Entrevista de Huck com Zelensky ressalta erro grave do jornalismo da Globo
Canal cobre a guerra entre Ucrânia e Rússia sem a mesma dimensão apresentada em conflitos anteriores
O que Luciano Huck foi fazer na Ucrânia? Causou certo estranhamento ver um apresentador de programa de entretenimento em uma zona de guerra para entrevistar o presidente Volodymyr Zelensky.
Basta se atentar aos detalhes da situação para compreender a coragem do artista em se colocar sob risco: ele é descendente de ucranianos e judeu, assim como o político com quem se encontrou.
Nota-se admirável senso de pertencimento e a busca por honrar as origens. Pela genealogia, Huck está ligado a esta guerra. Há, também, o interesse profissional: uma conversa com um dos homens mais respeitados do planeta – alvo da potência nuclear russa – deve render boa repercussão ao Globoplay.
O esforço do comunicador e sua equipe, que tiveram de se abrigar de ataques a Kiev, contrasta com o comodismo do jornalismo da Globo. Até hoje, nenhum âncora ou repórter da emissora foi até a capital ucraniana para entrevistar Zelensky, um dos personagens mais importantes da história contemporânea.
Houve uma conversa cara a cara feita por um freelancer do canal, o documentarista Gabriel Chaim, e uma gravação por videochamada conduzida por Raquel Krähenbühl, de Washington.
Em outros tempos, o jornalismo da Globo era mais presencial nos conflitos no exterior. Lembro-me de Ana Paula Padrão no Afeganistão dominado pelo Talibã, onde enfrentou risco extra por ser mulher; Pedro Bial na Guerra da Bósnia e Marcos Uchôa no meio da artilharia no Iraque.
A emissora também se destacou ao relatar a Guerra Irã-Iraque com diferentes equipes em campo – entre os profissionais estavam os repórteres Hermano Henning e Ernesto Paglia – e até conseguiu uma entrevista exclusiva com o então ditador Saddam Hussein.
Após dispensar a maioria dos veteranos e manter correspondentes no exterior que passam mais tempo no estúdio diante do teleprompter do que viajando para mostrar os fatos onde acontecem, a Globo perdeu vigor em grandes coberturas de guerra.
Sim, é caro e perigoso enviar repórteres à frente de batalha, porém, faz parte do ônus a um canal de TV que sempre priorizou o jornalismo. Por isso, a façanha de Luciano Huck na Ucrânia ressalta a cobertura distante e, às vezes, burocrática que a emissora líder em audiência apresenta a seus telespectadores sobre um dos maiores confrontos bélicos deste século.