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Com teto maior, parlamentares querem R$ 16 bi para emendas de relator e R$ 5 bi para fundo eleitoral

Congressistas planejam usar folga destinada ao Auxílio Brasil para enviar verbas a seus redutos; lideranças também querem carimbar na Constituição o caráter obrigatório das emendas de relator, que atualmente podem ser vetadas pelo presidente

27 out 2021 - 11h04
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BRASÍLIA - A expansão do teto de gastos, a pretexto de acomodar o novo Auxílio Brasil, deve abrir espaço também a R$ 16 bilhões em emendas de relator, usadas por parlamentares para enviar verbas a seus redutos, e ao aumento do fundo eleitoral para R$ 5 bilhões. Essa é a expectativa de congressistas na destinação da "folga" que será aberta no Orçamento de 2022, com base em simulações feitas por técnicos do Legislativo.

De olho no espaço novo, lideranças ensaiam um movimento para tentar carimbar na Constituição o caráter obrigatório e impositivo das emendas de relator, que hoje são definidas ano a ano e podem ser vetadas pelo presidente da República. Essas emendas são a base da distribuição de recursos a parlamentares aliados por meio do chamado "orçamento secreto", revelado pelo Estadão.

Segundo apurou o Estadão/Broadcast com duas fontes, essa corrente ainda busca convencer outros parlamentares e angariar apoio nos bastidores a uma mudança como essa, mas enfrenta resistências. Por isso, as pessoas ouvidas pela reportagem avaliam que "ainda é cedo" para saber se a manobra será bem-sucedida.

A negociação é deflagrada no momento em que o Tribunal de Contas da União (TCU) e a Controladoria-Geral da União (CGU) apuram suspeitas de irregularidades na destinação dessas emendas, que ficam sob o controle do relator do Orçamento, mas na prática são destinadas por congressistas aliados sem que a indicação seja pública e transparente.

O instrumento para levar adiante a manobra seria a própria PEC dos precatórios, que inicialmente era uma proposta para limitar o pagamento das dívidas judiciais da União, ganhou um Refis de dívidas de municípios, desde a semana passada passou a abrigar uma flexibilização no teto de gastos (a regra que limita o avanço das despesas à inflação) e agora incluiria a impositividade das emendas de relator.

O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), nega que haja negociação para tornar obrigatórias as emendas de relator. O relator da PEC dos precatórios, deputado Hugo Motta (Republicanos-PB), afirma que os valores das emendas e do fundo eleitoral serão tratados diretamente no Orçamento.

Para que as emendas se tornassem obrigatórias, seria necessária uma complementação de voto do relator. Embora não haja previsão regimental para mudanças no parecer de uma PEC no plenário, técnicos afirmam que o expediente já foi adotado durante a tramitação do Orçamento de Guerra, no início da pandemia de covid-19.

Com o carimbo das emendas de relator na Constituição, a expectativa dos parlamentares é que elas fiquem em pelo menos R$ 16 bilhões em 2022. Também há uma tentativa de assegurar, na tramitação do Orçamento, uma reserva de R$ 5 bilhões para o fundo eleitoral - R$ 3 bilhões a mais do que o já previsto na proposta de Orçamento para o ano que vem.

A investida para tornar a emenda de relator obrigatória repete o filme visto em 2015, com as emendas impositivas, em 2019, com as emendas de bancada. Há seis anos, ainda no governo Dilma Rousseff (PT), a insatisfação de congressistas com a baixa execução de suas demandas no Orçamento deu lugar a uma ampla articulação para carimbar na Constituição a obrigatoriedade das emendas individuais. Na sequência, veio a impositividade das emendas de bancada. Elas somam juntas cerca de R$ 16,2 bilhões para o ano que vem.

Por isso, observadores do meio político afirmam que o movimento em torno das emendas de relator é "esperado" e um "caminho natural" diante das sinalizações já emitidas pelo Congresso no sentido de abocanhar uma fatia cada vez maior das despesas.

Técnicos da área orçamentária da Câmara têm feito diariamente simulações do espaço aberto no Orçamento de 2022, que vão de R$ 91 bilhões (com inflação a 9%) a R$ 110,5 bilhões (com IPCA de 10%). Após as destinações já acertadas ao Auxílio Brasil e outras despesas como auxílio diesel e correção de benefícios previdenciários, a "sobra" ficaria entre R$ 9,5 bilhões e R$ 13 bilhões - valor que poderia ser destinado a emendas de relator-geral e ao incremento do fundo eleitoral.

As simulações indicam que, para atingir os valores almejados nessas duas despesas, seria preciso cortar de outros lugares. No Congresso, o valor de R$ 16 bilhões é tratado como "piso" para as emendas de relator.

A interlocutores, o relator-geral do Orçamento, deputado Hugo Leal (PSD-RJ), tem dito que adota o cenário de folga de R$ 91 bilhões para elaborar seu parecer, mas ele não revela nessas conversas o valor que deve ser destinado às emendas de relator-geral.

Educação

A possibilidade de cravar as emendas de relator na Constituição, porém, é apenas um dos temas delicados no texto da PEC dos precatórios. Nos últimos dias, cresceu a resistência, principalmente de parlamentares da oposição, ao limite de pagamento dos precatórios. Os Estados têm R$ 15 bilhões a receber do Fundef, fundo de educação básica já extinto, e há o temor de que isso possa prejudicar os professores. Hoje mais cedo, o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), tratou dessa crítica como uma "versão", minimizando o risco.

"Para nós é posição firmada que não tem jeito, é calote. é um processo eleitoreiro puro por espaço fiscal que pode chegar a R$ 110 bilhões, dos quais R$ 30 bi apenas pra programa social. Não é possível. É chantagem que se não tiver isso não tem programa social, não existe isso. Isso tudo é pra emenda de relator", critica o líder do PT na Câmara, Bohn Gass (RS).

"Queremos transparência, precatórios precisam ser pagos, e a contradição deles foi eles que criaram com esse teto e o discurso de responsabilidade fiscal. É calote, chantagem, mentira e eleitoreiro. Tem crítica da direita também contra a gastança. Difícil passar. Acho que não tem não ambiente", acrescenta o petista.

"A votação provavelmente foi adiada porque o governo não tem os votos necessários, o Congresso está bem dividido neste tema", diz o deputado Vinicius Poit (Novo-SP). "Mudar a lei pra não furar o teto é um estelionato com a população brasileira. Acredito e espero que a PEC dos precatórios não seja aprovada, pois será uma irresponsabilidade com o Brasil, dar um calote duplo e deixar a conta pro próximo governo pagar", afirma.

O líder da oposição na Câmara, Alessandro Molon (PSB-RJ), diz que a oposição não vai apoiar a PEC dos precatórios. Segundo ele, a mudança na forma de pagamento representa um calote e não está claro para onde vão os recursos obtidos com o novo espaço no Orçamento. Um dos pontos que gera dúvida, por exemplo, é a autorização adicional de R$ 15 bilhões para gastos em 2021, inserida na PEC.

"O Bolsa Família custa R$ 2,5 bilhões por mês. Com faltam dois meses, para onde vão os outros R$ 10 bilhões", questiona. Segundo ele, a suspeita é que esses recursos sejam direcionados para o Orçamento secreto, para a compra de trator superfaturado e turbinar a eleição de deputado da base. "Não dá para aceitar uma coisa dessas", critica. Molon também cita as resistências da oposição em adiar os precatórios do Fundef.

"Por todas essas razões, vamos votar contra. Nosso problema não é o teto em si, mas a hipocrisia, o calote e o Orçamento", diz Molon. O líder afirma que, sem os partidos de oposição, vai ficar mais difícil aprovar a PEC. O governo precisa do apoio de 308 deputados em dois turnos de votação.

Estadão
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