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Amanda Dias

'Elas eram exemplos de empreendedorismo antes mesmo de ser moda'

Conheça a história das primeiras empreendedoras do Brasil

27 dez 2022 - 00h00
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 Quituteiras no Rio de Janeiro, em 1875
Quituteiras no Rio de Janeiro, em 1875
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No início do século XIX, começou a ganhar força nas áreas urbanas do Brasil escravista, as ganhadeiras (e ganhadores). Estas pessoas em sua grande maioria haviam sido escravas domésticas e, por conta do contexto político e econômico da época, foram transformadas em escravas de ganho.

Elas eram obrigadas a ir às ruas executar tarefas previamente estabelecidas pelos senhores de escravos e ao final do dia, semana ou mês entregar uma quantia combinada entre eles através de um contrato informal. O que excedia o valor acordado era de propriedade da ganhadeira que podia juntar ou usar no seu dia a dia.

Não preciso nem dizer a vocês que o combinado era feito de forma a não sobrar praticamente nada, né?

Mas quero chamar atenção para um detalhe: nessa época não era permitido aos escravizados acumular pecúlio. Legalmente, isso só foi possível a partir de 1871, com a Lei do Ventre Livre, mas ainda assim a gente tem registros de poupança de escravizados anteriores a esse ano.

Outra informação importantíssima é que as escravas de ganho foram fundamentais na compra de alforrias que chegaram a custar quase 2 MILHÕES DE RÉIS. Estas e outras informações bacanas você pode achar em “Mulher negra na Bahia no século XIX” da Cecília Moreira Sales.

A Documentação histórica da Caixa Econômica, ainda pouco estudada, mostra diversas cadernetas pertencentes a pessoas escravizadas. Fundada em 1860, a Caixa não permitia que pessoas não livres fossem depositantes. Mas, após a Lei do Ventre Livre, em 1871, isso mudou e mesmo sendo muito difícil acumular essa quantidade exorbitante de dinheiro, muitos escravizados conseguiram comprar suas alforrias e de seus familiares.

Muitos deles, depois de libertos, se mantiveram na atividade empreendedora e prosperaram como comerciantes, feirantes, alfaiates, quitandeiras, baianas de acarajé, dentre outras atividades.

Caderneta de poupança de Judas, escravo, com 24 mil réis
Caderneta de poupança de Judas, escravo, com 24 mil réis
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O poder econômico das Baianas de Acarajé

Quando nosso povo era cativo, as “escravas de ganho” saíam como tabuleiros para vender quitutes e recebiam uma pequena fração do lucro. Ao longo do tempo, a atividade se intensificou e profissionalizou, saindo do domínio dos senhores e abrindo caminho para a libertação e independência financeira do povo negro.⠀

Hoje, os tabuleiros de acarajé pertencem às baianas, são fonte de renda e, até, empresas familiares. Em alguns casos, mais do que o sustento, elas alcançaram fama e riqueza.

Não à toa, as baianas são reconhecidos símbolos do poder econômico de Oyá, a Divindade que destrói para renovar através da economia intracomunitária. Comprando de nós, vendendo para nós e empregando os nossos, fortalecemos toda a comunidade como uma rede.

No passado, filhas de Oyá recebiam a autorização para vender o acarajé numa cerimônia religiosa. Com o tempo, pessoas que não honravam a tradição quiseram entrar nesse mercado esvaziando o sentido dessa história, mas desde 2005, a profissão é patrimônio imaterial do Brasil. Só pode ser exercida como venda de comidas ligadas ao culto de orixá, com roupas próprias do candomblé, como turbantes, panos da costa e colares de contas.

Pensar sobre a história das baianas é fazer o movimento de Sankofa. Voltar ao passado para entender o presente e construir o futuro. E esse é justamente o que move a maior parte dos empreendedores brasileiros; colocar comida na mesa, romper com o ciclo de escassez e dar um futuro melhor para as nossas famílias e comunidades.

Empreender e prosperar é possível, mesmo para quem começa sem herança ou incentivo e as Ganhadeiras são um ótimo exemplo de como o empreendedorismo e a organização financeira foram e ainda são ferramentas fundamentais para libertação, ascensão e autoestima de um povo.

Mãe e filho em Salvador em foto de 1884
Mãe e filho em Salvador em foto de 1884
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Fonte: Amanda Dias
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