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Com 14,8 milhões de desempregados, dificuldade em arrumar trabalho força brasileiro a se adaptar

Dados divulgados pelo IBGE nesta sexta-feira mostram que cenário de emprego do País tem desocupação atingindo taxa de 14,6%

30 jul 2021 - 11h10
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O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) divulgou nesta sexta-feira, 30, que a taxa de desocupação no País alcançou 14,6% no trimestre encerrado em maio de 2021, mantendo os 14,8 milhões de desempregados constatados na medição do trimestre finalizado em abril. Com isso, o cenário é de adaptação forçada, principalmente, para quem perdeu o emprego por conta da pandemia do novo coronavírus, causador da covid-19.

Este foi o caso de Mariane da Silva Carvalho, de 33 anos. Ela trabalhava como cozinheira e "bartender" para uma empresa terceirizada que prestava serviços para o resort Costa do Sauípe, na Bahia. Ela conta que já estava neste emprego há dois anos e sete meses e ficou muito triste com a notícia do desligamento. "Fazíamos os clientes ficarem felizes."

Paulistana e sem família na Bahia, ela precisou voltar para São Paulo junto ao filho, que fez cinco anos neste mês de julho. O pequeno tem asma e problema de refluxo. "Os medicamentos para asma consigo na rede pública, mas os de refluxo preciso comprar", diz Mariane. Para equilibrar as despesas, ela conta com o auxílio emergencial, que recebe desde o ano passado, e um auxílio merenda, que é dado pela escola. Morando em Paraisópolis, doações feitas por instituições à comunidade também ajudam a passar o mês.

Desde a demissão, Mariane não parou de procurar emprego. Porém, ela ressalta que sofre preconceito no mercado de trabalho por ter criança pequena, como aconteceu em um processo seletivo ainda na Bahia. "Me perguntaram se tinha filho e se ele sofria com alguma condição médica. Eu disse que sim. Imediatamente, o contratante pediu desculpas e falou que eu não iria ter tempo integral para o trabalho", conta.

E as oportunidades são escassas. Mesmo quando faz entrevistas pessoais, ela diz que as respostas são incertas. "É sempre algo na linha de 'vou te ligar, te aviso'. Bate aquela tristeza, pois gasto até mesmo o que não tenho para imprimir currículos e pagar passagens." Ela também critica a necessidade de indicação para muitas propostas e até mesmo para alguns bicos, como de diarista ou cozinheira. "Uma empresa uma vez me disse que não contrataria sem indicação."

Sempre que sai para procurar emprego, ela precisa deixar o filho com a mãe, que sofre com problema de coração, e o pai, que é deficiente visual. Ambos já estão vacinados contra a covid. Mariane também é hipertensa e já se vacinou com a primeira dose. Porém, mesmo com a volta às aulas, o filho ainda não poderá ir para escola, já que sofre de asma. "Como posso deixar ele com outras crianças?"

Mariane conta ainda que, recentemente, com a reabertura e o avanço da vacinação, recebeu uma proposta para voltar ao antigo posto, mas se mudar agora para a Bahia seria inviável. "Não tenho família lá e precisaria de algum dinheiro para me manter por pelo menos dois meses, até me estabilizar", diz. Nesse meio tempo, ela tem feito alguns cursos técnicos gratuitos, como de administração e recursos humanos, para não ficar parada. "Fiquei muito tempo fora do mercado de São Paulo, mas vou manter a esperança", finaliza.

Diferentemente de Mariane, José Matias Vicente Júnior, de 20 anos, nunca teve emprego registrado em carteira. Ele está à procura da primeira vaga. Morador da Cidade Ademar, na zona sul de São Paulo, ele tem se sentido prejudicado pelo momento atual. Dedicado aos estudos, assim que terminou o ensino médio, ele não se preocupou imediatamente em procurar um emprego. Pelo Enem, pegou uma bolsa de estudos parcial para cursar engenharia de controle e automação, mas trancou o curso logo no começo, com menos de um ano.

"Estava pensando no presente, e não no futuro", diz, ao analisar a decisão de largar a faculdade. Ele mora com o pai, de 61 anos, que trabalha assentando pedra, e conta que buscava por renda e estabilidade na época, por meio de carteira assinada ou concurso, mas a oportunidade não veio - e a pandemia deixou o cenário ainda mais difícil. "Isso tem um peso muito grande. Penso no meu pai, que já tem idade, faz um trabalho pesado. Poderia estar ajudando ele", diz.

No período de maior crise, no ano passado, a renda da família foi complementada pelo auxílio emergencial do pai e por bicos que Vicente Júnior faz. "Meu primo tem vidraçaria, então ajudo quando ele precisa. Também apoio meu pai nos trabalhos dele", conta. Recentemente, ele começou um pequeno negócio, vendendo camisetas por meio de plataformas na internet, como Mercado Livre e Shopee. "Trabalho por encomenda. Ainda está no começo, mas espero conseguir alguma renda. Não podemos ficar parados."

O jovem também não deixou de lado a vontade de entrar no mercado de trabalho. Todo dia, ele segue uma rotina de estudos, uma forma de se preparar para futuros concursos. "Me inscrevo em todos que abrem e costumo ir muito bem nas primeiras fases, mas caio nas seguintes". A carteira assinada continua sendo um sonho. "Tenho contas em vários sites de vagas, mas as respostas quase sempre são automáticas e negativas." Assim como muitos que buscam uma colocação, ele demonstra flexibilidade e disposição. "Não quero me limitar, quero uma oportunidade e crescer em cima dela", aponta.

Porém, Vicente Júnior critica as oportunidades de vagas. "As empresas buscam profissionais graduados, com inglês fluente e experiência, eles querem você grande, mesmo que o cargo seja de nível mais baixo. Sem contar que as oportunidades mais simples parecem estar mais escassas, é como se as novas vagas movimentassem quem está no topo e não a base que precisa muito de emprego e movimenta a economia", aponta. Ele ainda menciona o fator indicação, "que acaba atrapalhando as pessoas que têm bom potencial, mas sem as conexões certas."

Apesar das dificuldades de quem busca o primeiro emprego, ele tenta se manter positivo. "Com base no trabalho do meu pai, cuja demanda aumentou, já posso sentir uma possível melhora em 2021, na comparação com o ano passado. É preciso ter paciência, as boas oportunidades sempre surgem para quem não desiste", conclui.

Já Alexandre dos Santos Verçosa, de 35 anos, é barbeiro, e notou significativa mudança no número de clientes. Quando essa quantidade começou a cair por causa da pandemia, logo no ano passado, ele parou de alugar uma cadeira no salão onde trabalhava e fez uma vaquinha online para arrecadar dinheiro e comprar os próprios equipamentos para atender os clientes a domicílio.

"Alugar uma cadeira" significa que, se o corte de cabelo custava R$ 50, Verçosa pagava R$ 30 ao estabelecimento, que eventualmente fechou. "Muitas pessoas ajudaram com a vaquinha, mas não deu para comprar todos os equipamentos que eu precisava. Uma parte do dinheiro eu também usei para me manter", contou ele, que mora em um apartamento do Minha Casa Minha Vida no Rio de Janeiro, com a mãe e o irmão.

"Os cortes têm caído bastante, e não tenho outro trabalho. Nossa única fonte de renda é a minha mãe, única que trabalha de carteira assinada, como babá. Nossa prioridade tem sido a cesta básica e as contas. Ela tenta quitar o arrendamento do apartamento há 10 anos, mas nunca consegue. A gente paga as contas, e o dinheiro acaba em uma semana. Tem sido bem difícil, as coisas estão cada vez mais caras no mercado."

Também por causa da pandemia, Verçosa teve de trancar o curso de Defesa e Gestão Estratégica Internacional, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Ele estava no segundo semestre. "Estou sem computador, o teclado não funciona e a internet na zona oeste do Rio é bem complicada. E também porque eu precisava muito fazer os cortes de cabelo. Geralmente as pessoas queriam cortar à noite, depois do trabalho, e era o horário das aulas." / COLABOROU FELIPE SIQUEIRA

Estadão
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