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Auxílio Brasil pode levar eleição para segundo turno

Benefício com valor aumentado para R$ 600 começa a ser pago nesta terça-feira e pesquisas recentes mostraram aumento das intenções de voto em Jair Bolsonaro

9 ago 2022 - 15h43
(atualizado às 16h48)
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Pesquisas mostram aumento das intenções de voto em Jair Bolsonaro
Pesquisas mostram aumento das intenções de voto em Jair Bolsonaro
Foto: Reuters / BBC News Brasil

O governo federal começa a pagar nesta terça-feira (09/08) a primeira parcela do Auxílio Brasil com seu novo valor: R$ 600. A estimativa é que pelo menos 20 milhões de famílias em todo o Brasil recebam o benefício "turbinado": antes, ele era de R$ 400.

O início do pagamento coincide com a reta final das eleições presidenciais, fazendo com que observadores e analistas avaliem quais os impactos que isso pode ter no resultado eleitoral.

O aumento de R$ 200 no valor do Auxílio Brasil foi fruto de intensa articulação do governo com o Congresso Nacional e classificado por analistas como uma medida eleitoreira. As críticas se fundamentavam no fato de que a medida foi tomada no momento em que o presidente Jair Bolsonaro (PL) vem aparecendo atrás do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas principais pesquisas de intenção de voto.

O governo, no entanto, defendeu a medida como uma forma de dar apoio à população vulnerável que enfrenta os efeitos do aumento da inflação dos alimentos e dos combustíveis.

Críticas à parte, pesquisas mais recentes já apontam uma tendência de alta nas intenções de voto de Bolsonaro. A dúvida agora é: em que medida o benefício de R$ 600 vai afetar a corrida eleitoral?

Especialistas em pesquisas de intenção de voto consultados pela BBC News Brasil apontam que o principal efeito do início do Auxílio Brasil de R$ 600 é que ele deverá levar as eleições para o segundo turno, contrariando as expectativas de alas do PT que trabalham para que a disputa seja resolvida já no primeiro turno.

Eles alegam que isso deve acontecer porque o começo do pagamento deverá melhorar as intenções de voto de Bolsonaro no segmento do eleitorado que recebe até dois salários-mínimos, onde Lula vem apresentando liderança e que é um dos que concentra a maior quantidade de votos. Isso diminuiria a distância entre os dois e reduziria as chances de uma eleição em apenas um turno, dizem os especialistas.

"A estratégia é minar a campanha de Lula no terreno em que ele se sente mais confortável: o eleitorado mais pobre", disse o ex-diretor de pesquisa do Datafolha e consultor Alessandro Janoni.

Eles afirmam, no entanto, que esse impacto no eleitorado deve ser limitado e que seria pouco provável que Bolsonaro revertesse a liderança de Lula neste segmento considerado estratégico do eleitorado.

Auxílio turbinado acaba em dezembro

A expansão do Auxílio Brasil de R$ 400 para R$ 600 foi aprovada pelo Congresso Nacional em julho deste ano por meio de uma emenda constitucional. Ela determinou que o país está em uma situação de emergência por conta da inflação dos alimentos e dos combustíveis.

Além de ampliar o valor do auxílio, a medida também criou benefícios como um auxílio a caminhoneiros de R$ 1 mil por mês — benefício igual foi estendido aos taxistas.

A emenda, porém, estabeleceu que o benefício aos motoristas e o Auxílio-Brasil de R$ 600 só serão pagos até dezembro deste ano.

A medida se somou à redução da carga tributária sobre combustíveis e outros insumos considerados essenciais como eletricidade e telecomunicações que vinham pressionando para cima a inflação no país.

Pouco depois de a emenda ser aprovada, as principais pesquisas de intenção de voto já começaram a mostrar uma melhora das intenções de voto de Bolsonaro.

No segmento do eleitorado que ganha até 2 salários-mínimos, pesquisa Datafolha mostra que Lula saiu de 56% para 54% das intenções de voto entre junho e julho. Bolsonaro oscilou de 20% para 23%
No segmento do eleitorado que ganha até 2 salários-mínimos, pesquisa Datafolha mostra que Lula saiu de 56% para 54% das intenções de voto entre junho e julho. Bolsonaro oscilou de 20% para 23%
Foto: Reuters / BBC News Brasil

O Datafolha mostra que, entre junho e julho deste ano, Lula se manteve com 47% de intenção de votos enquanto Bolsonaro oscilou 1 ponto percentual, saindo de 28% para 29%. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Se no cenário geral os dados mostram estabilidade, no segmento do eleitorado que ganha até 2 salários-mínimos, a mudança foi mais sentida. Lula saiu de 56% para 54% das intenções de voto nesse segmento entre junho e julho. Bolsonaro oscilou de 20% para 23%.

Outra pesquisa indica a mesma tendência. Segundo levantamento divulgado em agosto pela Quaest Consultoria e Pesquisa, Lula saiu de 55% para 52% das intenções de voto neste segmento entre o final de junho e final de julho. Bolsonaro, por sua vez, saiu de 22% para 25%. A margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

Os dados da Quaest mostraram ainda um outro dado. Entre os eleitores entrevistados que disseram ser beneficiários do Auxílio Brasil, Lula saiu de 62% das intenções de voto para 52%, enquanto Bolsonaro saiu de 27% para 29%.

Segundo turno cristalizado

Janoni diz que o início do pagamento do Auxílio Brasil de R$ 600 deverá impactar positivamente as intenções de voto de Bolsonaro. Segundo ele, se Bolsonaro souber capitalizar esses ganhos, a eleição deverá ir para o segundo turno.

"A gente viu que, antes do pagamento, só com os rumores, já houve uma melhora no cenário de Bolsonaro. Com o pagamento, isso dever crescer um pouco mais. Se ele não criar problemas em outros segmentos do eleitorado, isso tende a diminuir a distância dele em relação a Lula e levar a eleição, definitivamente, para o segundo turno", diz Janoni.

Lideranças do PT vêm trabalhando para que Lula vença a eleição presidencial já no primeiro turno, evitando assim um embate ainda mais polarizado com Bolsonaro.

Para que a disputa termine no primeiro turno, um candidato precisa ter mais de 50% dos votos válidos, que é a somatória dos votos exceto os nulos e brancos.

De acordo com a pesquisa mais recente do Datafolha, Lula tem 52% das intenções de votos válidos. Mas como a margem de erro da pesquisa é de dois pontos percentuais para mais ou para menos, a possibilidade de encerrar a disputa em um turno só é vista com cautela pelo comando da campanha petista.

O PT tenta evitar passar a imagem de que a campanha estaria "de salto alto" e Lula já disse que o partido está preparado para disputar dois turnos.

"Se der certo (a vitória no primeiro turno), ótimo. Se não der no 2 de outubro, vamos para o segundo turno", disse Lula no dia 27 de julho em entrevista ao portal UOL.

Para o cientista político e professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP) Marco Antônio Teixeira, o pagamento do auxílio de R$ 600 é a "cartada definitiva" de Bolsonaro nessas eleições e deverá consolidar a necessidade de um segundo turno.

"É a cartada definitiva. Não há mais prazo para que Bolsonaro comece a crescer. Ou ele começa a crescer agora, ou sua situação ficará difícil. O pagamento terá impacto, sim, e deverá consolidar uma disputa no segundo turno", explicou o professor.

Antônio Lavareda, presidente do conselho científico do Instituto de Pesquisas Sociais, Políticas e Econômicas (Ipespe), também diz acreditar que o início do pagamento do auxílio de R$ 600 diminui as chances de uma eleição de turno único.

"[Essa medida] cristalizará o apoio a Bolsonaro e, como tal, tornará mais difícil a eleição ser resolvida no primeiro turno", afirmou Lavareda.

Impacto limitado

Apesar de concordarem com a possibilidade de que o auxílio "turbinado" possa levar as eleições para o segundo turno, os especialistas dizem não acreditar que o efeito da medida vá reverter a liderança que Lula apresenta no eleitorado mais pobre, segundo as pesquisas de intenção de voto.

Janoni diz que essa reversão é improvável porque Lula já ocupa o imaginário de parte expressiva desse segmento como alguém bem-sucedido no combate à fome e à miséria.

"Nesse segmento, Lula é o que a publicidade chama de 'top of mind'. É a marca dele e é muito difícil reverter isso. Não basta só dar dinheiro. Seria preciso um conjunto de políticas públicas mais sólidas e duradouras", avaliou o especialista.

Marco Antônio Teixeira, por sua vez, disse que os efeitos desse tipo de política de transferência de renda direta são efêmeros e podem não ser suficientes para sustentar um crescimento consistente de Bolsonaro.

"A gente viu, em 2020, quando o auxílio emergencial começou a ser pago, que houve um pico de popularidade de Bolsonaro. Mas ele, rapidamente, voltou a perder popularidade. A questão agora é saber se essa injeção de popularidade vai durar até as eleições", disse o professor.

"É uma sobrevida que está sendo dada a Bolsonaro para ele chegar no segundo turno. Não há elementos que me façam crer, agora, que possa haver uma reversão dessa liderança de Lula. A estratégia é chegar passar pelo primeiro turno e polarizar com Lula o mais que puder no segundo para tentar tirar a diferença", afirmou o professor.

Os especialistas dizem, ainda, que o efeito do auxílio-caminhoneiro, que também começará a ser pago agora, e a possibilidade de que beneficiários do Auxílio-Brasil possam fazer empréstimo consignado deverão ter impactos limitados no eleitorado.

"Os caminhoneiros configuram um segmento estratégico para evitar mobilizações como as que já pararam o país, mas em termos eleitorais compõem um grupo de baixo peso quantitativo. O consignado tem baixo alcance por ser de difícil compreensão e de características muito específicas. Isso dificulta o acesso à maioria dos beneficiados", afirmou Janoni.

Lavareda afirmou que nem mesmo a promessa feita por Bolsonaro de que o benefício de R$ 600 poderá ser mantido em 2023 deverá ter os efeitos desejados pela campanha do presidente.

"Por acaso você acha que o Lula diria algo diferente disso pro eleitor?", indagou Lavareda. Na semana passada, Lula se comprometeu a avaliar a proposta de manter o valor de R$ 600 ao auxílio no futuro.

A promessa foi feita após receber o apoio do deputado federal e ex-candidato à Presidência André Janones (Avante-MG). A busca da campanha petita pelo apoio do deputado fez parte da estratégia de tentar acabar as eleições no primeiro turno.

- Este texto foi publicado em https://www.bbc.com/portuguese/brasil-62475613

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