Abandono do teto de gastos mergulha País na recessão, além de elevar juros e inflação, diz Economia
Nos cálculos da SPE, abandono da regra acentuaria a queda do PIB esperada para este ano; previsão de recuo é de 4,7%, mas o tombo poderia chegar a 6,9%; além disso, crescimento esperado para 2021, de 3,2%, ficaria menor, com alta de 1,7%
BRASÍLIA - O abandono do teto de gastos, mecanismo que limita o avanço das despesas à inflação, poderia mergulhar o País numa recessão ainda mais profunda em 2020, reduzir o crescimento em 2021, além de elevar juros e inflação, calcula a Secretaria de Política Econômica (SPE) do Ministério da Economia.
O órgão divulgounesta quinta-feira, 3, uma nota técnica em defesa do teto, num momento em que economistas de diferentes correntes de pensamento aderem à defesa por mudanças na regra.
Em entrevista ao Estadão/Broadcast, o ex-presidente do Banco Central Armínio Fraga defendeu uma "flexibilização limitada e transparente" do teto, associada a um compromisso firme do governo com as reformas. Para ele, seria melhor manter a regra, mas isso pode não ser possível ou viável diante de "necessidades prementes" de gastos sociais, de saúde e de investimentos.
A equipe econômica, porém, tem feito uma defesa enfática do teto de gastos. O secretário de Política Econômica, Adolfo Sachsida, diz que o teto "é uma importante política social". "Ele não está lá por ideologia, mas porque ele gera resultados benéficos para o País, principalmente para população mais pobre. Ele gera emprego e inflação mais baixa", afirma.
Segundo o secretário, o teto "não é o inimigo", mas sim um termômetro da necessidade de rever gastos obrigatórios.
Nos cálculos da SPE, o abandono da regra acentuaria a queda do PIB esperada para este ano. Hoje a previsão de recuo é de 4,7%, mas o tombo poderia chegar a 6,9%. Além disso, o crescimento esperado para 2021, de 3,2%, ficaria menor, com alta de 1,7%.
O chamado "cenário alternativo" foi feito a partir de um exercício que compara o que teria acontecido em caso de abandono do teto no 1º trimestre deste ano, "elevando as probabilidades de mudança de regime", com o cenário base (atual).
Outros efeitos do fim do teto, na avaliação da SPE, seria o aumento dos juros e da inflação. De acordo com os cálculos, o risco fiscal maior levaria a taxa Selic a 3,7% ao ano no fim de 2020, 1,7 ponto porcentual acima do projetado hoje para o período. Ao fim de 2021, a Selic chegaria a 4,1% sem o teto, 1,1 pp maior que o previsto no cenário base atual da Secretaria.
No caso da inflação, o IPCA poderia disparar e encerrar o ano em 3,5%, 2,0 pontos porcentuais acima do previsto hoje para 2020. No ano que vem, o índice de preços poderia acabar tendo alta de 4,6% sem o teto de gastos, 1,4 pp acima do estimado atualmente para o período.
"Esse aumento (da inflação) ocorre a despeito da piora no cenário de crescimento, porque os agentes que determinam preço nesta economia passam a considerar um risco maior de que o ajuste fiscal será feito via inflação, o que eleva as expectativas de inflação e a inflação corrente", afirma a nota da SPE.
O órgão calcula ainda que o CDS (Credit Default Swap), a taxa extra de juros cobrada pelo investidor internacional para ficar com títulos do Tesouro de cinco anos, poderia subir pelo menos 200 pontos em caso de abandono do teto sem a aprovação de outros mecanismos de ancoragem fiscal. Essa alta seria reflexo da maior percepção de risco dos investidores em relação ao Brasil, elevando a probabilidade de um default (insolvência) embutida no CDS de cinco anos a 24%.
"No contexto da pandemia, o teto de gastos permitiu indiretamente que uma grande expansão fiscal transitória fosse colocada em prática sem que os prêmios cobrados pelos financiadores da dívida pública se elevassem além do normal. A sinalização emitida pelo teto de gastos de que haverá uma retomada do ajuste fiscal via contenção de despesas a partir de 2021 foi o que permitiu a reação fiscal do governo sem efeitos deletérios mais à frente", afirma a nota.