Jovem desesperada por fama e sua mãe alienada se destacam em dramalhão da Globo
Ramille e Cris Vianna, de ‘Família é Tudo’, interpretam perfis comuns em uma sociedade que valoriza em excesso as subcelebridades
A canastrice está no DNA de Andrômeda, moça desafinada aspirante a pop star na nova novela das 19h da Globo, ‘Família é Tudo’, de Daniel Ortiz. Desde o primeiro capítulo, a atriz e cantora Ramille encontrou o tom certo da personagem.
A jovem é tão deslumbrada e inconsequente que invade o palco do ‘Domingão com Huck’ para tentar um momento de estrelato. É retirada por seguranças, sob vaias da plateia e críticas do apresentador.
Acompanhada de dois bailarinos, os Asteroides (toda subcelebridade possui bajuladores a tiracolo), Andrômeda sustenta convicção de seu talento musical. Autoengano conduzido com a leveza da comédia.
Bem-construída, a personagem retrata um tipo comum no universo artístico: aquele que acredita ter nascido predestinado ao sucesso mesmo sem apresentar dom nem vocação. A arte, definitivamente, não é para todos.
Este sujeito refém da vaidade – e, muitas vezes, de indisfarçável complexo de inferioridade – busca a fama para se sentir melhor que os demais e, assim, solucionar profundas questões emocionais.
Deseja a aprovação popular e a sensação de pertencimento a um grupo especial. Geralmente nunca atinge o objetivo e culpa os outros por sua inabilidade e o fracasso. Ou, quando chega ao topo, torna-se insuportável.
A insanidade de Andrômeda é alimentada por sua mãe, Lulu, uma ex-Miss Brasil que busca sair do ostracismo por meio da filha. Outra representação clássica: a mãe que joga gigantesca expectativa de minimizar as próprias frustrações sobre um descendente.
Cris Vianna se destaca nas poucas cenas. Uma atriz competente e carismática que faz do papel coadjuvante um momento especial. Merece mais espaço para desenvolver a própria trama ao invés de apenas orbitar em torno de Andrômeda.
Aliás, o nome da aspirante a cantora se refere à galáxia que está a anos-luz de distância da Terra, assim como a personagem de Ramille se mantém desconectada da realidade. Viver num mundo à parte, mergulhado em ilusão, é uma fuga recorrente a muitos indivíduos.
Para o filósofo prussiano Friedrich Nietzsche, esse comportamento faz parte da sobrevivência em um mundo opressor. “A mentira mais comum é aquela com a qual uma pessoa engana a si mesma”, escreveu. Resta descobrir até quando Andrômeda e Lulu vão acreditar na própria impostura.