Jornalista faz sucesso ao trocar TV pelo mercado financeiro
Marcos Clementino comenta a gestão do patrimônio de clientes, as falhas no jornalismo e a importância de simplificar notícias econômicas
Nascido e criado na periferia da zona sul de São Paulo, Marcos Clementino chegou ao ápice da profissão de jornalista ao se tornar correspondente internacional. Morou em Paris, onde fez sozinho a cobertura dos atentados terroristas de 2015 para a RedeTV!. Trabalhou também na TV Cultura de São Paulo.
Decepcionado com a estagnação do telejornalismo e em busca de novos desafios, teve a coragem de sair da televisão para empreender como consultor financeiro e de negócios. Assumiu as rédeas para conseguir autonomia total da própria vida. Um caminho sonhado por inúmeros jornalistas atingidos pela longa crise no mercado de comunicação.
Nesta entrevista, Marcos Clementino fala da realidade longe das câmeras, do modismo (e risco) de trades e bitcoins, do perigo vivido na Paris sob ataque e da linguagem inovadora do jornalismo econômico.
Como avalia a decisão de sair da TV? Arrependeu-se em algum momento?
Deixei o jornalismo há 4 anos. Olhando de fora, após tanto tempo, avalio que fiz a coisa certa. Sinto falta de dar voz às pessoas ‘invisíveis’ da nossa sociedade porque elas carecem de ajuda para driblar as barreiras da injustiça. Sinto, também, saudade de contar histórias e estar em locais onde apenas intrépidos repórteres frequentam. Agora, arrependimento, não. Não tive sequer um segundo de arrependimento ao longo desse tempo. Foi uma decisão muito bem pensada. Aproveitei ao máximo a profissão ao longo da minha carreira. Fui intenso, me doei, isso traz tranquilidade. Não deixei de fazer nada do que gostaria.
Como foi o início na nova carreira?
Apesar de ter feito uma transição bem planejada, toda mudança envolve riscos. Sempre fui um cara muito otimista com os projetos que resolvo encarar, mas de fato o sucesso na nova carreira veio mais rápido – e numa escala maior – do que eu imaginava. Olhando pelo cenário político e econômico do País nos últimos anos, com impeachment da Dilma, crise no governo Temer e, mais recentemente, essa loucura que o mundo vive com a pandemia de covid-19 na era Bolsonaro, posso dizer que ganhei na loteria já que o meu segmento teve crescimento durante toda essa tribulação. Tirei o pé do acelerador, adaptei as minhas reuniões 100% para o online e com isso ganhei mais tempo com a família. E nem assim tive a carreira ameaçada. Pelo contrário, aumentou a quantidade de propostas de trabalho e parcerias comerciais. Não dá nem pra acreditar levando em conta a taxa recorde de desemprego no País, de 14,7%. Tenho muita gratidão a Deus!
Em fevereiro de 2018, você afirmou que as empresas de comunicação estavam “em frangalhos”. De lá para a cá, a situação da maioria delas piorou. Vê luz no fim do túnel para o mercado de jornalistas?
Naquela época fui muito criticado por ex-colegas. Hoje eles dizem que saí na hora certa e que se pudessem fariam o mesmo. Não consigo achar outro adjetivo para a situação atual dos veículos de comunicação, já que estavam em frangalhos naquela época e hoje estão ainda piores. A luz no fim do túnel apareceu há algum tempo com a chegada das redes sociais, mas as estruturas ultrapassadas ainda não reconhecem tal fato. Os profissionais saudosistas demonizam as redes, querem tirar a credibilidade e a força adquirida desse novo tempo, mirando apenas nas questões negativas, tais como as fake news e a facilidade de qualquer pessoa postar algo com o viés de desinformar. Falta reconhecer o poder de influenciadores digitais que conseguem colocar mais de 30 mil pessoas em uma live às 5 da manhã, como é o caso de Joel Jota e Thiago Nigro. Emissoras antigas, com equipamentos caríssimos e uma folha de pagamento pesada, muitas vezes não conseguem essa audiência nem em horário nobre. Afinal, quem está errado? Entende como tem gente que não quer enxergar o óbvio? Não quer seguir a tendência e se apega em algo que já morreu. A maioria dos jornalistas está à espera de um milagre porque não consegue se reinventar, infelizmente. Uma pena!
Você trocou o jornalismo pelo mercado financeiro, área que parece protegida contra qualquer crise. Qual é exatamente sua atuação?
A minha área é basicamente gestão de risco e planejamento financeiro. Ou seja, através de um estudo, eu ajudo o cliente a prevenir riscos de modo a blindar o patrimônio e a renda contra imprevistos. Isso garante não só a própria renda da pessoa como o padrão de vida de quem depende diretamente dela, a exemplo de familiares e empregados, no caso de empresários. Ao mesmo tempo, ajudo a construir um patrimônio vitalício para a terceira idade. O trabalho envolve também programação de transferência de patrimônio para herdeiros e redução de impostos.
Já ficou rico?
Rico? (risos). Depende da ótica. Comparado com aquele menino de 11 anos que vendia picolé nas ruas do Campo Limpo, a resposta é sim. Por outro lado, me considero muito pobre comparado ao patamar das pessoas com quem convivo hoje em dia e de objetivos pessoais. Eu diria que tenho um padrão de vida mais confortável que antes, mas não me considero rico. Riqueza financeira pra mim é quem anda de jato, tem helicóptero próprio, só viaja de primeira classe, possui iate e no final de semana está na fazenda. Ainda não desfruto disso. Sou rico de amigos e conhecimento. Tenho riqueza espiritual, saúde em dia. E a minha maior fortuna é a minha família. Nesse aspecto, sou trilhardário, sem dúvida alguma.
Bancos digitais, que crescem exponencialmente, têm contratado mulheres famosas (Taís Araújo, Tatá Werneck, Anitta, Gisele Bündchen, entre outras) para popularizar a comunicação. O que acha da estratégia?
A visão corporativa que falta para os veículos de comunicação sobra ao mercado financeiro. Negócio não pode ter orgulho, não deve ter preconceito. É isso que os bancos digitais têm feito, acertadamente. A estratégia nada mais é do que ter o bom senso de entender o atual cenário, o novo normal, além de flertar com um público que consome e se comporta diferente daquele da década passada.
Ser trade está na moda. Até artistas têm atuado como investidores. Qual sua opinião?
Tudo aquilo que traz status e uma promessa de riqueza rápida entra na moda. Leigo vira ‘especialista’ do dia pra noite, quem tem o marketing indecente a seu favor faz outras pessoas acreditarem em tudo. E por isso muita gente entra em cilada, cai em golpe de bitcoin, pirâmide financeira e coisas do tipo. O trader, como em qualquer outra profissão, precisa estudar muito, buscar patentes em qualificação e ter um certo tempo de amostragem do seu trabalho. Não acredite no enriquecimento do dia pra noite ou em oportunistas que nunca conquistaram nada, fingem ter conquistado e ainda iludem dizendo que vai ajudá-lo a conquistar. Atalho para riqueza é só loteria ou herança. Todo o restante exige trabalho duro combinado com inteligência. Ao mesmo tempo, a pessoa deve ter otimismo e paciência para chegar lá. Conheço muitos artistas com bastante conhecimento em investimento. Mas conheço também muitos que são marketing puro, não entendem bulhufas.
Os atentados terroristas de Paris vão completar 6 anos. Você estava lá como correspondente e escreveu um livro sobre o que viu e viveu (‘Paris, Sexta-feira 13 – Os Ataques Terroristas em Novembro de 2015’, em parceria com Liz Fere, Editora Realejo). Como avalia, hoje, o trabalho solitário que fez para cobrir os fatos?
Loucura demais! Mas faria tudo de novo. Continuo indignado com aquela falta de estrutura, apoio e compaixão deles (RedeTV) comigo. Por outro lado, tenho a certeza que só tive sucesso na reportagem daquela sexta-feira 13 porque eu estava sozinho. Hoje, analisando de forma mais sóbria, posso afirmar que se outra pessoa estivesse comigo não correria o mesmo risco que eu ou talvez eu não quisesse colocá-la em perigo. Quando lembro de tudo, parece que vivi um filme de ação daqueles bem hollywoodianos, sabe? Tenho muito orgulho da minha entrega, mas sei que em alguns momentos ali fui irresponsável com a minha própria vida. Dias atrás, contei para o meu filho Thomas, hoje com 8 anos, sobre o que é um atentado terrorista e expliquei o trabalho do papai naquela tragédia de Paris.
Consome muitas horas de telejornalismo ou se informa por outros meios?
Depois que deixei o jornalismo, não assisto mais a jornal na TV. É muito raro, somente quando estou como visita na casa de alguém e não posso mudar de canal. Leio muita notícia por portais na internet, a partir do celular e outras vezes pelo computador. Quando estou em trânsito ouço notícias pelo rádio, gosto bastante. É dinâmico!
Como avalia o jornalismo econômico na TV?
Como não tenho assistido à televisão, acompanho os jornalistas econômicos por meio de podcasts e também pelo Youtube. Não é a editoria que eu costumo criticar. Gosto bastante, evoluiu de um tempo pra cá. O que mudaria é a linguagem, deixaria o mais simples possível para um entendimento não só do investidor ‘triplo A’ como para a dona de casa. Aquela leveza que o Tiago Leifert trouxe para o jornalismo esportivo precisa acontecer no jornalismo econômico, desburocratizar. Porque só assim cai nas graças da audiência e ajuda na educação financeira das famílias brasileiras. Um de que gosto bastante é o jornalista inglês Richard Quest, da CNN Internacional. Aqui no Brasil quem tem feito sucesso com linguagem criativa são os influenciadores Murilo Duarte, do ‘Favelado Investidor’, Nathalia Arcuri, do ‘Me Poupe’, e aquela figura do Pablo Spyer, do jargão ‘Vai tourinho’. Os jornalistas econômicos precisam ser menos formais, menos carrancudos para se comunicarem como essa geração que descomplicou a fala tradicional.
Aceitaria voltar ao jornalismo?
No momento, não. No futuro, quem sabe? Hoje estou muito feliz com a minha atividade profissional, com os meus colegas de trabalho e, sobretudo, com a empresa. Recebi o convite de uma emissora para desenvolver função híbrida de chefia e também aparecer no vídeo. Confesso que fiquei tentado pela admiração e amizade que tenho com o profissional que me fez o convite. Ele tem uma linha de pensamento sobre o jornalismo televisivo que vai ao encontro da minha. Mas não daria para conciliar com o atual trabalho e eu não abriria mão do que tenho hoje para voltar à TV. As condições de um eventual retorno estão basicamente ligadas ao ambiente de trabalho agradável, dignidade e valorização profissional não apenas comigo, mas também com aquele que venha a trabalhar comigo. Que a liberdade e a imparcialidade não sejam reféns de interferências políticas ou comerciais. Que o jornalismo seja só jornalismo, e ponto! Para matar a saudade de produzir vídeos e entrevistar personagens, criei uma iniciativa chamada ‘Zero -> Alguém’, com o intuito de inspirar pessoas que querem se tornar destaque na sociedade em sua profissão. Faço live duas vezes por semana no meu perfil no Instagram (@marcosclementino1) com pessoas com histórias de sucesso e dicas a quem quer chegar lá. Até o final do ano vou criar um canal no YouTube com conteúdo para disseminar boas práticas.