2025, o ano decisivo para a indústria automobilística alemã
Setor entrou em crise em 2024, com baixa produção de veículos elétricos e queda da demanda na China por carros a combustão. Recessão pressiona a economia da Alemanha.A economia alemã entra no ano de 2025 presa em uma recessão agravada pela crise na indústria automobilística do país. A Volkswagen, por exemplo, maior fabricante de automóveis da Europa, planeja cortar milhares de empregos no país nos próximos anos. Demissões em massa também estão previstas por outras montadoras, como a Ford .
Ainda que a desaceleração do setor seja evidente, não há unanimidade entre especialistas e o mercado sobre quais são as causas da crise.
Diretor do Centro de Gestão Automotiva (CAM), um instituto alemão de pesquisa científica na área automotiva, Stefan Bratzel descreve a situação como uma "combinação de dificuldades" que levam a uma "policrise alemã".
Para Bratzel, a indústria "ainda está aprendendo novas habilidades na transição para a mobilidade elétrica, veículos baseados em software e direção autônoma", que criam um emergente ambiente competitivo, não limitado às pioneiras em produção de veículos elétricos, como a Tesla e as montadoras chinesas.
Já a Associação Alemã da Indústria Automotiva (VDA) atribui parte da culpa do problema aos formuladores de políticas públicas. À DW, o grupo defendeu que a súbita interrupção dos subsídios para compra de veículos elétricos em dezembro de 2023 pelo governo do chanceler federal alemão Olaf Scholz e a incipiente infraestrutura de carregamento de baterias na Alemanha estavam "diminuindo as vendas e contribuindo para a situação geral".
Ferdinand Dudenhöffer, do Centro de Pesquisa Automotiva (Car-Institut), vinculado a uma universidade de Bochum, na Alemanha, compartilha dessa visão. Ele vê sinais contraditórios dos legisladores. "Em um momento, eles querem carros elétricos, e no seguinte estão promovendo motores a combustão, o que confunde as pessoas", disse ele à DW.
O papel da China
Já está claro há anos que o futuro do automóvel não está no motor a combustão tradicional. A tendência na indústria se move de forma decisiva rumo à mobilidade elétrica.
Bratzel, porém, vê uma falha crítica das montadoras: embora os fabricantes de automóveis alemães se destaquem na fabricação de carros convencionais, eles ficam para trás na produção de veículos elétricos, que requerem softwares automotivos e componentes eletrônicos, em vez de peças mecânicas. "A erosão dos velhos paradigmas e do conhecimento é realmente trágica", comenta.
Dirk Dohse, do Instituto Kiel para a Economia Mundial (IfW), acredita que os desenvolvedores e engenheiros alemães ainda fazem parte da "elite global". No entanto, ele aponta "falta de flexibilidade, especialmente na gestão, para atrair novos grupos de clientes".
Dohse vê a China à frente da Alemanha não só em tecnologia de elétricos, mas também em termos de poder de mercado. "O mercado de carros elétricos chinês é o maior e mais dinâmico globalmente, o que sugere que a China continuará avançando."
Os enormes avanços tecnológicos da China e a mudança dramática nas preferências dos consumidores chineses criaram enormes problemas para as três grandes montadoras alemãs Volkswagen, BMW e Mercedes, que por muito tempo dominaram o mercado de carros chinês com seus veículos movidos a combustão.
Mas há até novos rivais competindo contra os alemães por fatias de mercado, diz Bratzel. "Não é só a China. No médio prazo, players mais fortes também surgirão na Índia, modelados por fabricantes chineses. Muitas empresas da China e da Coreia do Sul provavelmente entrarão na Índia, possivelmente por meio de joint ventures", afirmou.
Professor de gestão automotiva na Fachhochschule des Mittelstandes (Universidade de Ciências Aplicadas para Pequenas e Médias Empresas), Frank Schwope ainda vê alguma esperança para os fabricantes alemães no desenvolvimento de baterias de última geração, um componente-chave dos veículos elétricos no momento e no futuro.
"As baterias para veículos elétricos estão longe da maturidade [tecnológica]. Avanços significativos são possíveis, e até o final da década, poderíamos ver uma mudança para baterias de estado sólido, que podem mudar o jogo", afirma.
Corrida contra o tempo
Bratzel, da CAM, acredita que 2025 será um ano decisivo para a indústria automotiva alemã — não apenas em termos de melhorias regulatórias, mas também em termos de ação criativa. "A Alemanha deve ser pelo menos tão inovadora quanto custosa", argumenta.
O que está em jogo é ilustrado por um estudo recente realizado pelo Instituto Prognos, com sede na Suíça, encomendado pela Associação Alemã da Indústria Automotiva (VDA, na sigla em alemão). Segundo a pesquisa, se a tendência atual dos veículos elétricos continuar, a Alemanha deve perder cerca de 186 mil vagas de emprego no setor de fabricação de veículos até 2035, em comparação com 2019. Entre 2019 e 2023, por exemplo, a indústria já perdeu cerca de 46 mil empregos.
O porta-voz da VDA defende uma ação política rápida, que inclua "menos burocracia, mais acordos comerciais, um sistema tributário competitivo, bem como processos de aprovação mais simples e rápidos."
Um caminho difícil à frente
Mesmo que a política crie condições mais favoráveis e os fabricantes de automóveis alemães se tornem de novo competitivos, a recuperação da indústria levará tempo, adverte Bratzel. "Os próximos dois a três anos serão um grande desafio, exigindo o enfrentamento simultâneo de muitos problemas estruturais."
Dohse, do IfW, por outro lado, prevê piora da situação. "Acho que 2025 será um ano muito difícil para a indústria automotiva alemã, e também será um ano em que definir o rumo certo para o futuro será essencial."
Para Dudenhöffer, do Car-Institut, tudo dependerá de como os mercados nos Estados Unidos e na China se desenvolverão. "É de extrema importância para a indústria estar presente em mercados dinâmicos. Isso pode acontecer na China até certo ponto, mas também nos EUA, onde Donald Trump ainda não decidiu se quer voltar à era dos motores a combustão da década de 1980."
O professor Schwope acredita que há uma centelha de esperança para os fabricantes de automóveis alemães, pois ele espera que as vendas de elétricos atualmente lentas na Alemanha e na Europa "ganhem um impulso significativo até 2025, ou no máximo até 2026."