BC deve elevar Selic a 13,75% e deixar porta aberta para nova alta
Mercado financeiro espera que o ciclo de alta continue em setembro para assegurar inflação 'ao redor' do centro da meta em 2023
O Banco Central deve elevar a taxa Selic nesta quarta-feira, 3, em 0,50 ponto porcentual, de 13,25% para 13,75% ao ano, a 12ª alta seguida. É crescente, no mercado financeiro, a corrente que espera que o ciclo de alta continue em setembro, para buscar uma inflação "ao redor" do centro da meta (3,25%) em 2023.
Para economistas consultados pelo Estadão/Broadcast, o BC deve ao menos deixar a porta aberta para um novo aperto da Selic diante do estouro das expectativas inflacionárias, das surpresas com a atividade econômica e do enfraquecimento do teto de gastos, a regra que atrela o crescimento das despesas à inflação e é usada como âncora fiscal.
Com um aumento em setembro, a taxa chegaria ou ficaria bem próxima do seu último pico, de 14,25%, que durou de julho de 2015 a outubro de 2016, no governo da então presidente Dilma Rousseff. Como daquela vez, a perda de credibilidade fiscal é um dos motivos que explicam a dose alta de juros, mas agora o choque inflacionário global também dá sua contribuição, pontuam os especialistas.
O aumento do juro básico da economia reflete em taxas bancárias mais elevadas, embora haja uma defasagem entre a decisão do BC e o encarecimento do crédito (entre seis e nove meses). A elevação da taxa de juros também influencia negativamente o consumo da população e os investimentos produtivos.
Desde a reunião de maio, o BC sinaliza a intenção de encerrar o processo, que já é o mais longo da história do Comitê de Política Monetária (Copom) e o mais forte choque de juros desde 1999, com alta acumulada de 11,75 pontos porcentuais, incluindo a elevação esperada para esta quarta.
Das 51 instituições financeiras consultadas pelo Estadão/Broadcast, 49 projetam alta de 0,50 ponto porcentual da Selic, de 13,25% para 13,75% ao ano. Caso a projeção majoritária seja confirmada, será a taxa mais alta desde janeiro de 2017, quando também estava em 13,75%.
O consenso do mercado segue a sinalização dada pelo BC no último Copom, em junho, de nova alta de juros de menor ou igual magnitude (0,50 ponto porcentual). Naquela reunião, o BC ainda indicou que mirava uma inflação mais próxima do centro da meta de 2023 (3,25%) do que sua projeção de 4%.
A estratégia para tal também incluía uma Selic mais restritiva por um período maior do que apontava o Boletim Focus. Agora, no encontro de agosto, a inflação de 2024, para qual o BC projeta 2,7% (aquém da meta de 3%), entra no horizonte relevante, mas com menor peso do que 2023.
A expectativa do mercado é de que a projeção do BC para o IPCA - índice de inflação oficial - de 2023 avance, embora aquém do que prevê o Focus (5,33%), já bem acima do teto de 4,75%. Na XP Investimentos, a expectativa é de que suba a 4,6%. Já o Itaú Unibanco prevê 4,3%.
Além da piora da projeção oficial, os economistas consultados destacam que o cenário doméstico trouxe más notícias quando se trata de controle da inflação. A atividade econômica está mais forte do que o esperado e não deve ceder no curto prazo com os auxílios distribuídos pela PEC "Kamikaze". E a nova ofensiva fiscal reduz ainda mais a credibilidade do teto de gastos, o que afeta o balanço de riscos, além dos preços de ativos.
"Acho que o BC vai deixar a porta aberta para outra alta de mesma ou menor magnitude, o que seria entre 0,50 ponto porcentual e 0,25 ponto porcentual em setembro. Desde o último Copom, o BC viu as expectativas piorando bem e o fiscal muito pior, tanto em termos de risco quanto de incentivo à demanda. Lá fora a atividade está mais fraca, mas aqui está bem mais forte mesmo", destaca o economista-chefe da Garde Asset, Daniel Weeks, que espera que a Selic alcance 14,25% no mês que vem.
O economista Silvio Campos Neto, sócio da Tendências Consultoria, espera ajuste residual de 0,25 ponto porcentual em setembro, para 14%, fechando o ciclo. O economista aponta os abalos sofridos pelo teto de gastos e o choque inflacionário global como pano de fundo para o choque de juros neste ciclo.
"[A questão global] Marca uma diferença importante em relação a 2015. Naquele momento o mundo era marcado por inflação baixa e juros baixos, mas agora temos um mundo com juros subindo rapidamente para conter uma inflação muito elevada."
Já o economista-chefe da Trafalgar Investimentos, Guilherme Loureiro, avalia que o BC pode encontrar, neste momento, a brecha que vem procurando para finalizar o processo de aperto monetário, que já é muito significativo. Ele cita o cenário de desaceleração global, que já moderou um pouco os preços de commodities, e o arrefecimento da inflação brasileira no curto prazo, com o efeito da redução de impostos, mas também com alguns sinais melhores de bens industriais.
"Acho que as expectativas de inflação de 2023 já alcançaram o pico. Mas o BC não deve fechar a porta, deve tentar ser um pouco mais 'data dependent', como todos os BCs do mundo estão fazendo agora. A melhora do cenário de inflação deve ficar mais clara em setembro."
Da mesma forma, a XP espera para amanhã a última alta de juros neste ciclo, para 13,75%, mas avalia que o BC não deve anunciar o fim do processo agora. "Com as pressões inflacionárias globais começando a diminuir, acreditamos que o Copom finalmente fará a pausa que vem sinalizando há algum tempo", diz, em relatório.
"Reconhecemos, porém, que o Comitê pode optar por ir um pouco mais longe, para garantir que o IPCA recue adiante", completa, citando a falta de clareza sobre o arcabouço fiscal em 2023 como o maior risco para a política monetária.