Falta às novelas atuais um amor como o de Sassá e Clotilde
Romantismo visto em ‘O Salvador da Pátria’, de 1989, reprisada no Viva, mostra por que tramas emocionavam tanto o público
“Não vai embora”, escreve Sassá Mutema, com erros de ortografia, na lousa da escola de alfabetização de adultos. O boia-fria tenta persuadir Clotilde a desistir de deixar às pressas a cidade de Tangará.
É o apelo de um homem apaixonado que fez um desajeitado pedido de casamento. Constrangida, a professora quer partir para não dar esperança ao matuto e, ao mesmo tempo, fugir do sentimento recíproco abafado.
A principal história de amor de ‘O Salvador da Pátria’ capturou o público em 1989 e, agora, repete o encantamento em quem acompanha a reprise no canal Viva. Como não torcer por casal tão improvável e, surpreendentemente, tão crível? A magia da teledramaturgia se faz presente.
Mérito do autor Lauro César Muniz e da interpretação tocante de Lima Duarte e Maitê Proença. Apesar do permanente choque de realidade no qual vivemos hoje, a gente embarca sem esforço na antiga saga romântica que corre em paralelo ao forte contexto político do folhetim.
Impossível não ter empatia pelo fantasioso Sassá e seu amor inicialmente não correspondido. Quem nunca? Não há como deixar de se colocar no lugar de Clotilde em seu dilema por uma paixão considerada inapropriada e até proibida.
Entre os dois há abismos quase intransponíveis, a começar pela diferença cultural e a visão de mundo. Apesar de próximos, são de realidades distintas. Um casal vulnerável a vários tipos de julgamentos e preconceitos.
Por isso mesmo, o telespectador se dispõe a defendê-los à espera de um final feliz. O viés do amor impossível que cresce diante das adversidades sempre impulsionou o gênero mais popular de ficção na TV.
O avanço do tempo e a modernidade fizeram muitos novelistas priorizar tramas sobre disputa de dinheiro e vingança. O romantismo passou a ser visto como cafona e pouco atrativo. Engano deles. Uma história de amor verossímil e envolvente nunca perde a força.
As novelas atuais carecem de paixões arrebatadoras. Tudo é tão ágil e superficial para prender a atenção do público que não se desenvolvem os sentimentos profundos dos personagens. Ainda bem que temos as reprises com amores que servem de adoçante à vida real.
Em tempo: a química entre Lima Duarte e Maitê Proença foi tão forte nas gravações que o ator se apaixonou de verdade, e sofreu por não ter sido correspondido. Na época, ele tinha 59 anos; ela, 31.