Famosos arreganham a intimidade, não seguram a onda e culpam os outros
Fenômeno contemporâneo provocado pela superexposição voluntária banaliza a imagem das pessoas
“Há muitas coisas em seu coração que você nunca deve contar a ninguém. Seria baratear o seu íntimo sair espalhando-as por aí”, disse Greta Garbo, uma das maiores atrizes e divas de Hollywood.
Incomodada com o assédio da imprensa e a exploração desrespeitosa de sua intimidade, ela se aposentou aos 36 anos. Passou os outros 48 anos de vida longe dos holofotes e evitando os paparazzi.
Ainda que seja um caso radical, serve de exemplo a artistas populares e subcelebridades adeptos da superexposição, quando há um convite explícito à invasão da privacidade.
A nova polêmica relacionada ao tema envolve o casal de ex-participantes do ‘Big Brother Brasil’ Eliezer e Viih Tube. Ele reclama das críticas por cogitar não dar seu sobrenome à filha.
“Vi que vocês questionaram bastante sobre não colocar meu sobrenome na Lua, mas fiquem em paz, essa foi uma decisão que partiu de mim. A Viih até insistiu para que eu colocasse, mas o nome dela será Lua Di Felice, que significa lua de felicidade”, explicou.
“O meu sobrenome no meio ia ‘cortar’ e no final o ‘de felicidade ou de felice’ ia virar coadjuvante”, completou.
Obviamente, não é o sobrenome que determina o sentimento e a responsabilidade de um pai por um filho. Eliezer e Viih Tube têm o direito de registrar a menina como quiserem.
A controvérsia começa ao divulgar a decisão e, depois, não suportar as previsíveis contestações, e ainda culpar o público por se sentirem mal com a repercussão negativa. Abalado, o ex-‘BBB’ voltou às redes sociais.
“E as pessoas fizeram de um momento tão importante da gente, tão lindo da nossa filha, um circo de horrores. A Vitória passou mal, é muito cansativo. É muito desgastante. Tudo é tirado de contexto...”
Queriam o quê? Aplausos? Esperavam compreensão universal? Bem-vindos ao mundo dos adultos, onde somos contrariados a todo instante.
Midiáticos, os dois têm experiência na interação on-line. Conhecem a dinâmica cruel do tribunal da internet ao questionar, ‘cancelar’, julgar e condenar, das situações banais às mais relevantes.
O erro inicial foi deles. Por que compartilhar essa informação que diz respeito apenas à família? Para que estimular a maledicência da arena de anônimos que faz da web um ambiente insuportavelmente tóxico? Não conseguem controlar o impulso de correr para a frente de uma câmera a fim de contar a respeito de tudo?
Parte significativa de quem ganhou fama da noite para o dia comete esse erro primário: falar demais, mostrar em excesso, buscar – ingenuamente – a aprovação unânime de seus seguidores, além de desconsiderar a opinião contrária e o ataque dos numerosos desafetos.
Uma vida pública exige discernimento. Saber o que exibir para a autopromoção e aquilo que deve ser mantido na esfera privada. Tal protocolo preserva e valoriza a imagem da personalidade e, mais importante ainda, resguarda a saúde mental.
Observe a maioria dos grandes artistas (importante separá-los dos dependentes de fama). Eles se recusam a revelar intimidades a repórteres e curiosos em geral. Não forjam notícias ou factoides para aparecer a todo momento. Dão foco à carreira, ao legado construído com esforço. Assim, neutralizam o veneno virtual.
Sabe-se que essa geração de influenciadores faz da quebra da privacidade o seu ganha-pão. Quanto mais exibem e ostentam, maior a movimentação em suas páginas e o interesse de anunciantes. Mas até eles precisam agir com alguma coerência e assumir o efeito colateral de um comportamento um tanto autofágico.
Três décadas depois de sua morte, Greta Gabo continua a ser um mito. Fez do mistério um atrativo irresistível. Se vivesse hoje em dia, ela estaria horrorizada com a administração vulgar da privacidade. Talvez repetisse uma de suas declarações mais famosas. “Me deixem em paz.”