'Zona de Interesse': Conheça a história real do nazista Rudolf Hess, retratado no filme
Braço direito de Hitler, Hess comandava o campo de extermínio de Auschwitz, ajudou a escrever o 'Mein Kampf' e, no longa, concilia a vida de tirano e pai de família tradicional
Na mesa posta no jantar, em uma bela casa de campo no sul da Polônia dos anos 1940, uma família alemã se reúne. O jardim da propriedade se assemelha ao cenário de um filme da Era de Ouro de Hollywood, se não fosse um detalhe macabro: a casa divide muros com Auschwitz, maior campo de concentração nazista onde milhares de judeus foram exterminados. Lá, vive a família do Vice-Líder do Partido Nazista Rudolf Hess, sua mulher e seus dois filhos.
Esse é o mote de 'Zona de Interesse', de Jonathan Glazer ('Reencarnação' e 'Sob a Pele'), indicado ao Oscar de Melhor Filme. A história é uma adaptação do livro homônimo de Martin Amis (1949-2023), que retrata a "intimidade" da vida familiar do homem escolhido por Hitler para comandar Auschwitz.
Quem foi o Rudolf Hess (da vida real)
Rudolf Hess nasceu no Egito em 1894 e se mudou para a Alemanha ainda na juventude. Em 1919, ingressa na Universidade de Munique e tem contato com com a teoria do "espaço vital" que fundamentou o Partido Nazista, que pregava a conquista de novos territórios e exclusão de povos por uma suposta "classificação de superioridade".
Ainda na universidade, se encanta ao ouvir um discurso de Hitler e começa a construir uma amizade com o futuro ditador. Em 1922, entra para o Partido Nazista e passa a distribuir panfletos antissemitas em Munique.
Hitler e Hess são presos após o golpe fracassado do Putsch de Munique, em 1923. Ainda mais próximo do líder nazista, Hess ajuda a escrever Mein Kampf ("Minha Luta"), o livro-guia antissemita hitleriano - dize-se que Hitler ditou parte de obra a seus parceiros, Emil Maurice e Rudolf Hess, durante a prisão.
Aos poucos, torna-se homem de confiança de Hitler e Vice-Chanceler da Alemanha Nazista. Em 1940, assume o comando de Auschwitz e se muda com a família recém-formada para as proximidades da prisão, abandonando a vida agrária que planejavam levar.
Por lá, construiu um jardim florido para que os filhos não notassem as atrocidades que aconteciam na vizinhança, escondendo, por exemplo, a chaminé da prisão da vista das crianças.
Pesquisadores alegam que a família Hess levou uma vida luxuosa e ostentava joias e casacos de pele dos presos judeus, apesar de Hess ter alegado que sua mulher pouco sabia sobre o extermínio nazista.
Foi no centro de concentração que Hess optou pela execução por meio das câmeras de gás, que eram consideradas mais letais - o local chegou a assassinar mais de 2 mil pessoas por dia usando deste método.
Em 1941, decide partir, sozinho, para a Escócia, a fim de propor um tratado de paz com os aliados. Pilota um avião e salta de para-quedas próximo a Glasgow, onde é preso imediatamente. Furioso, Hitler o considera louco e manda matá-lo.
Após a Segunda Guerra, tenta mudar com a família para a América do Sul, mas são encontrados ainda no norte da Alemanha. A mulher entrega o marido após presenciar o filho sendo espancado pela polícia britânica. Ao ser capturado, ele nega ser Hess mas é desmascarado pela aliança cravejada com o nome do casal.
No Julgamento de Nuremberg, atuou como testemunha e confessou diversos de seus crimes. Em 1946, foi condenado à prisão perpétua. Em 1986, aos 93 anos, seu corpo é encontrado na prisão com sinais de enforcamento.
Zona de tensão
Com atuações elogiosas ao casal Rudolf Hess e Hedwig Hess, vivido por Christian Friedel e Sandra Hüller, Zona de Interesse não parte da premissa de expor memórias traumáticas - seu triunfo está justamente em não se mostrar uma produção padrão sobre o nazismo.
A tensão está na onisciência do espectador, que sabe haver uma realidade terrível do lado de fora da casa que parece intransponível ao cenário de comercial de margarina construído pela família Hess, que tenta abafar - às vezes, literalmente - o sofrimento humano vivido do lado de lá daqueles muros.
Ao mesmo tempo, mostra a realidade de uma família tida como comum da burguesia europeia, com a qual espectadores podem assustadoramente se identificar. Desta forma, parte da crítica considera que o filme pincela a teoria de Hannah Arendt sobre a banalidade do mal.
O desafio de viver um Rudolf Hess tirano e pai de família tido como exemplar - para os moldes dos anos 1940 - vem rendendo elogios a Christian Friedel, ator alemão que dá vida a Hess.
O filme teve estreia nos cinemas brasileiros no dia 15 de fevereiro.