Bolsonaro e Lula precisam dizer o que querem para economia, diz diretor da Western Asset
Incertezas sobre as políticas econômicas dos candidatos que lideram a disputa presidencial no Brasil têm freado o ímpeto de investidores no mercado brasileiro, que ainda não têm um nome predileto, avalia o diretor de Investimentos da gestora Western Asset no Brasil.
"Há questões em aberto que têm retraído investidores neste momento de serem mais agressivos, principalmente os investidores globais", afirma Paulo Clini em entrevista a Reuters, destacando a atratividade do país neste momento em que a Selic caminha para 13,75% ao ano. "E elas não são relacionadas a um nome."
Pesquisas eleitorais têm mostrado o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à frente do presidente Jair Bolsonaro nas intenções de voto para o pleito de outubro.
De acordo com o executivo, faltam informações desde como será o arcabouço fiscal, uma vez que interlocutores de ambos têm sinalizado uma revisão de políticas para o ano que vem, passando pela agenda de reformas, equipe econômica e gestão das estatais.
"Não se sabe o básico sobre sustentabilidade fiscal, agenda de reformas, ou sobre o próprio time (econômico) olhando para a frente", afirmou. "Como eu posso gostar mais de A ou mais de B?", questiona, observando que a discussão no mercado está menos sobre nomes e mais sobre as políticas.
"O mercado financeiro não quer saber se é o Lula, mas o que o Lula vai fazer, não quer saber se é o Bolsonaro, mas o que ele vai fazer. Quais são as políticas econômicas? O PIB vai crescer, não vai crescer? E para isso precisa haver informações que não temos hoje."
E Clini não descarta um desfecho da eleição sem respostas a essas questões, uma vez que não são tópicos de entendimento da grande massa de eleitores.
BOLSA, PETROBRAS
As incertezas, em um ambiente de juros mais elevados no Brasil e nos Estados Unidos, modera o apetite a risco, mesmo com "valuations" atrativos no caso da bolsa brasileira, disse o diretor de Investimentos da Western Asset no Brasil, que tem 50 bilhões de reais em ativos sob gestão no país.
"Parece que está barato, mas será que não pode ficar mais barato? Dependendo do que acontecer, pode". Na avaliação de Clini, o risco é assimétrico para pior, principalmente quando se fala sobre inflação. O custo de oportunidade atual, dado o nível da Selic, é outro obstáculo, diz. "Será que vale o risco?"
"Valuation atrativo é condição necessária, mas não suficiente. Só ele não leva a uma volta do fluxo (de compra na bolsa)", acrescenta.
Um exemplo é a Petrobras, disse o executivo, que parece, do ponto de vista puramente de "valuation", barata, mas há falta de clareza sobre governança. De acordo com Clini, não adianta a companhia gerar lucros extraordinários se sua política de preços é tal que esse fluxo de recursos irá para subsídios.
O executivo afirmou que é muito difícil não ter ações da estatal, uma vez que ela têm um peso relevante no Ibovespa, principal índice a bolsa paulista, mas que há "bastante barulho".
"A Petrobras é aquela empresa que você tem 'mixed feelings': do ponto de vista de valuation, está muito atrativa; do ponto de vista de risco, eles são muito grandes."
FLUXOS, CRÉDITO
O diretor de Investimentos da Western Asset no Brasil não espera um fim nas saídas de recursos dos fundos de ações e multimercados em direção à renda fixa, que foram bastante acentuadas no primeiro semestre, mas uma moderação até o final do ano, pois não se prevê novos ajustes relevantes na Selic.
Clini explicou que apesar de os juros estarem subindo, a variação atual não muda mais a precificação e a percepção de risco dos agentes, uma vez que é diferente sair de 2% para mais de 13% e de mais de 13% para quiçá cerca de 14%.
Nos primeiros seis meses do ano, os fundos multimercados tiveram resgates líquidos de 61,8 bilhões de reais, enquanto os de ações viram as saídas líquidas saltarem para 49,5 bilhões. Nos fundos de renda fixa, houve com captação líquida de 88,8 bilhões de reais.
"O fluxo de saída de ativos de risco para renda fixa deve moderar, parar, talvez não", disse.
No caso específico da Western, o executivo afirmou que não está aumentando alocação em bolsa, que já se posicionou e que os próximos movimentos são mais relacionados a ajustes de portfólios. No entanto, tem aumentado a exposição a crédito.
"Se tem uma classe de ativos que estamos favorecendo neste momento é crédito", afirmou, citando que tal expansão se dá por meio de instrumentos desde debêntures e FIDCs e apoiada na visão de que os retornos estão interessantes e a probabilidade de default, bastante baixa.
INFLAÇÃO
Para Clini, o principal risco global aos mercados no momento é uma persistência da inflação, particularmente nos Estados Unidos, que pode levar o banco central norte-americano a elevar os juros para patamares ainda mais restritivos.
"Nós temos uma visão de que a inflação vai começar a ceder, nos meses que estão por vir. O Federal Reserve tem a visão de que a inflação vai começar a ceder. E se a inflação não ceder ou, pior, acelerar?"
Ele reforça que seu cenário é de que a alta dos preços irá desacelerar e que o Fed deverá levar o juro para algo próximo dos 3,5% no final deste ano, conforme sinalizado pelo próprio BC norte-americano. Isso, acrescenta, deve se refletir em uma retração moderada, ou uma recessão técnica da economia dos EUA.
"Mas não é algo que é muito relevante, não será uma recessão profunda", estima, citando que a economia norte-americana está saudável. O risco, segundo ele, é o Fed precisar refazer seu plano de voo atual.
(Edição Alberto Alerigi Jr.)