‘BBB’ exaltava o macho alfa e virou um programa feminista
Ao longo do tempo houve transformação no perfil dos ganhadores do reality show que virou palco de relevantes debates sociais
A vigésima primeira edição do ‘Big Brother Brasil’, vendida pela Globo como o ‘Big dos Bigs’, entregou o que prometeu: entretenimento do começo ao fim.
Amizades, rivalidades, paixões mal resolvidas, brigas, complôs, vilões de novela, heróis imperfeitos, coadjuvantes que roubaram a cena, comédia e drama...
A temporada serviu ainda para confirmar uma mudança no perfil do mais amado e odiado reality show da televisão brasileira: as mulheres superaram os homens.
Os números não mentem: agora são 11 vencedoras contra 10 campeões. Nas últimas seis edições, apenas mulheres venceram — entre os 18 finalistas, apenas 5 homens.
O ‘BBB’ começou, no início da década de 2000, com o domínio de representantes do macho alfa, brothers associados ao homem padrão, viril, dominante: o malhado Kleber Bambam, do ‘BBB1’, o cowboy Rodrigo Leonel, do ‘BBB2’, o estrategista Dhomini, do ‘BBB3’.
A primeira mulher a vencer foi a babá Cida, do ‘BBB4’. Em seguida, uma revolução: a vitória do professor Jean Wyllys, gay assumido e vítima de homofobia na casa.
Veio o triunfo da auxiliar de enfermagem Mara, com perfil parecido com o de Cida: mulher humilde, carismática, fora dos padrões estéticos admirados, inicialmente desacreditada pelos colegas de confinamento e por parte do público.
Na sequência, quatro campeões. O representante do ‘homem perfeito’ Diego Alemão: branco, bonito, forte, sagaz, disputado por mulheres. O ‘menino boa gente’ Rafinha, amigo de todos. O articulador Max e o vilão Marcelo Dourado, que teve vitória histórica no ‘BBB10’ após ser demonizado na quarta edição.
As mulheres passaram a ganhar mais força com Maria Melillo no ‘Big Brother 11’. O veterinário e fazendeiro Fael venceu o ‘12’. Fernanda Keulla faturou a décima terceira temporada. Vanessa Mesquita, o ‘14’.
O último homem a ganhar o programa foi Cézar, do ‘BBB15’, um sujeito sensível, emotivo, sem vergonha de se mostrar afetuoso e confessar fragilidades sob o corpo musculoso e a rusticidade de origem.
A partir dele, apenas mulheres chegaram em primeiro lugar: Munik, Emilly, Gleici, Paula, Thelma e Juliette. Entre elas, a ativista social do Acre, a médica paulista e a maquiadora paraibana venceram com forte discurso feminista e a favor de pessoas discriminadas dos mais variados perfis, especialmente negros, estudantes pobres e nordestinos.
No ‘BBB18’, atitudes abusivas contra Emilly suscitaram discussão social a respeito de companheiros tóxicos e da preservação da saúde física e mental da mulher. Quem se deu bem no ‘Big Brother Brasil 19’ foi uma crítica do feminismo, Paula von Sperling, mas a edição contou com os discursos pró-mulheres e antimachismo de Hana, uma das participantes mais liberais e conscientes da história do programa.
Por meio do ‘Big Brother Brasil’, uma atração sempre criticada pelo conteúdo superficial e até fútil, muitas mulheres inseriram na sala de estar do telespectador discussões relevantes, como a luta contra o sexismo, os perigos de um relacionamento abusivo, a importância do acesso democrático à educação, o combate à injúria racial e ao racismo, o valor da sororidade, ou seja, a união feminina por suas reivindicações sociais.
Hoje, o ‘BBB' está mais ligado à imagem de mulheres fortes, resilientes e progressistas do que ao principal estereótipo valorizado e estimulado na sociedade brasileira: o do homem autossuficiente, com força superior e infalível.
Elas se fizeram protagonistas com suas qualidades e defeitos. Mulheres que tiraram força até dos momentos de fraqueza. Novas inspirações a milhões de cidadãos de todos os gêneros em um País erguido sobre as bases do patriarcado opressor e do falocentrismo institucionalizado.
O ‘Big Brother Brasil’, quem diria, virou ‘Big Sisters Brasil’.