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Brasil volta à rota de investimento dos chineses

Expectativa é de que, após dois anos mais fracos, eles injetem cerca de US$ 7 bilhões em 2020 no País

12 jan 2020 - 02h11
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Três anos após uma forte ofensiva no mercado brasileiro, quando compraram a CPFL, maior companhia privada do setor elétrico, os empresários chineses estão de volta. Desta vez, o interesse está voltado, principalmente, para empresas de tratamento de água e esgoto e grandes projetos na área de infraestrutura, como construção e operação de estradas e ferrovias.

Na sua última expedição pelo País, em 2017, eles investiram cerca de US$ 9 bilhões, a maior parte disso em ativos de energia. Mas depois puxaram o freio para avaliar as mudanças que ocorriam no cenário político. Essa cautela reduziu em quase 70% o volume de investimentos nos anos seguintes, que ficaram em torno de US$ 3 bilhões.

As incertezas sobre o resultado das eleições presidenciais, o discurso pouco amistoso do presidente Jair Bolsonaro (que chegou a dizer que a China não comprava no Brasil, mas estava comprando o Brasil) e o alinhamento incondicional do governo com os EUA, rival comercial dos chineses, esfriaram o relacionamento com os asiáticos.

Agora, depois do movimento de aproximação de Bolsonaro com Xi Jinping e, principalmente, os vários projetos de concessão e privatização em oferta no Brasil, os chineses colocaram novamente o País no radar. A expectativa para este ano é de que eles tragam algo como US$ 7 bilhões para gastar por aqui, diz Eduardo Centola, presidente do banco Modal. O executivo, também membro do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), assessora grupos chineses interessados no País.

Os especialistas avaliam que os chineses querem repetir no Brasil o que já fizeram na África. Entre as grandes potências do mundo na área de infraestrutura, os chineses dominaram a construção de estradas, ferrovias e hidrelétricas em países como Angola, África do Sul e Moçambique.

Com infraestrutura precária e um governo sem recursos para fazer investimentos, o Brasil é um terreno fértil para os chineses. "A China está disposta a investir fortemente no Brasil e na América do Sul", diz Charles Tang, presidente da Câmara de Comércio e Indústria Brasil China (CCIBC).

Um dos principais alvos no momento é a Sabesp, maior companhia privada do País de tratamento de água e de esgoto. A empresa tem quase 28 milhões de clientes no Estado de São Paulo e fatura R$ 16 bilhões por ano. O Estado apurou que o grupo China Railway Construction Corporation , um dos maiores em infraestrutura, está em conversas para comprar um pedaço grande da companhia.

O governo do Estado de São Paulo, dono de 50,3% da Sabesp, avaliada em R$ 40 bilhões, estuda se vai se desfazer de sua participação total na empresa ou encontrar um investidor para comprar metade de sua fatia no grupo.

Ritmo de concessões ditará aportes

O apetite dos empresários chineses para fazer pesados investimentos no Brasil este ano vai depender das concessões públicas para os projetos de infraestrutura no País. Além do governo federal, muitos Estados e municípios, também endividados, buscam parcerias privadas para suas empresas.

Na lista do governo este ano estão previstos sete leilões para manutenção e construção de estradas, que podem arrecadar R$ 42 bilhões, e outros R$ 52 bilhões para renovação e construção de ferrovias. "O ritmo dos aportes chineses vai depender do andamento das concessões este ano", diz Eduardo Centola, sócio do banco Modal.

Muitas empresas chinesas já têm mapeado investimentos no Brasil, olhando modelos de privatização e concessões previstas para os próximos anos, diz o advogado Luiz Eduardo Vidal Rodrigues, sócio sediado na China do escritório L.O. Baptista.

O escritório de Vidal Rodrigues foi um dos que se prepararam para fazer a ponte entre empresários chineses e o Brasil, quando os investidores asiáticos começaram a aumentar sua presença no País. Segundo ele, como os chineses já estão consolidados em energia elétrica, a retomada será em outras áreas, entre elas, gás natural.

Nesse caso, pesa o interesse em ativos da Petrobrás. A petroleira brasileira deu início em 2017 a um plano de venda de empresas consideradas não estratégicas. De 2017 até novembro do ano passado, a estatal vendeu cerca de US$ 30 bilhões em ativos, que incluem os gasodutos NTS e TAG e a empresa de gás de cozinha Liquigás. Neste ano, pretende levantar de US$ 20 bilhões a US$ 30 bilhões com a venda de distribuidoras de gás canalizado, bacias de petróleo e reduzir ainda mais sua participação na BR Distribuidora, maior companhia de distribuição de combustíveis do País.

Há três anos, boa parte dos aportes chineses foi liderada pelas estatais State Grid, que comprou o controle da CPFL, e pela China Three Gorges, também de energia. Essas duas empresas continuam de olho na privatização de empresas de transmissão e geração de energia da estatal federal Eletrobrás e também da Cemig, que pertence ao governo do Estado de Minas Gerais, diz o advogado Gustavo Buffara Bueno, do escritório que leva o seu sobrenome. Buffara assessorou a gigante State Grid na compra da CPFL.

Ambição

Além do setor elétrico, os chineses têm planos ambiciosos para avançar em empresas de construção pesada e no transporte de cargas por ferrovias. Se puderem aliar as duas coisas, melhor. Segundo Carlos Frederico Bingemer, sócio da área de infraestrutura do escritório Barbosa, Müssnich, Aragão (BMA), eles querem entregar o pacote completo num projeto de infraestrutura. Ou seja, num empreendimento de usina eólica, por exemplo, querem não só a concessão como também a construção e fornecer os equipamentos.

É o caso da CCCC, empresa que estreou no Brasil com a compra da construtora Concremat, em 2016. Um dos objetivos da companhia é aumentar seu leque de negócios no País, especialmente em projetos que são construídos do zero (greenfield).

A entrada da gigante veio em um momento em que as principais empreiteiras do Brasil estavam no olho do furacão da Operação Lava Jato, que investiga corrupção envolvendo negócios com a Petrobrás. A CCCC, que também é sócia do projeto de construção do Porto São Luís, no Maranhão, está de olho em duas grandes ferrovias, consideradas importantes para o transporte de grãos. Uma é a Fiol, que ligará o Tocantins ao litoral da Bahia, num ramal de 1,5 mil quilômetros, e a outra é a Ferrogrão, que levará sobre os trilhos boa parte da produção de soja e milho de Mato Grosso ao Pará, um projeto de quase 1.000 quilômetros de extensão.

Desde 2017, o Brasil é o segundo maior destino de investimentos chineses em infraestrutura no mundo, atrás somente dos Estados Unidos. Mas, aos poucos, o País começa a atrair os asiáticos para outros negócios, como tecnologia. A Didi, o "Uber chinês" comprou a brasileira 99 em 2018. No mesmo ano, a gigante de internet Tencent, fez um aporte de US$ 180 milhões na fintech Nubank.

Grupo anuncia banco no Brasil de olho em construção

Uma mostra da retomada dos chineses no Brasil foi o anúncio, na semana passada, da chegada do conglomerado Xuzhou Construction Machinery Group (XCMG), um gigante na fabricação de máquinas para a construção civil. O grupo anunciou a instalação de um banco no País - o primeiro do XCMG - de olho no setor de infraestrutura. O presidente global do XCMG, Wang Min, afirmou, em evento em São Paulo, que um dos objetivos é que a instituição financeira seja um ponto de conexão entre China e Brasil e que essa integração econômica ajudará o capital chinês a desembarcar no País.

Em dezembro, as chinesas CCCC e a CR20 venceram um leilão da Parceria Público-Privada (PPP) do governo baiano para construir a ponte Salvador-Itaparica, com extensão de 12,4 quilômetros. A obra é avaliada em R$ 5,3 bilhões. Os chineses têm intensificado parcerias com os governos estaduais.

Mas outros setores também despontam para os chineses. A empresa BYD indicou interesse em comprar a fábrica da Ford em São Bernardo, ressalta Tulio Cariello, diretor de análise do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC).

O setor de óleo e gás também tem atraído capital chinês: em novembro passado CNOOC e CNODC Petroleum participaram de um consórcio com a Petrobrás no leilão do pré-sal.

Estadão
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