Camiseta de banda e piadinhas: a Globo quer ser a MTV?
Com a cintura dura, emissora tenta se renovar, mas falta de gingado breca evolução na audiência
Quem costuma acompanhar a programação da Rede Globo - ou seja, a imensa maioria dos brasileiros - já deve ter percebido certas mudanças gradativas no comportamento da emissora e de seus profissionais. Mais jovem, a empresa aposentou alguns elementos tradicionais de sua trajetória, levantou da bancada e tentou entrar no ritmo do processo de "MTVização" de seu estilo. Pena que falta gingado.
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Maior canal de comunicação entre os jovens no fim do século passado, a MTV Brasil inciou suas atividades em 1990 e ganhou fama por algo muito mais simples que exibição de clipes e Beija Sapo: eram gente como a gente, falavam como a gente, e poderiam muito bem ser vistos no boteco da esquina tomando uma cerveja na mesa ao lado.
No caso da Globo, a mudança mais notada aconteceu no Jornal Nacional. No ar desde 1969, o maior telejornal do Brasil sempre foi apresentado por dois jornalistas, sentados, sérios, quase imóveis, lado a lado. Na época, Cid Moreira e Sérgio Chapelin inauguravam a modelidade "leitor de teleprompter", famosa nos Estados Unidos, na televisão brasileira. Agora, a atração é apresentada de diversas maneiras. William Bonner e Renata Vasconcellos levantam, conversam com repórteres, dão opinião, enfim. Um verdadeiro show de improvisação ao vivo e em rede nacional.
Além disso, veio a adoção da câmera nervosa, jargão utilizado para classificar o estilo de filmagem em movimento sem tripé. Ou seja, a imagem fica animada, ganha vida e se aproxima do registro amador, um dos trunfos da comunicação nos dias de hoje. Tudo isso é ótimo, aliás, mas há um problema.
A doutrina global de transformar âncoras em verdadeiros robôs sem expressão existe há décadas, e isso não se perde de repente. Rodrigo Bocardi e César Tralli são exemplos claros de que não é tão simples encontrar um meio termo para conquistar ambos os lados do público. Para ser direto: eles estão longe de parecer "gente como a gente". Ou você imagina Tralli, Bocardi e Bonner tomando uma cerveja na mesa ao lado do boteco pé sujo que você frequenta com seus amigos?
Dono absoluto do SPTV, Tralli está na Globo desde 1993. Acostumado com o jornalismo elitizado, o líder da sucursal paulistana agora tenta atuar de maneira mais descontraída, simplificada. No entanto, a postura de boneco de Olinda, as frases de efeito completamente montadas e o visível desconforto com a nova linha editorial fazem com que ele se pareça com aquele chefe isolado que, de repente, tenta virar amigo do setor inteiro. Até seu sorriso aparenta desconforto. E utilizar estigmas ultrapassados como "dona de casa" e "amigo trabalhador" não ajudam nem um pouco.
No caso de Bocardi, a descontração lhe parece mais natural. O problema é que, no fundo, o ex-correspondente de Nova York comete o mesmo erro de Tralli: parecer totalmente artificial com a postura que deve assumir. A falta de diálogo com o grande público faz com que o jornalista, ex-editor de economia de O Globo, fique com um semblante um pouco falso, com expressões vazias, meio como um político em época de eleição. Nem todos são Chico Pinheiro.
Boletim do G1 e Tiago Leifert: os erros e acertos do jornalismo moleque
O novo boletim do G1 é um acerto do jornalismo da Globo. Com G1 em 1 Minuto, aproximando TV e internet, a emissora dá sinais de que entendeu que os meios de comunicação não devem ser rivais, mas sim parceiros. Os jovens Mari Palma e Cauê Fabiano, com camisetas de banda e jeitinho meio nerd, meio hipster, mostram que, para ser sério, não precisa de terno e gravata e, para ser descontraído, não precisa deixar ninguém constrangido com piadinhas de titio.
Já Tiago Leifert, um dos primeiros a servir como experiência para o modelo, segue o mesmo, com observações brincalhonas e jeitão de rapaz boa praça. O problema é que, especialmente no esporte, a Globo tem certos "pontos sem nó", o que torna o apresentador, muitas vezes, um alvo de torcedores e espectadores em geral, especialmente quando Leifert tenta opinar sobre horários de jogos, estádios vazios e calendário ruim do futebol nacional, uma vez que sua empregadora é apontada como uma das principais responsáveis por tudo isso.
Nesse sentido, Fernanda Gentil se supera. Bela, animada, divertida, Gentil dribla facilmente qualquer gafe, sua ou não, e consegue conquistar o público do esporte - e de fora dele - sem fazer muito esforço. O carisma é natural, leve, agrada.
Faustão, Caldeirão, Estrelas, BBB: chegou a hora de mexer nos queridinhos
Se é para renovar, então renova de uma vez. No campo do entretenimento, a maior emissora do Brasil segue devendo. No sábado, a dobradinha Estrelas e Caldeirão do Huck, do casal Angélica e Luciano, é líder de audiência, mas muito mais por incompetência dos adversários do que qualquer coisa. As atrações, nos melhores dias, marcam por volta de 15 pontos nos grandes centros, e superam de longe o segundo colocado, Programa do Raul Gil, com 4,5.
Mesmo assim, ambos são cada vez mais criticados. O talk show de Angélica não tem sentido algum e mais parece um espaço feito para celebridades mostrarem como são ricas, chiques e, por isso, cheias de motivos para sorrir, algo muito distante da realidade da maioria de nós. Já o Caldeirão se apega aos mesmos quadros de sempre, com um Luciano queimado por tropeços na web e com a mesma linha de atuação da época do Programa H.
E é aí que entra o BBB. Amado e odiado pelo Brasil inteiro, o reality segura cada vez menos público, e tem audiência instável na casa dos 20 pontos no horário nobre. Muito pouco. Sem novidades, sem emoção, o trunfo de Boninho se arrasta em suas últimas edições, e seus chefes parecem não ter a menor intenção em arriscar alguma mudança.
Na dramaturgia, Malhação muda, avança, mas não sai do lugar. A temporada atual tem a melhor audiência em dois anos, mas está longe de seus anos dourados. Enquanto isso, a chefe Babilônia agoniza. A ousada trama de Gilberto Braga já foi freada. Alice, que era prostituta, virou mocinha. Beatriz foi de ninfomaníaca para apaixonada pelo amante, e o personagem de Marcos Pasquim, que entraria como gay enrustido, sabe-se lá como, vai virar galã veterano.
No meio do caminho entre o conservadorismo e a modernização, a Globo se divide em duas, colocando em conflito uma intenção em arriscar com a bajulação aos "queridinhos" da casa e velhos costumes. Diferente da MTV, o canal tem medo da rejeição e, por isso, acaba parecendo um ex-galã que tenta reviver os anos dourados paquerando as amigas do filho.