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Marina foi muito mais do que a 'véia louca' da Escolinha

Atriz morta aos 90 simboliza o artista coadjuvante no Brasil: termina pobre, esquecido e com legado ignorado pelas novas gerações

22 set 2021 - 09h30
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Marina Miranda estava morrendo havia algum tempo. Traiçoeiro, o Alzheimer vai matando aos poucos. Mata a memória, a noção de quem se é, a relação com os familiares, mata a alegria de viver, a convivência com os amigos, o futuro e o passado.

Marina Miranda como Dona Charanga, personagem da ‘Escolinha do Professor Raimundo’
Marina Miranda como Dona Charanga, personagem da ‘Escolinha do Professor Raimundo’
Foto: Acervo/TV Globo

A atriz é apenas uma vaga lembrança para muitos telespectadores. A maioria vai identificá-la como “aquela véia doida da Escolinha do Professor Raimundo”. Sim, a destrambelhada Dona Charanga foi sua personagem mais popular nas últimas décadas.

Mas a artista não se resumia a aquela atuação de poucos minutos na interação com Chico Anysio. Marina foi precursora como mulher, negra e humorista na televisão. Em 1961, quando estreou no programa de esquetes cômicas ‘Noites Cariocas’, havia poucos com seu perfil no veículo de comunicação inaugurado havia uma década.

Destacou-se nos lendários ‘Faça Humor Não Faça Guerra’ e ‘Balança Mas Não Cai’. Formou dupla impagável com Tião Macalé (1926-1993) em várias produções, inclusive temporadas de ‘Os Trapalhões’.

A atriz ganhou pequenos papéis em novelas que se tornaram clássicas como ‘Dona Xepa’, ‘Dancin’ Days’, ‘A Gata Comeu’ e ‘Bebê a Bordo’.  Fez ainda a aclamada minissérie ‘Tenda dos Milagres’, o polêmico folhetim ‘O Dono do Mundo’ e algumas tramas na Record.

Marina Miranda ao lado de Agildo Ribeiro no ‘TV 0 – TV 1’, o primeiro humorístico da Globo, na década de 1960
Marina Miranda ao lado de Agildo Ribeiro no ‘TV 0 – TV 1’, o primeiro humorístico da Globo, na década de 1960
Foto: Memória Globo

Eterna coadjuvante, com poucas falas, quase sempre em papéis de empregada, Marina roubava a cena com interpretações debochadas. Por muito tempo ficou presa ao estereótipo racista da ‘crioula difícil’ e fez cenas incompatíveis com seu talento. Submeteu-se para garantir a sobrevivência.

Já idosa, precisou se expor diante das câmeras para admitir pobreza e pedir ajuda. Situação comovente vivida por outros artistas subestimados, principalmente negros. No fim da vida, o nome dela esteve associado a manchetes sobre brigas entre as filhas.

O anúncio de sua morte gerou a manifestação de colegas da TV. Muitos postaram mensagens em redes sociais e alguns até gravaram vídeos para exibição em programas. Fica a dúvida: por que a homenagearam apenas agora? Por qual razão não ofereceram apoio material e emocional quando ela tanto precisou?

As novas gerações – de comediantes e público – não têm ideia de quem foi e do que produziu Marina Miranda. No Brasil que despreza quem envelhece, os artistas veteranos ou se tornam invisíveis ou viram referências superficiais. Essa é, certamente, uma das explicações para o esvaziamento do humor na TV aberta.

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