BC acelera aperto com alta de 1 ponto na Selic e prevê mais dois aumentos equivalentes
O Banco Central acelerou o ritmo de aperto nos juros nesta quarta-feira, ao elevar a taxa Selic em 1,00 ponto percentual, a 12,25% ao ano, e surpreendeu ao prever mais duas altas da mesma magnitude à frente, após citar risco de piora da dinâmica inflacionária a partir do anúncio de medidas fiscais do governo.
"Diante de um cenário mais adverso para a convergência da inflação, o Comitê antevê, em se confirmando o cenário esperado, ajustes de mesma magnitude nas próximas duas reuniões", afirmou o Comitê de Política Monetária (Copom) em comunicado divulgado nesta quarta que mostrou que a decisão foi tomada de forma unânime pelo colegiado.
A decisão de promover o aperto mais agressivo nos juros básicos do país em mais de dois anos, já apontando para novas elevações de mesma intensidade, ocorreu na última reunião do Copom do ano e a derradeira com Roberto Campos Neto no comando da instituição.
Analistas apontaram que a indicação futura apresentada no comunicado sinaliza um BC com postura dura em 2025, quando o governo Luiz Inácio Lula da Silva terá maioria de indicados na diretoria do BC, com sete dos nove membros do Copom, incluindo Gabriel Galípolo na presidência.
Se confirmadas as duas elevações adicionais de 1 ponto na Selic no início do ano que vem, a taxa básica alcançará 14,25%, maior patamar desde outubro de 2016.
A economista-chefe da B.Side Investimentos, Helena Veronese, avaliou que o comunicado teve "tom bastante duro", mostrando que o novo BC pode manter sua credibilidade junto ao mercado.
"Ficou para o BC o papel de ser a autoridade que busca manter a credibilidade e trazer algum controle para os mercados em um momento de absoluto estresse. Se por um lado uma sinalização de um ciclo tão apertado assusta, por outro, pode ser bem recebida justamente por reforçar a credibilidade e afastar, por ora, o risco de um cenário de dominância fiscal", afirmou.
Na avaliação do economista-chefe do Banco Fator, José Francisco de Lima Gonçalves, porém, a incerteza sobre os resultados do pacote fiscal do governo, associada à decisão do BC, pode ampliar o risco de dominância fiscal --quando o descontrole das contas públicas faz com que a política de juros perca a eficácia.
"A escolha do Copom pelo choque (nos juros) recoloca o risco adicional de dominância fiscal, pois a única garantia, por ora, é o aumento da despesa (do governo) com juros", disse.
Para o Copom, o cenário mais recente é marcado por desancoragem adicional das expectativas de inflação, elevação das projeções para os preços, dinamismo acima do esperado na atividade e maior abertura do hiato do produto, "o que exige uma política monetária ainda mais contracionista".
No comunicado, a autarquia argumentou que a decisão de elevar os juros básicos em 1 ponto na reunião desta semana é compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta ao longo do horizonte relevante.
"O Banco Central reage ao cenário adverso", disse o economista-chefe do banco BV, Roberto Padovani. "Uma ação contundente que procura reforçar o compromisso do BC com o sistema de metas."
FISCAL PRESSIONA INFLAÇÃO
Após a apresentação de medidas de contenção de despesas pelo governo Luiz Inácio Lula da Silva, que não foram bem recebidas pelo mercado, a autoridade monetária alertou para o efeito gerado pelo anúncio e sua consequência para a inflação.
"A percepção dos agentes econômicos sobre o recente anúncio fiscal afetou, de forma relevante, os preços de ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio. Avaliou-se que tais impactos contribuem para uma dinâmica inflacionária mais adversa", disse o BC no comunicado.
Com o ajuste desta quarta, a Selic atingiu o maior nível desde dezembro de 2023, quando também estava em 12,25% em meio a um ciclo de cortes nos juros. O Copom retomou ciclo de alta nos juros básicos em setembro, quando elevou a Selic em 0,25 ponto percentual, e fez nova elevação em novembro, de 0,50 ponto.
Para o BC, a atividade econômica e o mercado de trabalho no país seguem apresentando dinamismo, com o PIB do terceiro trimestre indicando uma abertura adicional do hiato do produto --quando a atividade do país opera acima de seu potencial, o que pressiona os preços.
No comunicado, o Copom passou a afirmar que "em função da materialização de riscos", o cenário está menos incerto e mais adverso, com persistência de assimetria no seu balanço de riscos, que aponta maiores chances de alta nos preços à frente.
"A inflação cheia e as medidas subjacentes têm se situado acima da meta para a inflação e apresentaram elevação nas divulgações mais recentes", disse.
A decisão desta quarta divergiu da expectativa de mercado captada em pesquisa da Reuters, na qual 31 de 40 economistas entrevistados na última semana projetavam que o BC elevaria a Selic em 0,75 ponto. Bancos de grande porte, como Itaú e JP Morgan, e o mercado de juros, contudo, já apostavam em um aumento mais forte, de 1,00 ponto.
Para as primeiras duas reuniões de 2025, analistas consultados pelo BC no relatório Focus previam uma alta de 0,75 ponto, seguida de um aperto de 0,50 ponto.
Desde a última reunião do Copom, as expectativas de mercado para os preços à frente seguiram desancoradas, fator tratado enfaticamente com preocupação pela autarquia, com a previsão para o IPCA de 2025 no boletim Focus passando de 4,03% para 4,59% entre novembro e esta semana.
O próprio BC piorou nesta quarta suas projeções de inflação em relação a novembro, com estimativas passando de 4,6% para 4,9% em 2024 e de 3,9% para 4,5% em 2025, considerando o cenário de referência, que segue as projeções de mercado para a trajetória dos juros. Para o segundo trimestre de 2026, atual horizonte relevante da política monetária, a projeção passou de 3,6% para 4,0%.
Para as projeções do cenário de referência divulgadas nesta quarta, o Copom considerou uma taxa de câmbio que parte de 5,95 reais, acima dos 5,75 reais usados na reunião de novembro.
O centro da meta contínua para a inflação neste e nos próximos anos é de 3%, sempre com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para mais ou menos. O boletim Focus mostra que as expectativas dos economistas seguem acima da meta central de 3% até 2028, horizonte final da pesquisa.