O grupo Pão de Açúcar só vê uma forma de crescer este ano: roubando mercado dos concorrentes. Contar com o festejado aquecimento da economia para aumentar vendas está absolutamente fora da pauta da empresa. Essa visão mais cética da conjuntura foi expressa nesta segunda-feira pelo próprio presidente do grupo, Abílio Diniz. Apesar de todas as previsões otimistas do governo e de economistas, sua empresa não espera crescimento de consumo, da renda média individual do trabalhador e muito menos da massa de rendimentos (que relaciona o rendimento médio com o estoque de empregos). Para ele, até agora recomposição de ganhos dos consumidores só existe nas análises teóricas - e pode não sair delas antes de 2001. "Não temos nenhum indicador real de recomposição de renda", afirmou."Os salários estão muito baixos e por isso cada vez mais o consumidor está se concentrando na parte de alimentação, ou seja, apenas porque não tem dinheiro para comprar o resto". Por isso, Diniz é enfático quanto fala em aumento de vendas e faturamento. "Apostamos em nós, no crescimento da nossa eficiência e da nossa produtividade para avançar no mercado dos outros; em trazer mais gente para as nossas lojas, em prejuízo das outras redes". Para ele, "se" houver recuperação da renda e do emprego, isso ocorrerá no segundo semestre, e se revelará pequena demais para alterar o consumo.
Preços em queda - Diniz informou ainda que não há nenhuma pressão de preços por parte dos fornecedores. "Ao contrário, os preços estão caindo", disse. No caso, as quedas estão se dando no setor de alimentação e serão repassados ao consumidor esta semana, segundo disse, nas lojas do grupo. Mesmo no segmento de higiene e limpeza, que apresentou alta de preços nas últimas semanas, não há mais pressão perceptível, de acordo com o empresário. "Pode haver um ou outro aumento, mas nada que possa ser indenticado de forma global". Para Diniz, tudo indica que alimentação continuará a representar uma espécie de seguro contra altas nos índices de inflação este ano. Assim, renda deprimida e comida barata - ao mesmos os produtos básicos - continuarão ajudando a segurar a estabilidade da economia, em contraposição aos preços públicos (tarifas e combustíveis), nos quais se espera fortes altas, como ocorreu no ano passado.
Social - O empresário Abílio Diniz deu essas declarações minutos antes de assistir a uma cena inédita: a interrupção da fechadíssima reunião semanal da direção da rede, que ocorre todas as segundas-feiras e trata de assuntos sempre áridos, pelo cantor de pagode Netinho, do conjunto Negritude Junior. Foi a primeira vez que alguém de fora da empresa entrou numa reunião dessas.
O compromisso empresarial obrigou Netinho a alugar um terno - de veludo azul - para fazer uma rápida exposição sobre sua parceria com o grupo, para a venda exclusiva nas lojas Extra das roupas e acessórios com a marca "100% Cohab", que se transformou na grife social do movimento Família Negritude.
O movimento tem por objetivo dar educação complementar a crianças carentes. O dinheiro obtido com as vendas de roupas no grupo Extra, informou Netinho, será aplicado na construção de uma escola, em terreno de 29 mil metros quadrados, orçada em R$ 11 milhões. Os produtos chegarão às lojas sábado.
A insólita interrupção da reunião semanal da diretoria por um pagodeiro tem a ver com a intenção do grupo de investir no social. O Pão de Açúcar separou este ano R$ 3,4 milhões para esse fim, além dos R$ 5,5 milhões que serão destinados ao Instituto Pão de Açúcar, também empenhado em dar educação complementar às crianças.