cronológica. Após o falecimento do Seu Silvio, revisamos o documentário inteiro. O primeiro episódio conta a história da Família Abravanel, a vinda da família (para o Brasil) até o primeiro casamento dele. O segundo episódio trata da história dele na rádio, até ir para a TV. Depois, vem o episódio com ele totalmente na televisão. Na sequência, tem o episódio dedicado a algumas pessoas que são gratas ao Silvio, que ninguém menciona. Depois, o episódio que conta a história do Grupo Silvio Santos, com todas as empresas que o Seu Silvio teve, desde a primeira — que foi um bar que ele teve lá na Santa Cecília, do lado da TV Paulista (que se tornaria a Globo em São Paulo) — até o grupo atual. E o sétimo, focado na família, que eu acho um dos episódios mais lindos e ricos, com 80% ou 90% de imagens inéditas, digitalizadas, da família.
Produziram algo a mais após a morte dele?
O documentário foi prospectado para homenageá-lo em vida, e como ele veio a falecer no dia 17 de agosto, precisava de um desfecho. Então, nós concluímos os sete episódios e gravamos o oitavo com algumas pessoas, como a (jornalista) Simone Queiroz, que foi quem notificou o falecimento do Silvio pelo SBT; Sandra Annenberg, que fez o especial do Globo Repórter, e a gente acabou pedindo para ela contar sobre as homenagens que a Globo fez; Patrícia Abravanel, com algumas outras perguntas, explicando tudo sobre o período pós-pandemia; o médico geriatra que cuidou do Seu Silvio. Até aproveitamos uma ou outra pessoa que estava fora do Brasil na época das primeiras gravações, como a Gretchen. É uma pessoa que o Silvio marcou a vida. Todo mundo vinculava a Gretchen com o SBT nos anos 80, já que ela participou muito do Qual é a Música. É uma personalidade que tinha que estar, não poderia faltar.
Como foi gravar mais de 100 depoimentos? Houve momentos de forte emoção na gravação com a mulher e as filhas dele?
Foi muito emocionante. No total, foram 108 pessoas entrevistadas e todas estão no documentário. O Seu Silvio ajudou e cuidou de muita gente, e muitas pessoas não sabem como era esse lado humano do Seu Silvio. Como ele cuidou do filho do Celso Teixeira e da esposa, depois de seu falecimento. O Celso foi sócio dele na barca em Niterói e, quando o Silvio veio para São Paulo, ele também era locutor e trouxe o amigo para cá. Então, a gente tem uns casos de pessoas ajudadas pelo Seu Silvio, mas nunca ninguém falou. Tem histórias bastante emocionantes de artistas que ele praticamente fez. A da Berta, para mim, é sensacional! Muita gente conhece a Berta Brasil, da Berta Brasil Boutique, mas ninguém sabe exatamente a história. Ela e o marido foram grandes amigos do Seu Silvio. Tem histórias incríveis e emocionantes.
Apesar da popularidade, Silvio Santos mantinha uma aura de mistério sobre si mesmo. A série conta mais do homem atrás do ídolo?
A série revela um Silvio Santos totalmente humano. A gente já sabe um pouco quão humano ele era, mas ele era muito mais. Tem algumas coisas que sempre foram incríveis e talvez nunca tinham sido mostradas ou reveladas. Essa parte humana e amiga de quem foi o Sílvio Santos, o Senor Abravanel.
Cite uma descoberta sobre ele, durante as gravações, que o surpreendeu.
Não foi exatamente uma descoberta porque a gente já sabia, mas o quanto ‘família’ ele era. Essa parte não era muito mostrada, principalmente nos anos 80 e 90, com as crianças, o quanto ele se dedicava à família, a estar perto, em todos os momentos que ele tinha uma brecha de folga. O fato de sempre viajar com as filhas, todo mundo, eu acho isso surpreendente. Ele e a Dona Iris viajavam em 6 filhas, depois 4, porque a Cinthia e a Silvia eram um pouco mais velhas. As 4 meninas, crianças, e eles, por exemplo, não tinham babá, não tinham essa frescura. Ele e a dona Íris que cuidavam das crianças nas viagens e eu acho isso muito legal. Tem histórias muito legais, por exemplo, como o Teleton veio para o Brasil. Isso está muito bem contado no documentário. O fato de ele ter um bar antes dele ser apresentador de TV, um boteco mesmo, pequenininho, onde ele recebia os artistas da rádio. A Hebe já frequentava nessa época! E alguns marcos que são sensacionais. No dia que estava sendo transmitida a chegada do homem à Lua, o Silvio praticamente empatou no Ibope. Ou, por exemplo, o Programa Silvio Santos ter 100% de audiência em um dia. Todas as TVs que estavam ligadas estavam no Programa Silvio Santos, e zero para as outras. Isso é surpreendente, se você parar para pensar. Então, tem histórias muito marcantes, tem muita curiosidade.
Existe a possibilidade de a série ter outra temporada?
Não foi pensado para ter uma continuidade porque a gente amarrou tudo nesses 8 episódios. Agora, existe material para fazer. São 70 anos de história na televisão. Então, é claro que existe material para fazer muitos outros especiais ou documentários. Material que a gente não usou ou que a gente usou pouquíssimo. Mas a ideia é que esse fosse um documentário definitivo, que contasse tudo, sem deixar passar nada. A gente quis realmente fazer um documentário completo, com tudo.
Você teve de deixar muito material de fora para não exceder o tempo de duração dos episódios?
Quanto ao material, isso é a coisa mais incrível: a quantidade de coisas que a gente juntou e que talvez ninguém nunca tenha visto. Encontramos programas de rádio, nos rolos, que talvez nunca ninguém tenha mexido desde a década de 60 ou 70. As músicas do Programa Silvio Santos, do auditório. A gente achou uma das caravanas e colocamos um trechinho. Todas as marchinhas do Seu Silvio, que já são famosas e que ele colocou voz depois, de novo, nos anos 80. Encontramos rolos dessas músicas, a primeira versão, de rádio, que ele talvez cantasse ali ao vivo, nos anos 60, com a voz dele mega jovem. A digitalização do material da família, que a gente chama no sétimo episódio de O Baú da Família, que é justamente isso: a gente abriu o baú, a família liberou esse material e é um material riquíssimo. É raro você ter visto, por exemplo, uma imagem do Seu Silvio num aniversário de família, ou numa festa, ou no Bar Mitzvah (cerimônia que insere o jovem de origem judaica na vida adulta) das filhas, ou em viagens mesmo. Tem ele em todos os lugares que viajou pelo mundo. Então, isso é muito legal. É um material que nunca foi mostrado. Tem muito material que daria para fazer outros episódios ou outras temporadas, mas acredito que os tópicos, os assuntos, foram muito bem abordados ali e estão bem completos.
Você foi uma criança que assistia aos programas de Silvio Santos aos domingos? Ele teve influência em sua escolha por trabalhar no audiovisual?
Sim, assistia muito. Inclusive, na pandemia, eu digitalizei muita coisa da minha família e é nítido como Silvio sempre foi presente na minha vida. Eu achei uma fita, eu com 1 ano e meio, na sala, brincando com a minha mãe e minha irmã, e de fundo aquela voz maravilhosa do Silvio Santos apresentando o programa. Então, ele é sempre muito presente. Quem, na vida, que brasileiro, nunca teve o Silvio Santos presente? Se foi da década de 70, 80 ou 90, que foi o ápice, acredito, da carreira do Silvio. Então, ele realmente foi muito presente. Depois, eu lembro muito, nos anos 90, do Topa Tudo por Dinheiro. Minha irmã ainda era noiva, ia com o namorado, juntava a família para assistir o programa até o final, até acabar as câmeras escondidas, o último quadro. E aí, anos depois, eu também fui dirigir. Estou há 15 anos fazendo esse conteúdo do Programa Silvio Santos. Faço parte da equipe desde 2009, dirigindo alguns quadros, agora dirigindo o programa junto ao diretor Fabiano Wicher. Então, o Silvio sempre foi muito presente e acredito que isso tenha influenciado muito na minha escolha para trabalhar na televisão.
Como era sua relação de funcionário com o patrão Silvio Santos?
A minha relação, na verdade, sempre foi de muito respeito e carinho. Eu sempre fui uma pessoa muito exigente com meu trabalho e o Seu Silvio também era uma pessoa muito exigente com o que ele precisava ou com o que ele queria. Então, nunca tive problema, graças a Deus. Guardo com muito carinho tudo o que vivi ali. Eu já tinha trabalhado com ele na presidência lá atrás, com a Therezinha (Di Giacomo), mas no Programa Silvio Santos estou há 15 anos. Entrei dirigindo conteúdos, quadros, como as câmeras escondidas, Os Velhinhos, e depois acabei virando diretor do programa junto ao diretor Fabiano Wicher, e ele sempre foi muito incrível comigo. Não esqueço nunca um telefonema, por exemplo, quando foi ao ar o Especial de 60 anos. A gente quis fazer uma surpresa, e aí ele ligou na segunda-feira super elogiando, elogiando meu trabalho, dizendo que eu estava no caminho certo. Então, acho que isso foi sempre muito incrível. Eu sempre tive uma relação ótima, graças a Deus, e ele sempre gostou muito do meu trabalho.
Qual o maior legado deixado por Silvio Santos à televisão?
Veja, em 2025 ele completaria 70 anos de carreira na televisão. A televisão tem 75 anos no Brasil, e ele faz parte de 70 anos dessa história. Então, praticamente, a história da televisão brasileira se funde muito à história dele, não é? Acredito que a própria história dele é o maior legado que ele tenha deixado para o Brasil. De onde ele veio, o que ele conseguiu, quanto ele batalhou para conseguir realizar os sonhos dele. Ser dono de uma emissora de TV, ter passado por todos os preconceitos que ele enfrentou no início, por ser uma pessoa extremamente popular. Ele demorou anos para conseguir uma concessão. Só lá em 76 ele estreou a TVS, justamente por ele ser considerado um apresentador extremamente popular. E não é só isso: ele sempre honrou muito o seu público. O telespectador dele sempre foi colocado em primeiro lugar. Para ele, sempre foi muito claro esse respeito com o público, e do público com ele. Acredito que o grande legado, realmente, é a história dele. Mas, enfim, ele tem muitos outros predicados. Se eu fosse citar aqui, talvez o respeito pelas pessoas seja o mais importante. A mensagem que ele passa é: acredite nos seus sonhos que você consegue realizar. Você vai atrás, batalha por isso, e consegue realizar. Ele sempre foi uma pessoa que ajudou e realizou sonhos de muitas pessoas depois que conseguiu conquistar o dele. É a mensagem, talvez, mais importante: entender que você pode realizar seus sonhos, seus desejos. Mas a história dele já é um grande legado, um grande legado para o Brasil.