Atraso na entrega de adubo e insumos ameaça produtividade do agronegócio
Também está parada, há um mês e meio, a venda futura da safra de soja para as tradings, que funciona como financiamento para os produtores; paralisia e atraso são reflexos do impasse criado no setor pelo tabelamento do preço do frete
A menos de 60 dias do início do plantio da safra de grãos, os agricultores vivem um impasse. A entrega do adubo usado no preparo do solo está atrasada. Também a venda futura de soja para as tradings, que é um financiamento ao produtor, parou.
Os dois episódios refletem a confusão enfrentada pelo agronegócio, após a greve dos caminhoneiros, que resultou no tabelamento do preço do frete e na disparada dos custos para o setor. Esse cenário põe em risco a produtividade da próxima safra e ameaça o setor, um dos poucos com desempenho favorável, que tem garantido saldo comercial e inflação sob controle.
Especialistas ressaltam que o produtor não vai deixar de plantar, mas pode adubar menos e colher um volume bem menor. Em Mato Grosso, principal produtor de soja, só um terço do adubo foi entregue até agora comparado ao mesmo período do ano passado, conta o presidente da Aprosoja-MT, Antonio Galvan. No Paraná, o primeiro na produção de milho, 40% da distribuição de insumos, que incluem além do adubo, sementes e fungicidas, está comprometida, diz o presidente da Organização da Cooperativas do Paraná, José Roberto Ricken.
David Roquetti Filho, diretor da Anda, que reúne a indústria de adubos, confirma os atrasos. Diz que houve uma redução de 2,3% nas entregas no 1.º semestre e ressalta que Mato Grosso é o Estado mais afetado. Duas saídas estão sendo usadas pelos fabricantes de adubos para resolver o atraso nas entregas por conta do tabelamento do frete. Há indústrias que chamam para renegociar preços já fechados. Outras liberam o adubo para o produtor retirar. Mas nenhuma das estratégias está dando certo. "Uma vez vendido, está vendido, ninguém quer pagar a diferença", diz Galvan.
Futuro. A venda antecipada de soja em Mato Grosso parou em 21% da safra desde o fim de maio, bem abaixo do normal para a época do ano (33%), informa o Instituto Mato-grossense de Economia Agropecuária. No País, essa marca é bem menor, está 16%, segundo a Abiove, que reúne a indústria de óleos e as tradings. A dificuldade de definir preço paralisou os negócios.
Do ponto de vista macroeconômico, o quadro também é "preocupante", alerta Fabio Silveira, sócio da consultoria Macrosector. Nas suas contas, a safra de grãos, de 230,7 milhões de toneladas neste ano e que poderia subir para 257 milhões de toneladas por causa do cenário favorável no mercado externo e da desvalorização do real, deve ficar entre 237 a 238 milhões de toneladas. A receita, deste ano de R$ 242,7 bilhões e que poderia subir para até R$ 270 bilhões em 2019, agora foi revisada para R$ 242,7 bilhões. A analista da MB Agro, Ana Laura Menegatti, concorda: "Se esse quadro persistir, a produção e a receita serão menores".
Preocupação. Em outros anos, nesta época, o produtor Antonio Pedrini, há 35 plantado soja e milho, já estaria com todos os insumos em casa. É que normalmente, logo após a primeira chuva, depois de 15 de setembro, ele começa a semear os 1.200 hectares que cultiva em Maringá, norte do Paraná. Mas neste ano a situação é diferente: o galpão, onde armazena o adubo e sementes, está vazio e ele, preocupado.
Enquanto Pedrini aguarda a entrega dos insumos, ele tenta se resguardar dos altos e baixos do mercado de soja. Até agora, o agricultor vendeu 25% da safra de soja que ainda não plantou nem recebeu a semente nem o adubo. "Tem anos que, nesta época, eu já tinha vendido um volume maior", lembra.
No entanto, diante das incertezas que existem no mercado, as tradings estão com medo de fechar negociações futuras, isto é comprar a soja verde, antes do plantio, como é conhecido esse negócio no mercado de commodities. Segundo o agricultor, o preço atual da soja no Paraná, na casa de R$ 77 a saca de 60 quilos, está "razoável". Daniel Amaral, gerente da Abiove, que reúne as indústrias de óleos e as tradings, explica que a insegurança no fechamento de negócios futuros ocorre porque ficou mais difícil calcular custos e preços após o tabelamento.